terça-feira, 1 de maio de 2012

COMEMORAÇÕES DA HIPOCRISIA



Adão Cruz - Aventar

Eu peço desculpa por este creme feito de leite azedo e de gosto amargo mas não sou eu o responsável pelos ingredientes. Aquilo que se passou naquele lugar que dá pelo nome de Assembleia da República, e deveria chamar-se Assembleia dos Interesses alheios à República, foi uma enfadonha cantilena sem qualquer alma e um despudorado ramalhete de hipocrisia. Até os pobres dos cravos pareciam todos murchos.

Ainda que respeitando e salvaguardando as pessoas honestas e sinceras que lá se encontravam, esta desenraizada cena, esquálida e amarelecida múmia da revolução, sem sangue nem vida, repugna e faz subir à garganta um nó que só consegue desatar-se quando uma lágrima de saudade humedece o canto dos olhos.

Ouvir o Presidente percorrer no seu discurso todo um mundo feito de males e bens, com a escamoteada intenção de branquear os males e redimir-se da grande responsabilidade que teve na génese da miséria que hoje somos, vá que não vá. O que se torna insuportável é ouvi-lo a meter, a martelo e a contragosto, o 25 de Abril aqui e ali, disfarçadamente , para enfeitar as palavras do discurso.

E quase nos apetece dar razão àquele sujeito com ar assim… assim grosso modo, de olhos ramelados pelo ódio, usando o cérebro com a fralda de fora, aquele sujeito com comportamento que parece marginal à linha darwiniana, aquele sujeito com a polícia à perna e que terá deitado mil e tal milhões de todos nós pelo cano abaixo, ou por canos que ninguém sabe onde vão dar, quando chama a estas coisas “folclore abrileiro”.

Claro que não é ao folclore da Assembleia que ele quer chegar. Embora isso o incomode, ele sabe que é uma farsa com a qual até poderia ser tolerante e colaborante, se fosse hipócrita, coisa que, honra lhe seja feita, não é. É facho genuino, embora por vezes use entre dentes e com sorriso provocador, a palavra democracia, que ele sabe não ter na sua boca a minima força para ser levada a sério.

Onde ele quer chegar com o seu “folclore abrileiro” é mesmo às comemorações autênticas e verdadeiras, à pureza e ao cerne das comemorações do 25 de Abril, mas todos sabemos que isso não passa de uma daquelas tiradas genuinamente fascistas que desde há muitos anos lhe entopem a garganta.

Mas o 25 de Abril é grande de mais para almas tão pequenas.

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