Trazer ao país
médicos estrangeiros para atender a população não desqualifica os profissionais
brasileiros, como muitos pensam; ao contrário, reforça o poder de atendimento
do estado e da saúde pública. Mas todos esses protestos, por parte da classe
médica diante do projeto apresentado pelo governo, nos fazem refletir sobre o
tipo de formação que algumas faculdades brasileiras dão hoje aos profissionais
de medicina. Por Rui Ricardo Diaz.
Rui Ricardo Diaz (*)
– Carta Maior
Quando pela
primeira vez propõe-se um plano que pode iniciar um processo de melhoria na
saúde pública do país, com atendimento nos interiores dessa república, a classe
médica resolve gritar contra.
Por quê?
A maioria dos formandos de Medicina no Brasil, fora das grandes capitais, não exerce suas funções em sua cidade de origem. Com raras exceções, a maioria dos médicos não quer atender em cidades pequenas e pobres do interior do país, entre as alegações, falam da falta de estrutura e tecnologia.
Números oficiais do Conselho Federal de Medicina, o CFM, indicam que 70% dos médicos formados no Brasil atendem nas regiões Sul e Sudeste, enquanto que regiões do Norte e Nordeste carecem e sofrem com a falta de médicos. E sabemos que não há um contingente suficiente de médicos que dê conta de atender a população de um país com tamanho espaço geográfico como o do Brasil.
Trazer ao país médicos estrangeiros, com intuito de atender a população dessas cidades, não desqualifica os profissionais brasileiros, como muitos pensam; ao contrário, reforçam o poder de atendimento do estado e da saúde pública. Mas todos esses protestos, por parte da classe médica diante do projeto apresentado pelo Governo, nos fazem refletir, pensar e até, porque não, discutir o tipo de formação que algumas faculdades brasileiras dão hoje aos profissionais de medicina, muito voltada para a alta tecnologia de aparelhagens, para o tratamento da doença e não para a prevenção. E refletir sobre o que isso representa ao país.
Outro dia, ouvi um médico dizer que a “tal” extensão de dois anos do curso de medicina, já fora de discussão, era arbitrária e que, se valesse, deveria valer para todos e não só para os estudantes dessa área.
Há pouco mais um mês assisti a um espetáculo teatral chamado “Estamira”, baseado no ótimo documentário de Marcos Prado. A peça trata de uma mulher que sofre de distúrbios mentais e que vivia em Gramacho, um lixão no Rio de Janeiro. A personagem, Dona Estamira, desfilava um pensamento sem igual, uma visão singular sobre o ser humano e sobre o mundo. Em determinado momento, a personagem, interpretada com extrema beleza por uma potente atriz, dizia assim: “Ontem fui ao médico, e ele me receitou um remédio e nem sequer olhou nos meus olhos. Como alguém que se propõe a cuidar de outro alguém não olha nos olhos dele?! Como?”.
A “tal” extensão proposta pelo Governo deveria ser pensada para formandos de outras áreas, sim, isso só beneficiaria o Estado e, principalmente, a população. Mas estender o curso de medicina por mais dois anos, com atendimento à população carente, faria, em pouco tempo, grande diferença tanto para os necessitados quanto para o próprio médico. Falta, a muitos médicos formados hoje, um olhar outro para a saúde e para o país onde residem. Conhecer de perto os grotões do Brasil e entender a potência dessa profissão pode e deve servir de maneira única, definitiva, na formação de um profissional da saúde e, principalmente, no tratamento de seu igual, de seu espelho, como bem observa Dona Estamira.
Há alguns anos o Governador de Tovantins não conseguia angariar médicos que pudessem atender às pequenas cidades, as mais distantes, as mais pobres. Sem ter o que fazer, resolveu contratar algumas dezenas de médicos vindos de Cuba. Essa atitude, essa ação, melhorou a qualidade da saúde pública local colocando em xeque o serviço prestado pelas empresas privadas, os planos de saúde. A classe médica, revoltada com a ação do Estado, conseguiu junto a um juiz banir dali os médicos cubanos, fazendo-os regressar ao seu país de origem.
