Martinho Júnior,
Luanda
1 – Angola tem
trilhado, de há pouco mais de meio século até aos nossos dias, um caminho de
resgate e libertação, que nunca é demais lembrar e fazer constar:
Do alfobre de
escravatura e colonialismo de há quatro/cinco séculos, os povos africanos, no
caso angolano de armas na mão por que não houve outra alternativa, sacudiram a
opressão e assumiram-se independentes e soberanos, apesar das sucessivas
conjunturas adversas e dos imensos obstáculos!
No caso angolano a
independência ocorreu entre o troar dos canhões, há 38 anos, em plena década de
70 do século XX, mas era apenas uma etapa que se haveria de vencer.
O
fascismo-colonialismo português acabava de ser derrotado em Angola, mas outra
luta teve de se travar logo de seguida: na África do Sul e dominando a região,
estava instalado um regime fascista e opressor, como o do “apartheid”, tão
opressor que colonizava a Namíbia, contra as decisões da ONU, ameaçava os povos
que haviam saído vencedores sobre os restos da colonização e suas sequelas e
impunham um regime de segregação racial, tisnado pelos pseudo-estados a que
denominavam de “bantustões”, que só eles reconheciam!
Na própria operação
da CIA contra Angola, em Quifangondo, estiveram presentes armas desse regime:
um grupo de artilharia que haveria de, às pressas, ser retirado da frente de
combate!
Também esse regime
foi vencido através duma luta de enormes proporções ocorrida principalmente
durante a década de 80 do século XX e independentes o Zimbabwe e a Namíbia,
pela primeira vez se tornou possível na África do Sul instalar a democracia
representativa na base de 1 homem / 1 voto!
2 – As sequelas
para os países libertos que haviam constituído a Linha da Frente, teimosamente
continuaram a fazer-se sentir!
No caso angolano,
por causa dos imensos interesses externos coligados ao “lobby” dos minerais com
influência decisiva até no Partido Democrata dos Estados Unidos, foi imposta a
“guerra dos diamantes de sangue”, que se espalhou em toda a região até aos
Grandes Lagos e continuidade no oeste africano, na Serra Leoa e na Libéria!
Face ao desespero
dos intervenientes da agressão com base na disputa das riquezas do continente,
no rescaldo dum episódio como o holocausto do Ruanda, também nesse caso não
houve outra alternativa senão, de armas na mão, dar resposta aos resíduos do
fascismo, do colonialismo, do “apartheid” e daqueles que impõem tensões,
conflitos e guerras a fim de melhor poderem explorar as riquezas do continente,
ao longo da década de 90 e princípios do século XXI!
3 – Em 2002
finalmente em Angola houve a oportunidade para, ao se vencerem e verem
removidos os obstáculos do fascismo, do colonialismo, do “apartheid” e de
algumas das suas sequelas, instaurar um clima de ausência de tiros, que possibilitava
a reconciliação e a reconstrução nacional, instaurando um modelo ainda que
precário de democracia representativa, de economia de mercado e de paz
possível!
Desde que as
guerras foram ultrapassadas que as imensas tarefas da reconciliação e da reconstrução
nacional se começaram a desenvolver em Angola!
Nos primeiros
tempos em relação às questões humanas houve algum apoio internacional, mas
depois passou-se a contar apenas com as próprias forças e só com as próprias
forças, sob orientação do Presidente José Eduardo dos Santos!
Tudo isso foi feito
sem que do exterior houvesse qualquer tipo de sensibilidade e reparação: a
própria África do Sul que com seus aliados e alianças havia devastado, com o
regime do “apartheid,” toda a região, mas muito particularmente Angola, nunca
mexeu um dedo no sentido de ressarcir os custos das perdas enormes acumuladas
ano após ano e isso muito embora os sucessivos governos do ANC, da democracia
de 1 homem / 1 voto e da emergência reconhecida do país que é hoje um dos BRICS!
4 – Nem estadistas,
nem banqueiros, nem a comunidade internacional, nem os “activistas de plantão”
e da conveniência dos grandes interesses, alguma vez se decidiram a reconhecer
essa dívida que deveria ser ressarcida para com os países que compuseram a Linha
da Frente e sobretudo para com Angola que suportou o choque principal durante
décadas!
Essa dívida seria
uma reparação no âmbito dos direitos humanos a uma questão que é fundamental:
todos os seres humanos devem estar livres da opressão e ela na África Austral
só se tornou possível com a uma longa luta pejada de sangue e de sacrifícios
que afinal, só muito poucos ousaram reconhecer para reparar!
5 – A seu tempo
essa luta foi reconhecida pelos países socialistas e por Cuba, cuja Revolução,
pela decisão justa de Fidel de Castro, admitia que a América Latina deveria dar
o seu contributo, se necessário de sangue, para que se apagassem da face da
Terra fascismo, colonialismo e “apartheid”!
Cuba pagava assim
uma dívida para com África, de forma desassombrada, legítima e levando em
consideração a história e a antropologia cultural dos povos do sul,
identificando-se por inteiro com o sentido de vida do movimento de libertação!
Foto: Monumento
alusivo à batalha de Quifangondo com esculturas de Rui de Matos, um dos
guerrilheiros do MPLA!
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