Nuno Saraiva – Diáriode Notícias, opinião
Paulo Portas pode
dar as piruetas que quiser, fazer as coreografias que entender, gritar que é
"politicamente incompatível" com a taxa de sustentabilidade das pensões.
Pode até fazer o pino no Palácio das Necessidades ou jogging em Caracas que o
"cisma grisalho" que jurou querer evitar já está instalado.
Depois de ter
conseguido virar trabalhadores do sector privado contra funcionários públicos,
o Governo segue agora a mesma receita de casta, isto é, virar os novos contra
os velhos, confrontando os "grisalhos" com a acusação de que vivem -
só falta dizer criminosa e parasitariamente - à custa dos descontos de quem
está hoje no ativo. A pretexto da solidariedade intergeracional - como se ela
existisse apenas num sentido -, pretende-se fazer crer que a Segurança Social
só terá futuro se as expectativas de quem, com carreiras contributivas mais ou
menos longas, conquistou o direito a viver o que resta da vida com dignidade e
tranquilidade forem agora defraudadas. Como se, nos últimos dois anos, os
pensionistas tivessem ficado isentos da austeridade. Como se, num país onde
existem mais de um milhão de desempregados - mais de 40% são jovens - e em que
só 44% recebem subsídio de desemprego, não fossem os reformados a contribuir
para que não falte o pão na mesa a filhos, noras e netos. Isto também é, como é
óbvio, solidariedade entre gerações.
Nas últimas duas
semanas, como nos últimos dois anos, assistimos a uma ofensiva de terrorismo
social sem precedentes, com alvos bem selecionados: os mais velhos e os mais
novos, os reformados e os funcionários públicos.
Primeiro alarmam-se
três milhões de cidadãos com o anúncio de uma taxa sobre as pensões que, 48
horas depois, ficamos a saber não reúne o consenso na coligação. Mais tarde, e
não sei quantos Conselhos de Ministros extraordinários depois, percebemos que a
taxa, aceite pela troika como garantia para o fecho da sétima avaliação, é
afinal facultativa e não obrigatória - como se alguém, no seu perfeito juízo,
acreditasse que as medidas acordadas com "estes senhores" não
tivessem carácter obrigatório. E descobrimos que "a fronteira que não pode
ser ultrapassada" pelo partido dos contribuintes e dos reformados ficou
afinal para trás no momento em que o líder do CDS permitiu a inclusão da taxa
no menu acordado. Portanto, a taxa existe e ponto final! E este é o mesmo Paulo
Portas que, continuando no Governo, não cora de vergonha nem pede perdão à
Nossa Senhora de Fátima por se associar à convergência retroativa dos regimes
de pensões - mais uma inconstitucionalidade grosseira - validando um novo
esbulho de 10% aos reformados.
E depois há o
problema demográfico que torna insustentável a Segurança Social. É verdade que
em Portugal nascem cada vez menos crianças. Mas quem é que se arrisca a ter
filhos na iminência de ficar desempregado e numa recessão económica sem fim à
vista? E será que a insustentabilidade do sistema de pensões não resulta também
da redução drástica da matéria tributável e contributiva, consequência de um
desemprego que continua a crescer?
Se a isto juntarmos
o plano de despedimentos na administração pública, os cortes nos subsídios de
desemprego, a falta de políticas de crescimento e criação de emprego, e todas
as medidas austeritárias que são o alfa e o ómega da governação, ficamos
esclarecidos sobre as razões que levaram em tempos o primeiro--ministro e um
ex-secretário de Estado a incentivar os jovens a saírem da sua zona de conforto
e a emigrarem para outras paragens. Desde o início que o plano ideológico do
Governo de Passos Coelho e de Vítor Gaspar, com a cumplicidade de Paulo Portas,
era, afinal, ver-se livre do maior número possível de portugueses. Velhos ou
novos.
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