Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
O presidente do grupo Impresa, Francisco Pinto Balsemão, disse hoje à Lusa que vai avançar com um processo judicial contra os autores do documento sobre o caso das secretas.
De acordo com a imprensa de hoje, o espião made in Portugal da era moderna, Jorge Silva Carvalho, mandou fazer um relatório sobre a vida privada do patrão da SIC, Expresso e outros.
Como Pinto Balsemão é o militante número um do PSD, para além de ser seu fundador, se calhar do relatório consta que terá saltado a cerca com alguma dirigente da Oposição. Com espiões deste nível tudo é possível, vale tudo até fazer “espionagem interpretativa”.
Segundo o Jornal de Notícias, “Jorge Silva Carvalho encomendou relatórios às secretas sobre pessoas cuja vida interessava à Ongoing. A investigação sobre Pinto Balsemão foi elaborada por um especialista ex-agente das secretas”.
E quando se trata de especialistas de fabrico português é preciso ter calma. É que eles são mesmo bons em meter água, em confundir a obra prima do mestre com a prima do mestre de obras.
Fazendo uso, com a devida vénia, da terminologia de Luís Menezes, um dos vice-presidentes do PSD, também ele especialista e experiente catedrático (por parte do pai), diria que tudo isto é uma "chafurdice política".
“Tendo tomado conhecimento, através da comunicação social, do conteúdo do relatório sobre mim produzido, no qual são referenciadas dezenas de calúnias e falsidades- algumas das quais de mau gosto e grotescas - decidi proceder às diligências necessárias, junto dos meus advogados, no sentido de responsabilizar criminalmente os autores do documento”, disse Francisco Balsemão, numa declaração escrita à Lusa.
Balsemão, que também foi primeiro-ministro, disse estar surpreendido (já tem idade e experiência política, sobretudo partidária, para não se surpreender) e chocado com os “métodos, os princípios e as práticas adoptados por pessoas e empresas que desenvolvem as suas actividades livre e impunemente numa sociedade democrática”.
Balsemão parte de um erro crasso que o leva a conclusões que batem sempre ao lado. Faria sentido falar da impunidade que alguns gozam por a terem comprado se, de facto, vivesse numa sociedade democrática. Ora, comparar o Portugal de hoje com uma democracia ou com um Estado de Direito é mais ou menos como estar à espera que um embondeiro dê loengos.
Por isso, conclui Pinto Balsemão, “quase 40 anos depois da instalação da democracia em Portugal, é lamentável que se continuem a praticar este tipo de métodos 'pidescos' que julgávamos erradicados e que o sistema judicial devia rapidamente punir, condenar e abolir”.
É evidente que, com ou sem operações furacão, faces ocultas, BPN, submarinos, sobreiros, fundo ultramarino, “free port”, Camarate, Casa Pia etc. o sistema judicial vai prontamente condenar e punir os pilha-galinhas. Tudo o resto vai continuar na mesma.
De acordo com o diário, que cita um documento que consta do processo do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa de que resultou acusação contra Silva Carvalho, Nuno Vasconcellos (presidente da Ongoing) e João Luís por corrupção, “Paulo Félix, antigo quadro da Polícia Judiciária, ex-agente de ligação da Europol, ex-membro do SIS e antigo director da área da Presidência do Conselho de Ministros, entregou ao superespião” informação sobre Pinto Balsemão.
Mas, é claro, todos vão desmentir todos de modo que, depois de a poeira passar, tudo fique na mesma e os mesmos possam no calor da noite ir beber um copo às pérolas negras da praça lusitana.
Entretanto, como seria de esperar, Paulo Félix nega o seu envolvimento e admite avançar judicialmente: “Repudio totalmente a atribuição que me é feita sobre a autoria do chamado 'relatório sobre Pinto Balsemão' (...) e reservo-me o direito de reagir, a esta e outras notícias que têm surgido na imprensa a meu respeito, através de todos os meios legais ao meu alcance”.
Nem mais. Ninguém é culpado de coisa alguma. Cá para mim também este caso, salvo uma ou outra punição cosmética para a dona Maria (a mulher da limpeza), vai ficar em águas de bacalhau. Pelo cheiro, a água está putrefacta há muitos anos. Mas, apesar disso, há sempre alguns (ao que parece são muitos) para quem chafurdar na merda é mesmo uma questão de vida.
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: AUSTRÁLIA OU BURKINA FASO? TANTO FAZ!
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