João Lemos Esteves – Expresso, opinião, em Blogues
1. Cavaco lá acabou por promulgar as alterações ao Código do Trabalho. Com o aplauso da direita e a indiferença do PS - e a crítica contundente da extrema-esquerda. A CGTP qualificou mesmo a decisão de Cavaco como uma tomada de decisão em prol dos "mais fortes" contra os "mais fracos". Constituiu esta decisão uma surpresa? Nem por sombras: para Cavaco Silva a promulgação é a regra, sendo um veto uma decisão excepcionalíssima. Isto porque entende que o Presidente não deve impedir o trabalho dos executivos. Assim foi com José Sócrates (com os resultados mais do que conhecidos) - assim é com Passos Coelho.
2. Dito isto, será que Cavaco Silva poderia actuar de forma diversa - isto é, vetar as alterações ao Código do Trabalho? Cremos que Cavaco Silva - atendendo ao seu perfil e percurso - não teria alternativa. Vejamos porquê:
(i) Em primeiro lugar, Cavaco Silva não tinha margem de manobra política para vetar o diploma. Ora, o diploma foi proposto pelo Governo, aprovado pelo PSD e CDS, subscrito pelo PS - merecendo apenas a oposição de BE e PCP. Se Cavaco Silva vetasse as alterações, ficaria politicamente isolado. Iria contra a vontade da maioria que é Situação - e contra o principal partido da oposição, o único que poderá vir a tornar-se Situação num futuro próximo. Assim, Cavaco não tinha força nem espaço político para decidir de forma diversa - se o fizesse, iria contra as forças políticas qualificadas como democráticas.
(ii) Em segundo lugar, Cavaco Silva, ao não promulgar, evitou uma colagem com a extrema-esquerda. Com efeito, caso Cavaco Silva vetasse o diploma, ficaria conotado com as posições do PCP e do BE. Consequência: teríamos um Presidente que se colocaria frontalmente contra uma política matriz do Governo Passos Coelho - à qual nem o PS teve coragem de se opor. Cavaco Silva certamente sabia que o veto acarretaria um desgaste enorme para o Governo Passos Coelho - e o Presidente não quer ficar carregado com esse ónus.
(iii) Em terceiro lugar, Cavaco Silva está ciente dos compromissos internacionais do Estado português - assinados por PSD, CDS e PS. Caso Cavaco Silva vetasse, daria um sinal muito negativo aos mercados e aos parceiros europeus. Seria o responsável mor por uma pequena grande crise política - sem propor caminho alternativo. Ora, o veto seria, pois, uma incoerência tremenda de Cavaco: relembre-se que o Presidente apoiou a vinda da troika e a queda de José Sócrates quando Passos Coelho inviabilizou o PEC.
3. Posto isto, o ponto crítico da actuação de Cavaco Silva foi a nota enviada à Assembleia da República: Cavaco Silva, ao invés de apontar as insuficiências do diploma, nomeadamente em termos de injustiça social (sim, porque o Direito do Trabalho visa mesmo tutelar a parte mais débil - este não é um simples chavão da extrema-esquerda), limitou-se a pedir estabilidade nas leis que regulam as relações laborais. Palavras para quê? É Cavaco Silva.
Nota para o Presidente: 10 valores.
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