Onde o rancor
deveria ceder perante a razão, entra em cena o cálculo. Que cálculo? É que,
além do enfrentamento com Obama e os demais democratas, além da ideologia do
Estado Mínimo, está em jogo a disputa pela liderança e o controle do Partido
Republicano. A ala mais radical deste partido, estimulada pelo Tea Party ou
dele simpatizante, perdeu terreno na última eleição, embora o partido tivesse
mantido o controle da Câmara Baixa. Agora revidam, impondo o comportamento mais
sectário e pondo a prêmio a cabeça de líderes vistos como mais “moderados”. Por
Flávio Aguiar.
Flávio Aguiar –
Carta Maior
Berlim - Mais e
mais, à medida que seus pressupostos teóricos e suas iniciativas práticas vão
desmoronando à vista de todos, os agentes e porta-vozes da direita vão se
tornando rancorosos. Estão perdendo terreno em várias frentes (o que não quer
dizer que a esquerda avance necessariamente), embora detenham centros ou focos
de poder muito importantes.
Na Igreja Católica, diante de declarações ousadas de Francisco I, reacionários da gema articulam passeatas anti-aborto, cobram com veemência declarações mais reacionárias por parte do Papa. Na Europa, os populismos de direita investem o quanto podem. Na Noruega o governo de direita recém-empossado apresta-se a investir contra os romas e sintis (ciganos, mas eles não gostam deste termo). Na Hungria o governo lança lei que proíbe os sem-teto de dormirem na rua.
No Brasil acompanho algo perplexo as perorações pseudo-acadêmicas que se derramam pela velha mídia acusando o “isolamento” a que a atitude soberana da presidenta Dilma em relação a espionagem norte-americana teria levado o Brasil. O clima é de invectiva contra a presidenta; mas não consegue disfarçar o velho viés entreguista revestido agora de algo como um “me espiona que eu gosto”. Citam à guisa de fontes diplomatas europeus, japoneses, ou outros, para condenar os justos reclamos brasileiros por um novo protocolo internético mundial, esquecendo que os serviços secretos daqueles países e regiões se tornaram verdadeiros “puxadinhos” do norte-americano.
E por aí “la nave va”. Nos Estados Unidos não é diferente. Os sectários republicanos, entricheirados na sua maioria da Câmara dos Deputados em Washington, agora se atracam com os democratas e com o presidente Obama para tentar impedir que o Affordable Care Act, também conhecido popularmente como “Obamacare”, entre em vigor – embora ele já tenha entrado.
Qual é o problema? O “Obamacare” estende a 15% do povo norte-americano (48 milhões de pessoas, quase um quarto da população brasileira) a seguridade de saúde de que eles não dispõem. Trata-se de uma expansão de um sistema público de saúde, em detrimento do setor privado. Foi aprovado no Congresso anterior norte-americano, em que os democratas tinham maioria na Câmara. Foi aprovado também na Suprema Corte dos Estados Unidos, que o considerou constitucional, diante de uma ação dos republicanos pedindo a declaração da sua inconstitucuionalidade. Em resumo, isto é de deixar a extrema-direita norte-americana, parlamentar ou não, espumando de raiva.
Em consequência, os republicanos decidiram usar sua maioria na Câmara para chantagear o Executivo, bloqueando a aprovação da previsão orçamentária para o novo ano fiscal, que nos Estados Unidos começa em outubro, a menos que o “Obamacare” fosse posposto por um ano, para novas negociações. Na verdade estes republicanos não qurem negociar nada, querem simplesmente impedir que esta lei entre em vigor, já que ela contraria sua defesa renitente do Estado Mínimo, das privatizações de tudo e também rende e renderá uma enorme popularidade a Obama e aos democratas.
Em consequência deste bloqueio várias agências e setores do governo federal já começaram a fechar suas portas ou a diminuir o ritmo de atendimentos, como no sistema de saúde. Parques nacionais e museus estão fechados, o salários e pensões de funcionários, veteranos de guerra, aposentados serão supensos ou atrasados. A NASA reduziu suas atividades, e assim por diante. Os republicanos estão provocando, enfim, a paralisia do Estado, o que pode, inclusive, mergulhar o país numa nova recessão.
