Alfredo Muvuma – Maka Angola
Já muita gente percebeu que, ao nível da comunicação social pública, o director-geral do Jornal de Angola, José Ribeiro, não tem nenhum concorrente à vista: é, destacadamente, o maior lambe-botas do governo.
Ele vê nas mais pequenas e insignificantes realizações do governo aquilo que mais nenhum angolano enxerga: singularidade, imponência, grandiosidade e, sobretudo, generosidade do Presidente da República.
Mas na edição do dia 8 de Julho do jornal que dirige, José Ribeiro superou-se a si mesmo. Os elogios ao programa habitacional do governo raiaram o ridículo.
Depois de ter visitado a quase desabitada centralidade do Kilamba, de onde saiu profundamente deslumbrado, José Ribeiro sucumbiu à emoção e ao desvario nos rasgados elogios que teceu à gigantesca cidade fantasma.
É uma pena que José Ribeiro não enxergue um palmo para além da centralidade do Kilamba. Se o fanatismo não lhe toldasse gravemente os olhos e a mente, o director do Jornal de Angola saberia que a realidade do país real – e não aquele cor de rosa, destinado a ser vendido a incautos visitantes – não tem nada a ver com as “habitações confortáveis” que ele supõem existirem nos Zangos e outros bairros pelo país adentro.
Se José Ribeiro abrisse mão, por apenas algumas horas, do conforto do seu gabinete e decidisse viajar pelo país para ver o que se faz em matéria habitacional, chegaria à imediata conclusão que o governo não faz milagre nenhum ao “construir 200 habitações em cada município”. É que a maior parte do que lá se faz não pode ser designado como habitação.
No interior do país e, nomeadamente, em alguns municípios de Malanje, há uma realidade, no mínimo, gravemente ofensiva para os naturais dessas localidades e, mais ainda, para os cidadãos a que se destinarão aquilo que no jargão oficial se designam por casas evolutivas.
As chamadas casas evolutivas, erguidas por vontade de José Eduardo dos Santos (afinal não é ele quem decide tudo?), em algumas localidades do país, são um verdadeiro escárnio aos filhos desta Angola.
O que a foto documenta, eufemísticamente designado como casa evolutiva, é um conjunto de paredes disposto num espaço de 4X4 metros, dividido em duas partes iguais, e que será distribuído por duas famílias. Para além de partilharem paredes comuns, os futuros habitantes desses cubículos terão ainda de concordar num calendário para o acesso à retrete, já que esta também é comum.
Aquelas mentes pagas para cobrir de generosidade e magnanimidade toda a palavra e acto do Presidente, não perderam tempo a descobrir que as ditas casas evolutivas são uma alavanca muito forte na cruzada contra a pobreza. Pergunta-se: como é que em pleno século XXI, se pretende combater a pobreza construindo cubículos em que é de todo impossível acomodar, ao mesmo tempo, cama, geleira ou arca, fogão, televisor e mesa, cadeiras e outros móveis indispensáveis a um conforto mínimo?
Estima-se que uma boa parte desses cubículos estejam prontos a tempo de serem distribuídos no dia 28 de Agosto, exactamente o dia em que o Presidente completará 70 anos de vida. A coincidência entre o aniversário presidencial e a entrega dos cubículos associará, para sempre, o nome de José Eduardo dos Santos a um dos piores insultos ao povo angolano.
Por mais fértil que seja a imaginação, não se afigura nada fácil acomodar num apertado espaço de 2×2 metros o quarto, a cozinha, a sala e os respectivos móveis. E mais: os infelizes contemplados terão de sujeitar-se prévia ou posteriormente à castração. É de todo impossível que espaços com as dimensões das ditas casas evolutivas possam ser habitados por famílias, por mais pequenas que sejam.
Depois da construção de 500 “casas” em Viana, Panguila, Zango I e outros projectos habitacionais de deplorável qualidade, o executivo dá mais um passo na sua cruzada de sistemático e reiterado desrespeito para com os angolanos.
É caso para dizer que o Presidente retribui com desprezo e desonra a lealdade e a fidelidade de muitos angolanos. E neste caso ele não é o único culpado. Se os angolanos se fizessem respeitar, se não se resignassem à condição de feudo eleitoral, José Eduardo dos Santos não se atreveria a pisoteá-los. Se os angolanos soubessem valorizar o seu voto, José Eduardo dos Santos pensaria duas ou mais vezes antes de mandar executar uma empreitada que configura uma verdadeira provocação e desprezo aos filhos deste país.
Quando José Eduardo dos Santos fala em “Crescer Mais e Distribuir Melhor”, afinal do que verdadeiramente se trata é de proporcionar apartamentos luxuosos, avaliados em milhões de dólares, para os seus filhos, enquanto uma boa parte dos angolanos é remetida para cubículos.
Outro exemplo de “crescimento e distribuição” à moda do actual executivo é o destino dado a espaços públicos de estacionamento em Luanda.
Defronte do antigo cinema Avis havia um espaço onde as pessoas que iam ao cinema estacionavam as suas viaturas. Esse espaço hoje já não existe. Tchizé dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos, decidiu que só poderia mandar construir o seu Solar do Alvalade, o mesmo prédio em que, segundo o portal Club K, o seu irmão ganhou um apartamento avaliado em vários milhões de dólares.
Se José Ribeiro não se empenhasse em entortar a história deste país, para agradar ao Presidente, saberia também que defronte do Jornal de Angola havia um largo usado para estacionamento, mais tarde baptizado pelas autoridades angolanas com o nome de Julius Fucik. Até funcionários do próprio Jornal de Angola parqueavam ali os seus carros. No lugar do parque hoje nasceram dois arranha-céus. Também neste caso o lema “Crescer Mais e Distribuir Melhor” não poderia ser mais elucidativo daquilo que é o verdadeiro programa de governo do MPLA.
Foto: Casas para o povo, estrada de Malanje, em Maka Angola
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