Pedro
Tadeu – Diário de Notícias, opinião
Já
vi diversas vezes escrito que a detenção de Ricardo Salgado representa o
momento-chave de uma revolução no sistema financeiro português, o fim da era
dos banqueiros clientelares que dominavam o Estado. É a visão redentora de um
mundo simples.
Há
um elo comum que liga os problemas da gestão da família Espírito Santo ao que
se passou no BPN, no BPP, no Banif e no BCP. Este elo liga todos os países
europeus, os gigantes asiáticos, os Estados Unidos, o Brasil ou Angola, todos
os locais por onde circula mais quantidade de dinheiro do que é possível
imaginar.
É
um elo que liga Oliveira Costa à fraude da pirâmide de empréstimos montada por
Bernard Madoff, preso em 2008. É um elo que liga João Rendeiro ou Jardim
Gonçalves a uma notícia com apenas uma semana sobre uma monumental fuga ao
fisco norte-americano que os supostamente respeitáveis Barclays e Deutsche Bank
(a instituição alemã que vai, ao que dizem, auditar o BES) ajudaram a montar
para que uns fundos de investimento especulativo limpassem uns quantos milhares
de milhões de dólares.
São
demasiados casos, são demasiado frequentes, são demasiado universalizados,
envolvem demasiada gente de reputação impecável e duram há demasiado tempo. Não
são fortuitos. Não são desvios.
O
termo "alavancar" é usado, como se sabe, para descrever a utilização
de recursos financeiros de terceiros em operações na bolsa para aumentar o seu
volume financeiro. É possível, desta forma, garantir maiores ganhos. É uma
prática corrente, banal, aceite, regulamentada. É uma filosofia e é uma moral.
Arquimedes,
quando inventou a alavanca, queria ter força suficiente para poder levantar a
Lua. A banca quer ter dinheiro suficiente para poder comprar a Lua. Por isso
procura, sempre, formas para multiplicar até ao infinito a força da riqueza que
está sob sua gestão.
Esta
ambição louca é legitimada e aplaudida por todos os poderes políticos, pelos
líderes dos bancos centrais, até pelas polícias fiscais, todos eles
beneficiários clientelares deste statu quo global. O Estado está tomado, em
todo o mundo.
A
banca, toda a banca e todo o planeta financeiro que atribuíram a si próprios a
missão de "alavancar" a riqueza que circula dentro do seu sistema
estão compelidos a atuar desta maneira, a pisar o risco, a ultrapassar a fronteira
da legalidade. Se não o fizerem, perdem para a concorrência. Todos os seus
protagonistas, atuais e futuros, estão convencidos da inevitabilidade e da
bondade do processo. Por isso, atuarão em conformidade.
Condenar
Ricardo Salgado nunca será uma revolução, mesmo se vier a ser um ato de inteira
justiça.
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