André Catueira, da Agência Lusa
Chimoio, Moçambique, 08 set (Lusa) - Francisco Tembo é cego, mostra-se seguro nas palavras e nos passos, mas sem a certeza se o seu sentido de voto foi cumprido nas últimas eleições, por falta de um voto especial, com grafia em Braille, que lhe garantiria independência.
"É mais fiel e seguro votar sozinho. Não falta traição quando o seu voto é confiado a um acompanhante. A vantagem de um voto especial em Braille é que a pessoa se tornaria independente na escolha", disse à Lusa Francisco Tembo, presidente da Associação dos Cegos e Amblíopes de Moçambique (ACAMO), em Manica, centro de Moçambique.
A organização lamenta o facto de continuar a ser excluída dos processos eleitorais em Moçambique, ao não ser instituído, até ao momento, um voto especial para este grupo de eleitores, e reclama boletins de voto com grafia em Braille.
Tembo receia que nas próximas eleições autárquicas, em 2013, e gerais (eleição das assembleias provinciais, deputados da assembleia e Presidente da República), em 2014, se repitam os episódios dos anteriores atos eleitorais, em que votos dos deficientes visuais terão sido adulterados por acompanhantes.
"Lamentamos o facto de ainda não termos o boletim de voto em Braille. É uma necessidade para se fazer inclusão no processo de votação, para trazer segurança na escolha da nossa posição política" reafirma Francisco Tembo.
A legislação eleitoral em Moçambique estabelece que o voto é secreto. Contudo, os deficientes visuais ainda não gozam deste direito.
Atualmente, os órgãos de administração eleitoral garantem que apenas membros da mesa de voto devidamente autorizados, o acompanhante do deficiente visual e delegados dos partidos credenciados sejam os únicos a conhecerem o voto do eleitor cego nas eleições.
"Gostava de poder votar sozinho e ter certeza que votei na pessoa e partido que quero que me governe", observa Rosário Robat, que é cego.
Enquanto não chega um boletim de voto especial, diz, a ACAMO vem trabalhando numa campanha de sensibilização para mudança de comportamento e atitude entre os membros, no sentido de encontrarem um acompanhante fiel para as eleições.
Contudo, o Conselho de Ministros aprovou esta semana o Plano Nacional da Área de Deficiência 2012-2019, um instrumento que pretende harmonizar as intervenções, do Governo e parceiros, na assistência a pessoas portadoras de deficiência.
Para a implementação do plano, que também vai ajudar na planificação, orçamentação e desenvolvimento da ação na área de deficiência, serão investidos mais de 890 milhões de meticais (254,2 milhões de euros).
"Nós acompanhamos com muita satisfação a aprovação do orçamento para a área de deficiência e achamos ser um bom passo. Esperamos que também que os decisores avancem para o boletim de voto em Braille, a esperança para nós é a última coisa a morrer", diz à Lusa Francisco Tembo.
Em Moçambique, parte da Constituição da República já esta impressa em grafia Braille, o que, para a ACAMO, é uma vitória.
A Organização Mundial de Saúde estimou, em 2009, que mais de cem milhões de africanos possam contrair a oncocerciasis, a doença que causa a cegueira e problemas de pele.
Em Moçambique, a província de Tete (centro) é que apresenta a maior prevalência de pessoas com deficiência visual.
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