Hélder Xavier -
Verdade (mz)
O líder da Renamo,
Afonso Dhlakama, disse, na última quarta-feira, que se Sathunjira, o seu
"quartel-general" na província central de Sofala, for atacado, tal
acto constituirá um precedente para um conflito no país. Dhlakama confirmou
ainda a autoria dos últimos ataques em Muxúnguè por parte dos seus homens e
negou o assalto ao paiol de Savane, em Dondo. "Eu não quero a
guerra", afirmou peremptoriamente na conferência de imprensa realizada em
Gorongosa. Num outro pronunciamento, afirmou que o chefe de Estado, Armando
Guebuza, "não é um líder sério".
Na vila municipal
de Gorongosa, na província de Sofala, a agitação é a mesma de sempre, apesar de
há mais de quatro meses na zona ao redor do distrito notar-se a entrada de
militares da Forças Armadas de Moçambique (FADM) e agentes da Força de
Intervenção Rápida (FIR), uma unidade paramilitar da Polícia da República de
Moçambique (PRM), todos os dias. Diga-se de passagem, a população continua a levar
a habitual vida tranquila.
Porém, à entrada do
posto administrativo de Vunduzi, a 30 quilómetros da vila sede de Gorongosa, o
cenário é outro. Uma cancela improvisada da Polícia de Trânsito e da FIR no
único acesso à localidade chama a atenção de quem por lá passa. Todos os
veículos que se fazem àquele local são revistados pela Polícia moçambicana. Ao
longo da via é possível ver militares da FADM de arma em punho, dando a
impressão de que se caminha para uma região de guerra. O motivo é o presidente da
Renamo, Afonso Dhlakama, que se encontra “aquartelado” em Sathunjira desde
Outubro do ano passado. "Eu não sou prisioneiro, porque é que sou
cercado?", questionou Dhlakama numa conferência de imprensa havida na
quarta-feira, 03 de Julho, e acrescentou que “começo a acreditar nas
informações de que me querem fazer aquilo que fizeram ao Savimbi, digo que não
é a solução. Talvez em Angola tenha sido uma solução”.
Descontraído e no
habitual jeito “informal” que o caracteriza, o líder da Renamo afirmou que só irá
a Maputo para o encontro com o Presidente da República, Armando Guebuza, se
forem criadas condições para a sua segurança pessoal e sejam retiradas as
forças militares ao redor de Sathunjira. Sublinhou que está disposto a ir, mas
não pode fazê-lo porque a zona onde se encontra é cercada pelo exército
moçambicano.
“Não é porque a
Frelimo pode atacar, mas os meus homens, sabendo que não estou, podem ser os
primeiros a fazê-lo”, disse tendo ainda afirmando que "qualquer ataque à
Sathunjira é generalizar a terceira guerra em Moçambique. […] É diferente um
ataque aqui outro ali. Eu não quero que isso aconteça porque jurei que jamais
iria dirigir a guerra. Estou aberto a ir a Maputo com a condição de se retirar
essas forças de modo a evitar-se que, na minha ausência, façam o ataque ou os
meus homens iniciem a investida". Porém, num outro ponto, o líder da
Renamo questionou a razão de o encontro não poder ser realizado em Gorongosa. E
afirmou também que o chefe de Estado, Armando Guebuza, "não é um líder
sério", porque só reage quando a situação está crítica.
“O problema é a Lei
Eleitoral”
A revisão da Lei
Eleitoral continua a ser a exigência do partido Renamo. Na passada
quarta-feira, Dhlakama voltou a tocar no assunto, tendo comentado que essa é a
razão do impasse com o Governo moçambicano. Se as negociações entre as
delegações do Executivo de Armando Guebuza e da Renamo que já vão na sua 9ª
ronda avançarem, a sua força política vai participar nas eleições autárquicas
que se avizinham. Segundo o líder do maior partido da oposição, a actual lei
destina-se a acabar com a democracia em Moçambique e criar um conflito
interminável.
“É preciso que essa
lei seja revogada, é necessário introduzir novos elementos para melhorá-la de
modo que seja um dispositivo capaz de fazer com que qualquer força política do
país sinta que vai jogar num campo sem espinhos”, disse, tendo acrescentado ainda
que o principal obstáculo à democracia em Moçambique é a FIR, criada
ilegalmente há 20 anos.
A Renamo reivindica
a paridade de membros na composição dos órgãos eleitorais do país. “Eles enchem
as urnas de votos sozinhos no Secretariado Técnico de Administração Eleitoral
(STAE)”, acusou Afonso Dhlakama para depois questionar: “Porque é que eles têm
medo de se juntar aos outros?”