Quem são esses médicos brasileiros que gritam? A quem representam?
Por quê?
A maioria dos formandos de Medicina no Brasil, fora das grandes capitais, não exerce suas funções em sua cidade de origem. Com raras exceções, a maioria dos médicos não quer atender em cidades pequenas e pobres do interior do país, entre as alegações, falam da falta de estrutura e tecnologia.
Números oficiais do Conselho Federal de Medicina, o CFM, indicam que 70% dos médicos formados no Brasil atendem nas regiões Sul e Sudeste, enquanto que regiões do Norte e Nordeste carecem e sofrem com a falta de médicos. E sabemos que não há um contingente suficiente de médicos que dê conta de atender a população de um país com tamanho espaço geográfico como o do Brasil.
Trazer ao país médicos estrangeiros, com intuito de atender a população dessas cidades, não desqualifica os profissionais brasileiros, como muitos pensam; ao contrário, reforçam o poder de atendimento do estado e da saúde pública. Mas todos esses protestos, por parte da classe médica diante do projeto apresentado pelo Governo, nos fazem refletir, pensar e até, porque não, discutir o tipo de formação que algumas faculdades brasileiras dão hoje aos profissionais de medicina, muito voltada para a alta tecnologia de aparelhagens, para o tratamento da doença e não para a prevenção. E refletir sobre o que isso representa ao país.
Outro dia, ouvi um médico dizer que a “tal” extensão de dois anos do curso de medicina, já fora de discussão, era arbitrária e que, se valesse, deveria valer para todos e não só para os estudantes dessa área.
Há pouco mais um mês assisti a um espetáculo teatral chamado “Estamira”, baseado no ótimo documentário de Marcos Prado. A peça trata de uma mulher que sofre de distúrbios mentais e que vivia em Gramacho, um lixão no Rio de Janeiro. A personagem, Dona Estamira, desfilava um pensamento sem igual, uma visão singular sobre o ser humano e sobre o mundo. Em determinado momento, a personagem, interpretada com extrema beleza por uma potente atriz, dizia assim: “Ontem fui ao médico, e ele me receitou um remédio e nem sequer olhou nos meus olhos. Como alguém que se propõe a cuidar de outro alguém não olha nos olhos dele?! Como?”.
A “tal” extensão proposta pelo Governo deveria ser pensada para formandos de outras áreas, sim, isso só beneficiaria o Estado e, principalmente, a população. Mas estender o curso de medicina por mais dois anos, com atendimento à população carente, faria, em pouco tempo, grande diferença tanto para os necessitados quanto para o próprio médico. Falta, a muitos médicos formados hoje, um olhar outro para a saúde e para o país onde residem. Conhecer de perto os grotões do Brasil e entender a potência dessa profissão pode e deve servir de maneira única, definitiva, na formação de um profissional da saúde e, principalmente, no tratamento de seu igual, de seu espelho, como bem observa Dona Estamira.
Há alguns anos o Governador de Tovantins não conseguia angariar médicos que pudessem atender às pequenas cidades, as mais distantes, as mais pobres. Sem ter o que fazer, resolveu contratar algumas dezenas de médicos vindos de Cuba. Essa atitude, essa ação, melhorou a qualidade da saúde pública local colocando em xeque o serviço prestado pelas empresas privadas, os planos de saúde. A classe médica, revoltada com a ação do Estado, conseguiu junto a um juiz banir dali os médicos cubanos, fazendo-os regressar ao seu país de origem.
Quem são esses médicos brasileiros que gritam? A quem representam?
No Canadá, praticamente não existe plano de saúde e a saúde pública lá é uma das melhores do mundo. “Mas o Canadá é o Canadá e nós somos o Brasil”, alguém dirá.
É isso, nós somos o Brasil! Sim, o Brasil!