Republicanos mais moderados eram contrários ou pelo menos renitentes em relação a este radicalismo. Pesa-lhes ainda a lição de 1996, quando o presidente da casa. Newt Gringrich, aplicou o mesmo remédio contra o então presidente Bill Clinton. Na eleição seguinte os republicanos perderam a maioria que tinham no Parlamento. O mesmo pode suceder-lhes agora, com a eleição parcial de 2014.
Porém aqui, onde o rancor deveria ceder perante a razão, entra em cena o cálculo. Que cálculo? É que, além do enfrentamento com Obama e os demais democratas, além da ideologia do Estado Mínimo, está em jogo a disputa pela liderança e o controle do Partido Republicano. A ala mais radical deste partido, estimulada pelo Tea Party ou dele simpatizante, perdeu terreno na última eleição, embora o partido tivesse mantido o controle da Câmara Baixa. Agora revidam, impondo o comportamento mais sectário e pondo a prêmio a cabeça de líderes vistos como mais “moderados”, como o presidente desta, John Boehner.
São parlamentares como Ted Cruz, Eric Cantor, Kevin McCarthy, Paul Ryan (que foi vice na chapa de Mitt Romney), Marco Rubio, Rand Paul: são em geral jovens, agressivos, animados pelo cálculo de que perderam a última eleição presidencial porque a “moderação”vigente privou o partido de mais apoios à direita.
Já vinham rosnando alto antes, por exemplo, bloqueando a indicação de um “Embaixador da Ciência” – cargo honorário para o qual, sem vencimentos, a Associação Científica norte-americana indicaria um de seus membros, cuja tarefa seria visitar escolas animando jovens a se tornarem cientistas, em nome do Estado norte-americano. Por que bloquearam a indicação? Porque temem que o cientista nomeado vá alertar os jovens quanto ao aquecimento global, coisa em que eles não acreditam.
Prova, mais uma vez, de que o rancor e o cálculo, assim como a estupidez, não têm limites.
Na Igreja Católica, diante de declarações ousadas de Francisco I, reacionários da gema articulam passeatas anti-aborto, cobram com veemência declarações mais reacionárias por parte do Papa. Na Europa, os populismos de direita investem o quanto podem. Na Noruega o governo de direita recém-empossado apresta-se a investir contra os romas e sintis (ciganos, mas eles não gostam deste termo). Na Hungria o governo lança lei que proíbe os sem-teto de dormirem na rua.
No Brasil acompanho algo perplexo as perorações pseudo-acadêmicas que se derramam pela velha mídia acusando o “isolamento” a que a atitude soberana da presidenta Dilma em relação a espionagem norte-americana teria levado o Brasil. O clima é de invectiva contra a presidenta; mas não consegue disfarçar o velho viés entreguista revestido agora de algo como um “me espiona que eu gosto”. Citam à guisa de fontes diplomatas europeus, japoneses, ou outros, para condenar os justos reclamos brasileiros por um novo protocolo internético mundial, esquecendo que os serviços secretos daqueles países e regiões se tornaram verdadeiros “puxadinhos” do norte-americano.
E por aí “la nave va”. Nos Estados Unidos não é diferente. Os sectários republicanos, entricheirados na sua maioria da Câmara dos Deputados em Washington, agora se atracam com os democratas e com o presidente Obama para tentar impedir que o Affordable Care Act, também conhecido popularmente como “Obamacare”, entre em vigor – embora ele já tenha entrado.
Qual é o problema? O “Obamacare” estende a 15% do povo norte-americano (48 milhões de pessoas, quase um quarto da população brasileira) a seguridade de saúde de que eles não dispõem. Trata-se de uma expansão de um sistema público de saúde, em detrimento do setor privado. Foi aprovado no Congresso anterior norte-americano, em que os democratas tinham maioria na Câmara. Foi aprovado também na Suprema Corte dos Estados Unidos, que o considerou constitucional, diante de uma ação dos republicanos pedindo a declaração da sua inconstitucuionalidade. Em resumo, isto é de deixar a extrema-direita norte-americana, parlamentar ou não, espumando de raiva.
Em consequência, os republicanos decidiram usar sua maioria na Câmara para chantagear o Executivo, bloqueando a aprovação da previsão orçamentária para o novo ano fiscal, que nos Estados Unidos começa em outubro, a menos que o “Obamacare” fosse posposto por um ano, para novas negociações. Na verdade estes republicanos não qurem negociar nada, querem simplesmente impedir que esta lei entre em vigor, já que ela contraria sua defesa renitente do Estado Mínimo, das privatizações de tudo e também rende e renderá uma enorme popularidade a Obama e aos democratas.
