terça-feira, 21 de janeiro de 2014

VIOLÊNCIA EM KIEV ENTRA NO TERCEIRO DIA: RÚSSIA ACUSA EUROPEUS

 

António Carneiro, RTP
 
Os confrontos na capital da Ucrânia entraram no terceiro dia, depois de mais uma noite de graves incidentes entre grupos de jovens e a polícia. O Presidente ucraniano afirmou que a violência está a ameaçar a estabilidade nacional e a Rússia avisa que a situação no país vizinho está “a fugir ao controlo”, acusando também os líderes ocidentais de terem responsabilidades no agravamento dos distúrbios. A onda de protestos antigovernamentais que tinha começado no ano passado reacendeu-se domingo, depois de Viktor Ianukovich ter promulgado novas leis contra manifestações, que entram em vigor às 0h00 desta quarta-feira.
 
Os confrontos resumem-se a uma pequena área no centro de Kiev, nas proximidades da praça Maidan, onde estão acampados os opositores do Governo, sendo que a vida decorre com normalidade no resto da cidade.

Apesar de temperaturas que rondam os dez graus negativos, centenas de jovens armados e encapuzados ergueram barricadas com os restos dos veículos incendiados no primeiro dia. Uma catapulta de madeira foi erguida e instalada junto do parlamento onde permanecem várias linhas de polícia de choque equipadas para o que der e vier.

Violência atinge jornalistas

Durante a última madrugada os confrontos foram-se sucedendo, com os manifestantes a atirarem cocktails molotov e pedras e a polícia a responder com gás lacrimogéneo, granadas de atordoar e balas de borracha.

Segundo um repórter da France Presse, vários jornalistas ficaram gravemente feridos nos olhos por disparos que parecem ser apontados propositadamente à cabeça. Alguns deles queixam-se de terem sido espancados pela polícia quando cobriam o desenrolar dos motins.

As forças de segurança foram vistas a espancar violentamente alguns dos jovens por eles capturados. De acordo com o Ministério do Interior, foram detidas 32 pessoas.

Desde domingo o número de feridos, incluindo policia e manifestantes, já ascende a 200. Fontes hospitalares disseram que uma pessoa teve de ter uma mão amputada e várias outras ficaram privadas de visão.

Grupo minoritário radicaliza protestos

Os atos mais violentos parecem ser obra de um grupo mais radical ligado à direita nacionalista.

Figuras chave da oposição como o ex-pugilista Vitaly Klitshko e Arsely Yatsenyuk, que fala pela aprisionada Iulia Timoshenko, fizeram diversos apelos públicos ao fim da violência, mas as suas palavras não produziram qualquer efeito.

Klitshko acusou mesmo o Governo de contratar meliantes para cometerem os atos de violência e assim deslegitimarem os protestos, criando o pretexto para a imposição de um estado de emergência no país.

Um conjunto de leis que reprimem o direito à manifestação foi aprovado à pressa na semana passada e entra em vigor esta noite, depois de ter sido publicado no boletim do Parlamento.

As novas leis preveem penas de até cinco anos de prisão para manifestantes como os que instalaram tendas e barricadas no centro de Kiev ou ocuparam edifícios oficiais.

Ianukovich vê ameaça à segurança nacional

Numa declaração segunda-feira à noite, o Presidente Ianukovich deixou entender que se prepara para fazer uso imediato destes poderes reforçados a pretexto de defender a segurança nacional.

“Agora que as ações pacíficas se transformaram em distúrbios de massas, acompanhados por motins e atos de fogo posto, o uso de violência, estou convencido que tais atos são uma ameaça não só para Kiev mas como para toda a Ucrânia”, disse.

Anteriormente, o Chefe de Estado ucraniano tinha dito estar disposto a trabalhar com a oposição, através da criação de um comité para tentar resolver a crise política.

Mas nem o Presidente nem três líderes da oposição estiveram presentes na primeira reunião da comité que decorreu segunda-feira, tendo em vez disso enviado delegados para os representar, pelo que ninguém acredita muito no resultado deste processo negocial.

Rússia acusa líderes europeus

Entretanto a Rússia acusou alguns políticos europeus de estarem a encorajar a violência.

“Temos informações de que muito disto está a ser encorajado a partir do exterior”, disse o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, avisando que a situação “está a escapar ao controlo”.

“Membros de vários governos europeus apressaram-se a ir a Maidan, sem qualquer convite, e tomaram parte em manifestações antigovernamentais, num país com o qual têm laços diplomáticos (…) isto é simplesmente indecente”, disse Lavrov.

“Imaginem isto acontecia num qualquer país da União Europeia. Seria possível? Nunca teria sido permitido!”, acrescentou o responsável pela diplomacia de Moscovo.

Violência não serve objetivos da oposição

A vaga de protestos que começou em novembro do ano passado - depois de Ianukovich ter decidido subitamente suspender a assinatura de um acordo com a União Europeia e favorecer em vez disso uma aproximação à Rússia - depressa deixou de ser uma simples manifestação pró-europeia para se tornar numa contestação generalizada do Governo que muitos veem como corrupto e enfeudado aos interesses de Moscovo.

No entanto, a falta de um líder único (Iulia Timoshenko está na prisão) e as divisões entre a oposição, que representa muitos interesses diferentes, têm-se aliado ao cansaço para sabotar os esforços dos que defendem a mudança.

Agora os atos de violência levados a cabo pelas fações mais radicais dos protestos arriscam-se a alienar o apoio da maioria da população e a reforçar ainda mais a posição do Presidente Ianukovich e dos seus aliados.
 
 

Sem comentários:

Mais lidas da semana