Eu sempre fui resistente em ter plano de saúde, não tenho. Amigos me dizem: “Você é maluco, no Brasil?!”. Sim no Brasil. Eu estou sempre em vias de ter um plano de saúde e de fazer um seguro para o carro, também não tenho. Sempre digo a mim mesmo: “Vou fazer”. Mas meu Deus, não é papel do Estado zelar pela saúde e pela segurança da população?! “Ah, mas o estado brasileiro é um mau zelador, um mau gerente”. Esta não me parece e não pode ser uma justificativa plausível, daí os protestos que sacudiram o país nos últimos meses. Essa medida imediata de importação de médicos é fruto das nossas cobranças, dos nossos protestos, das recentes reivindicações não partidárias (importante dizer: não partidárias), de uma população infeliz com serviços prestados em todas as esferas, sejam elas públicas ou privadas.
O Brasil tem hoje, segundo o CFM, uma média de 1,8 médicos para cada mil habitantes.
Segundo a OMS, a nação mais desenvolvida do mundo neste setor, Cuba, tem 1 médico para cada 148 habitantes. Graças à uma medicina preventiva, a ilha tem a taxa de mortalidade infantil mais baixa de toda a América, inferior, acreditem amigos, à do Canadá e a dos Estados Unidos. Da mesma forma, a expectativa de vida é comparável à das nações mais desenvolvidas.
O país que muitos do lado de cá execram, e que tem de fato seus problemas, tem sabidamente uma das melhores saúdes do continente. Recebe estudantes do mundo inteiro, inclusive, do Canadá e de países da Europa e exporta médicos para regiões como a África e a Ásia. Parece que os cubanos compreenderam o papel da medicina, do médico e da prevenção.
É preciso ressaltar: A grande maioria dos nossos profissionais é de médicos muito bons!
Não dá pra discutir a qualidade dos profissionais da ilha de Cuba!
O que tem que se discutir, então, é o que há por trás desses movimentos que protestam contra uma ação que se chama “Mais médicos”.
Para finalizar:
Falta ao Brasil, nessas cidades distantes dos grandes centros, infraestrutura, equipamentos e aparelhagem, deve-se reconhecer isso, e devemos reclamar a melhoria dessa situação. Mas sabemos também que, em países pobres, em regiões que carecem de recursos e que sofrem com a pobreza, o que efetivamente muda a qualidade de vida das pessoas são outras pessoas, são os profissionais.
Importar médicos é uma ação emergencial a ser implantada agora!
O Brasil está diante de uma grande chance. O país pode, com uma atitude relativamente simples, iniciar uma melhoria definitiva na saúde pública. Pode democratizar de vez aquilo que já foi pago por todos nós, que sim, fomos vilipendiados por séculos. Que venham os médicos estrangeiros, os espanhóis, os portugueses, os argentinos e, porque não, os cubanos, tão acostumados à falta de tecnologia e de infraestrutura, e muito por causa disso, profundos conhecedores da medicina preventiva. Que se juntem aos nossos. Que se mude a saúde pública desse país e que ela possa servir aos ricos, aos meio ricos e sobretudo aos pobres que tanto necessitam de cuidados básicos e que cada vez mais carecem do olho no olho.
Fontes: New England Journal of Medicine e Conselho Federal de Medicina – CFM.
(*) Rui Ricardo Diaz é ator de teatro, cinema e TV. Formado pelo Teatro da Universidade Católica da PUC de São Paulo - TUCA e pela Faculdade Bellas Artes, estudou também na International School of Corporeal Mime em Londres - Inglaterra. Entre os seus últimos trabalhos, interpretou o ex-presidente Lula no filme "Lula, o filho do Brasil", de Fabio Barreto. Trabalhou na novela "Lado a lado", da Rede Globo, nos Longas "Aos ventos que virão", de Hermano Penna, e "De menor", de Tata Amaral e Caru Alves de Souza, com estreia para o segundo semestre de 2013. No início de 2014, estreia a minissérie e filme "Rondon, o grande chefe", de Marcelo Santiago, onde interpreta o Marechal Rondon.
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Crise da Representação e Renovação da Democracia no Século XXI. O evento quer
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