segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Portugal: CONSENSO OU ABRAÇO DE URSO

 

Tomás Vasques – jornal i, opinião
 
Os arautos do "consenso" entre o governo e o PS pretendem arrastar os socialistas para o pântano das suas desastrosas políticas
 
A partir do Verão, o governo ficou sem margem para continuar a esconder por mais tempo que a execução do Memorando da Troika, assinado em 2011, não permitia cumprir o seu primeiro objectivo - o "regresso aos mercados", em meados do ano que vem. A consequência inevitável é um segundo resgate ou um "programa cautelar", o que, na realidade, pouca diferença faz.
 
A partir daí, instalou-se de armas e bagagens, no discurso político dominante, o frenesim do "consenso". Todos os dias, o senhor Presidente da República, os dirigentes do CDS-PP e do PSD, o primeiro-ministro, o vice-primeiro--ministro e os ministros mandam recados através da comunicação social, desfazem-se em bondosas declarações sobre a necessidade de "entendimentos" ou enviam cartas e convites ao partido socialista - o alvo do "consenso", agora tão desejado - para, no "interesse nacional", se juntar aos partidos do governo, ora nas medidas do orçamento do Estado para 2014, ora na proposta de "reforma do Estado".
 
Todo este frenesim à volta do "consenso", vindo de onde vem, é uma hipocrisia política, destinada apenas a enlear os socialistas, antes das próximas eleições legislativas, no rumo desastroso a que o PSD e o CDS-PP têm conduzido o país. Tem, pois, na sua génese, motivações eleitoralistas e oportunismo político. A necessidade de alcançar alguns consensos político-partidários não pode, nem deve, sobretudo nas circunstâncias em que vivemos, ser excluída liminarmente, mas a questão passa por saber à volta de que estratégia, de que rumo para Portugal, se podem alcançar consensos político-partidários que sustentem a recuperação económica, aliviem o desemprego, diminuam as desigualdades sociais e preservem as funções do Estado na Saúde, Educação e Segurança Social.
 
Ao contrário do que muitos nos querem fazer crer, na nossa democracia, o consenso político entre os vários partidos tem sido relativamente frequente. Os exemplos são muitos, quer no plano nacional, quer no plano local, nas maiores cidades do país. O PS já formou governos nacionais com o CDS e o PSD, enquanto no plano local, o PS e o PCP governaram juntos, em coligação, durante doze anos, a cidade de Lisboa; mais recentemente, o PCP e o PSD estabeleceram um acordo para governar Loures, e o PS e o PSD entenderam-se para governar Sintra. Os entendimentos entre partidos políticos concretizam-se sempre que, segundo a experiência deste últimos quarenta anos, há objectivos comuns, resultantes de cedências de todas as partes envolvidas e lealdade nas intenções.
 
Os arautos do "consenso" entre o governo e o PS pretendem arrastar os socialistas para o pântano das suas desastrosas políticas. Vejamos: a aplicação das medidas do inicial "memorando de entendimento" com a troika, deveria ter conduzido, no ano que vem, Portugal a um défice de 2,3%, uma dívida externa abaixo dos 108%, um crescimento de 2,5% (com um crescimento de 1,2% em 2013) e o desemprego nos 11,6%. Passos Coelho não se cansou de afirmar que o programa do PSD e do governo "era muito mais radical" e "ia muito além" do Memorando da Troika. E foi essa deriva neoliberal, amparada pela senhora Merkel, que nos conduziu até aqui. Os resultados estão à vista: défice a rondar os 6%, dívida externa quase nos 130%, desemprego à porta dos 17%, sem contar com os milhares de jovens que, nos últimos dois anos, abandonaram o país.
 
É para a continuidade desta política suicida para os portugueses e para Portugal, a que o Orçamento do Estado para 2014 dá, de novo, expressão, que o PSD e o CDS-PP, cada vez mais isolados, querem envolver, num abraço de urso, o PS. É este tacticismo político oportunista da maioria que alimenta o actual frenesim do "consenso".
 
Os consensos sérios resultam de um debate nacional, em campanha eleitoral, e depois sufragados em eleições.
 
Jurista - Escreve à segunda-feira
 
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