Sobre a delegação
do Governo no diálogo, Dhlakama afirmou que "eu mandei o meu grupo
seriamente, só o Pacheco é que não é sério". O líder da Renamo disse que o
seu partido não luta para ganhar as eleições, mas sim para que a democracia se
torne efectiva em Moçambique.
“Nós conhecemos
dois Presidentes, não falo muito sobre Samora Machel porque o seu tempo era da
revolução, de ódio, de perseguição aos colonos. Muitos dizem que era comunista
mas, na verdade, ele não sabia o que era comunismo, lia o que os outros
escreviam e repetia 'A luta continua'. E o outro (Joaquim Chissano) tentou
melhorar, não digo que foi o melhor porque também roubou votos. Agora este
(Guebuza) não. Se ele conseguisse, já teria mudado a Constituição da República
para concorrer 40 vezes, essa é a intenção dele”, disse.
Dhlakama salientou
que, se o mandato de Armando Guebuza terminar enquanto não tiverem sido resolvidos
os problemas relacionados com as reivindicações apresentadas pelo seu partido e
não houver eleições, a Renamo será obrigada a fazer uma campanha para a
formação de um Governo de transição.
A despartidarização
da PRM foi também um dos assuntos levantados pelo líder da Renamo. Afonso
Dhlakama disse que os seus homens só integrarão a Polícia moçambicana se esta
deixar de pertencer ao partido Frelimo. “Se isso acontecer, eu já posso dormir
com a minha família sem medo de ninguém. Agora não é possível levar um homem
que garante a minha segurança e colocar na Polícia da Frelimo, amanhã ele pode
vir assassinar-me. Eu não sou burro”, afirmou.
De acordo com
Dhlakama, a Renamo não é um partido armado, ao contrário da força política no
poder que obriga todos os agentes da PRM a serem seus membros. “Os nossos
homens foram corridos das FADM e os poucos são forçados a filiar-se à Frelimo.
A FADM, que era orgulho nacional, já não é uma instituição do Estado, passou a
ser um exército da Frelimo. Agora, qual é o partido armado?”, questionou.
Num outro
pronunciamento, respondendo às questões colocadas pelos jornalistas sobre a
possível participação da Renamo nas próximas eleições autárquicas, Afonso
Dhlakama garantiu que o seu partido vai participar caso a Lei Eleitoral seja
revista. “É preciso que se perceba que nós não estamos a boicotar as eleições,
pelo contrário, estamos a negar a forma como o processo é conduzido, é um
procedimento que vai matar a democracia”.
Ataques na EN1
Relativamente aos
ataques registados no passado mês de Junho na Estrada Nacional número 1,
concretamente no distrito de Chibabava, Afonso Dhlakama disse que houve um
aviso prévio e, acrescentou, não entende o porquê da prisão do chefe do
Departamento de Informação da Renamo, o brigadeiro Jerónimo Malagueta. “Ninguém
atacou civis, não era preciso ir até Muxúnguè para atacar os civis porque está
cheio de civis aqui em Sathunjira ou Gorongosa. Eu não ataco as pessoas
indefesas porque eu tenho o apoio delas”, sublinhou.
Malagueta foi
detido um dia depois de, numa conferência de imprensa, ter lido o comunicado do
seu partido no qual anunciava a paralisação da circulação de pessoas e bens na
EN1. “Ele leu uma declaração que não foi contra a Constituição, nem para dividir
o país. Não vejo nenhum erro. Podia ter dito coisas mais horríveis do que
aquilo porque há razões para isso”, disse o líder da Renamo e acrescentou que a
nota lida pelo brigadeiro teve a sua autorização e o objectivo da mesma era
alertar aos transeuntes de modo a tomarem cuidado ao circular naquele via que
liga a região norte ao sul do país.
Dhlakama disse
ainda que, enquanto os filhos dos dirigentes acumulam riquezas e estudam fora
do país, a Frelimo manda “crianças”, de 18 anos de idade, para morrer nos
confrontos com a Renamo. “Quero garantir a paz em Moçambique para todos,
sentimos por aquelas crianças das FADM, de 18 anos idade, a carregar ferros e
tudo para morrer de graça. Por isso, vocês jornalistas devem estar no lado
certo, não se preocupem com o dinheiro (...) a paz e a democracia não são para
a família Guebuza ou para a família Dhlakama são para nós todos", afirmou
o líder da Renamo.
Os problemas que se
verificam nos últimos dias, segundo Afonso Dhlakama, não são novos, eles surgem
do não cumprimento do Acordo Geral de Paz. “Se a Frelimo tivesse cumprido,
certamente, o problema seria outro. É que hoje querem que a Renamo aceite a
incompetência da Frelimo e assuma que está a perder as eleições porque não tem
capacidade, enquanto o mecanismo para a democracia não existe”, comentou.
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