Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
À semelhança do que acontece com o seu país, sobre a CPLP em geral e a Guiné-Bissau em particular, Cavaco Silva sabe o que diz mas não diz o que sabe. Melhor fora ficar calado.
Falando hoje em Maputo na IX Cimeira de Chefes de Estado e de Governo, o presidente português elogiou a actuação da Comunidade de Países de Língua Portuguesa dizendo que foi ela que conseguiu colocar na agenda internacional a “necessidade e urgência” da condenação do golpe de Estado de Abril na Guiné-Bissau.
“Foi atuando neste quadro de referência e de forma solidária que soubemos prestar auxílio ao país irmão da Guiné-Bissau, trazendo para a agenda internacional a necessidade e a urgência da condenação do golpe militar de 12 de Abril por parte dos nossos parceiros bilaterais, União Africana, da União Europeia e do Conselho de Segurança das Nações Unidas”, sublinhou o chefe de Estado português numa clara manifestação que visa branquear o que se passou na Guiné antes deste golpe.
Cavaco Silva assinalou que os estados da CPLP têm uma responsabilidade acrescida, no plano internacional, na defesa e difusão dos princípios fundadores da comunidade, nomeadamente a paz, o Estado de Direito democrático, os direitos humanos e o desenvolvimento económico-social.
Certamente ao falar de Estado de Direito democrático estaria a pensar em Angola, país cujo presidente está no poder há 33 anos sem nunca ter sido eleito.
“Não tenhamos dúvidas: a nossa união e coerência, no seio da CPLP, tem tornado cada um dos nossos países mais forte, tanto no contexto regional, como no plano internacional. A força da nossa comunidade reflecte-se assim, em cada estado-membro, sendo simultaneamente, ela própria uma força credível”, frisou o Presidente português.
Cavaco Silva não referiu, mas certamente ao falar de credibilidade estaria a pensar nos lautos jantares que a CPLP organiza nos principais areópagos da política lusófona, ou no facto de, no universos da CPLP, haver 28 milhões de pessoas desnutridas, ranking liderado por Angola (44%), Moçambique (37%), Guiné-Bissau (31%) e Timor-Leste (23%).
Cavaco Silva apontou Timor-Leste como exemplo de sucesso de consolidação de um estado pelo sentido cívico e maturidade eleitoral com que realizou em apenas um ano dois processos eleitorais.
“O sucesso do processo de consolidação do Estado timorense, que só este ano atravessou, com sentido cívico e elevada maturidade política, dois processos eleitorais, prestigia a CPLP e constitui um exemplo para o mundo”, realçou o chefe de Estado português.
Estaria Cavaco Silva a falar da violência pós-eleitoral em que foram destruídas 60 viaturas, e se registaram vários feridos e pelo menos um morto? Ou seria da corrupção que reina no governo de Xanana Gusmão?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que em Angola 68% da população é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que em Angola 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que três países lusófonos - Guiné-Bissau, Angola e Moçambique - estão entre os que têm a pior taxa de mortalidade infantil, de acordo com o relatório sobre a Situação da População Mundial relativo a 2011?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que, segundo o relatório do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), em cada 1.000 nascidos vivos, morrem 192,6 na Guiné-Bissau (só ultrapassada pelo Afeganistão e pelo Chade), 160,5 em Angola e 141,9 em Moçambique?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que entre os países de língua portuguesa, seguem-se São Tomé e Príncipe, com 77,8 crianças, e Timor-Leste, com 56,4?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que, ainda no capítulo da saúde materno-infantil, 1.000 em cada 100.000 mulheres na Guiné-Bissau morrem no parto (pior registo só no Afeganistão e no Chade)?
Alguém na CPLP, a começar por Cavaco Silva, quer saber que, no que diz respeito à taxa de partos entre adolescentes (15 a 19 anos), é Moçambique que lidera, com 185 (em cada 1.000), 170 na Guiné-Bissau, 165 em Angola, 92 em Cabo Verde, 91 em São Tomé e Príncipe, 59 em Timor-Leste?
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: REGIME ANGOLANO SOMA MAIS UM ÊXITO!
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