Martinho Júnior, Luanda
A lógica capitalista continua dominante na Rússia, mas aqueles que pretendem ressuscitar a era Yeltsin, alinhando a Rússia pelo padrão da aristocracia financeira mundial, sofreram nas últimas eleições presidenciais mais uma derrota.
Com a dissolução da União Soviética e a desagregação do bloco socialista na Europa do Leste, o tandem Gorbatchev – Yeltsin, pela mão deste último rendeu-se ao neo liberalismo e abriu as portas aos interesses elitistas daqueles que se propõem à globalização propensa à hegemonia uni polar.
A lembrança dessa “transição” que, para além do desaparecimento do estado soviético, evoca um tipo de ingerências e manipulações que se identificam com os processos em curso conforme às “revoluções coloridas” e à “primavera árabe”, faz parte das memórias de Putin e daqueles que, mesmo impregnados pela lógica capitalista, têm como referência histórica não as elites que com o neo liberalismo se procuram impor a partir do exterior, mas o seu próprio povo, levando em consideração as desigualdades e assimetrias que atingem a sociedade.
Ieltsin significou a implantação de dois factores em relação aos quais a Rússia tem reagido desde que Putin assumiu o poder: a Rússia tem dado combate às manipulações e ingerências que promovem os interesses da hegemonia, particularmente em relação ao controlo de suas imensas riquezas naturais, assim como tem dado combate às tendências de desagregação nas periferias da Federação que, em função do seu imenso território, das desigualdades e assimetrias atingem algumas regiões, particularmente no Cáucaso.
Em “Veinte anos sin la URSS” Higino Polo abordou o papel de Gorbatchov e de Yeltsin, pondo a nu o carácter das políticas seguidas por eles (http://www.rebelion.org/noticia.php?id=142726).
Os traços dessas políticas podemos encontrar também nas “revoluções coloridas” e na “primavera árabe”…
A formação das novas elites russas, tirando partido das enormes capacidades da Rússia em petróleo e gás, deu azo a que a oligarquia nacional tivesse de fazer opções, sacudindo as pressões ultra liberais e procurando uma via alternativa no quadro dum universo multi polar.
O tandem Putin – Medvedev é o expoente da tentativa dessas novas elites capitalistas perseguirem uma trilha que integra um espaço político e geo estratégico distinto, eminentemente euro-asiático mas com implicações em várias regiões do globo, que vai assumindo, à medida que as tensões aumentam por todo o Médio Oriente, a contradição em relação aos interesses da aristocracia financeira mundial, com expressão nas condutas da hegemonia uni polar.
O imenso território russo obriga, sob o ponto de vista geo estratégico, que a Rússia, mesmo enfraquecida e minada pelo neo liberalismo, seja muito mais que uma potência regional quando as disputas têm como referência o petróleo, o gás e as condutas do seu transporte, continentais e marítimas.
Se as potencialidades do petróleo, do gás e das condutas penderam para os capitais com geo estratégias multi polares, a Rússia precisa agora de expandir outros sectores de produção, recuperando capacidades científicas e tecnológicas que têm sua raiz no passado, até por que a imensa Sibéria e o extremo leste são regiões à espera de impactos transformadores que visem diminuir as assimetrias da Federação.
Há 5 anos, a 10 de Fevereiro de 2007 na Conferência de Munique sobre as questões de segurança (http://www.voltairenet.org/La-gouvernance-unipolaire-est), Putin já havia considerado a forma de governo uni polar como “ilegítimo e imoral”; agora, no quadro das últimas eleições, Putin vai mais longe: assume com mais convicção as responsabilidades geo estratégicas da Rússia nesse universo multi polar, aproximando-se de outros actores como a China, os outros BRICS e os latino americanos (sobretudo os que compõem a ALBA).
«Il y a vingt ans, le monde était divisé sur le plan économique et idéologique et sa sécurité était assurée par les potentiels stratégiques immenses des deux superpuissances.
La confrontation globale reléguait les problèmes économiques et sociaux urgents à la périphérie des relations internationales et de l’agenda mondial.
De même que n’importe quelle guerre, la Guerre froide nous a laissé, pour ainsi dire, des obus non explosés.
Je pense aux stéréotypes idéologiques, aux doubles standards et autres clichés hérités de la mentalité des blocs.
Le monde unipolaire proposé après la Guerre froide ne s’est pas non plus réalisé.
Certes, l’histoire de l’humanité a connu des périodes d’unipolarité et d’aspiration à la domination mondiale.
L’histoire de l’humanité en a vu de toutes sortes.
Qu’est ce qu’un monde unipolaire?
Malgré toutes les tentatives d’embellir ce terme, il ne signifie en pratique qu’une seule chose : c’est un seul centre de pouvoir, un seul centre de force et un seul centre de décision.
C’est le monde d’un unique maître, d’un unique souverain.
En fin de compte, cela est fatal à tous ceux qui se trouvent au sein de ce système aussi bien qu’au souverain lui-même, qui se détruira de l’intérieur.
Bien entendu, cela n’a rien à voir avec la démocratie, car la démocratie, c’est, comme on le sait, le pouvoir de la majorité qui prend en considération les intérêts et les opinions de la minorité »…
A situação da 2ª década do século XXI confirma (no após dissolução da União Soviética e desagregação do bloco socialista), que o desaparecimento da URSS, ao dar sequência à ofensiva do capitalismo neo liberal, provoccou o fortalecimento da China concomitantemente à decadência norte americana, pelo que é sobretudo na interligação com a China que Putin busca o campo de acção e manobra geo estratégica das novas elites russas, em todo o enorme espaço do maior continente da Terra, o continente euro-asiático.
Contrariar isso na Rússia por via de eleições, de provocações, ou da expressão na rua, em nome duma globalização que provoca cada vez mais desequilíbrios e assimetrias, uma globalização que privilegia as soluções elitistas que gerem tensões, conflitos e guerras de toda a ordem, tem sido uma experiência fracassada, em especial desde que o processo Yukos marcou o ocaso da era Yeltsin (Outubro de 2003).
O tandem Putin – Medvedev percebe agora o compasso do Mundo, pela própria leitura do que se passa intra muros; não é de admirar a sua posição em relação à Síria, comprovada que foi a geo estratégia uni polar com os acontecimentos da Líbia !
Foto: Boris Yeltsin com um dos seus principais serguidores na Rússia, Mickhail Khodorkovsky, o ultra liberal ao serviço dos oligopólios ocidentais do petróleo e do gás.
- Boris Yeltsin – Wikipedia – http://pt.wikipedia.org/wiki/Boris_I%C3%A9ltsin
- Mickhail Khodorkovsky – Wikipedia – http://en.wikipedia.org/wiki/Mikhail_Khodorkovsky
Sem comentários:
Enviar um comentário