Em consequência deste bloqueio várias agências e setores do governo federal já começaram a fechar suas portas ou a diminuir o ritmo de atendimentos, como no sistema de saúde. Parques nacionais e museus estão fechados, o salários e pensões de funcionários, veteranos de guerra, aposentados serão supensos ou atrasados. A NASA reduziu suas atividades, e assim por diante. Os republicanos estão provocando, enfim, a paralisia do Estado, o que pode, inclusive, mergulhar o país numa nova recessão.
Republicanos mais moderados eram contrários ou pelo menos renitentes em relação a este radicalismo. Pesa-lhes ainda a lição de 1996, quando o presidente da casa. Newt Gringrich, aplicou o mesmo remédio contra o então presidente Bill Clinton. Na eleição seguinte os republicanos perderam a maioria que tinham no Parlamento. O mesmo pode suceder-lhes agora, com a eleição parcial de 2014.
Porém aqui, onde o rancor deveria ceder perante a razão, entra em cena o cálculo. Que cálculo? É que, além do enfrentamento com Obama e os demais democratas, além da ideologia do Estado Mínimo, está em jogo a disputa pela liderança e o controle do Partido Republicano. A ala mais radical deste partido, estimulada pelo Tea Party ou dele simpatizante, perdeu terreno na última eleição, embora o partido tivesse mantido o controle da Câmara Baixa. Agora revidam, impondo o comportamento mais sectário e pondo a prêmio a cabeça de líderes vistos como mais “moderados”, como o presidente desta, John Boehner.
São parlamentares como Ted Cruz, Eric Cantor, Kevin McCarthy, Paul Ryan (que foi vice na chapa de Mitt Romney), Marco Rubio, Rand Paul: são em geral jovens, agressivos, animados pelo cálculo de que perderam a última eleição presidencial porque a “moderação”vigente privou o partido de mais apoios à direita.
Já vinham rosnando alto antes, por exemplo, bloqueando a indicação de um “Embaixador da Ciência” – cargo honorário para o qual, sem vencimentos, a Associação Científica norte-americana indicaria um de seus membros, cuja tarefa seria visitar escolas animando jovens a se tornarem cientistas, em nome do Estado norte-americano. Por que bloquearam a indicação? Porque temem que o cientista nomeado vá alertar os jovens quanto ao aquecimento global, coisa em que eles não acreditam.
Prova, mais uma vez, de que o rancor e o cálculo, assim como a estupidez, não têm limites.
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Maior
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México: o mastro vazio :
Dizem que quando vem o furacão e despoja as árvores de suas folhas, os troncos
ficam como um mastro vazio. Talvez seja uma boa metáfora para o México nestes
momentos. As árvores permanecerão nuas, sem insígnia, como testemunho mudo das
façanhas do mau governo. O governo anunciou há uma semana seu pacote econômico
para 2014. Sua previsão de crescimento do PIB é de 3.4%, mas por enquanto, este
ano a economia nacional crescerá muito menos de 1.8% prognosticado pelo
governo. Por Alejandro Nadal.
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40 anos do golpe no Chile: Nunca mais! :
Todo o horror da ditadura se mantem latente e escondido nos vãos da
institucionalidade herdada. Com forças armadas que não fizeram a reconversão
necessária para democratizar suas estruturas e formar seu pessoal no respeito aos
direitos humanos, o “nunca mais” pode terminar a qualquer instante. A direita o
insinuou para deter a demanda de uma Assembleia Constituinte. Editorial de
Punto Final.
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Cristina Kirchner na reta final (I) :
É praticamente impossível que Cristina Kirchner, mesmo mantendo a maioria no
Congresso, nas eleições de 27 de outubro, consiga mudar a Constituição para se
lançar a uma nova reeleição, que a levaria a uma terceira disputa presidencial.
E ainda que consiga, dificilmente haveria clima político e apoio do eleitorado
para vencer. Diante desse panorama, e da ausência de um herdeiro natural para o
kirchnerismo, a pergunta mais persistente entre os eleitores argentinos é quem
será a figura que surgirá com força suficiente para disputar a presidência
daqui a dois anos. Por Eric Nepomuceno.
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