quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Portugal: AI IMPLODE, IMPLODE!



Tomás Vasques – jornal i, opinião

O país esboroa-se. Não há nenhuma "cultura de compromisso" que nos salve deste plano inclinado por onde deslizamos

O país esboroa-se. Não é só o manto de empobrecimento que a quase todos cobriu. É, também, a degradação acelerada da vida democrática, das responsabilidades políticas, das instituições, dos mecanismos de escrutínio e de fiscalização. O mote é dado por um governo à deriva. Todos os dias correm notícias deste dramático esfarelamento ético, político, económico. O que há anos era considerado um escândalo nacional que fazia cair ministros, é hoje a rotina governativa, tal o ponto a que se degradou a nossa vida democrática. As responsabilidades políticas diluem-se até desaparecerem. Os responsáveis escondem-se uns atrás dos outros, num baile indecoroso. Não há no discurso político do poder o menor assomo de frontalidade. Nem de clareza. Muito menos de franqueza. Tudo se resume a um intrincado e obscuro jogo de meias-verdades e meias-mentiras, onde até os tempos dos verbos são usados para enganar e para sacudir a água do capote.

A ministra da Justiça que, desde 1 de Setembro, lançou o caos nos Tribunais, ao estoirar com o sistema informático, quase a meio de Outubro, com ar de triunfo, anuncia que "já temos 14 comarcas a funcionar e amanhã teremos mais duas". De seguida, reduziu o descalabro à "muita desinformação" por se estar "em ano de eleições", sem demonstrar a menor consciência da sua irresponsabilidade. Por sua vez, o ministro da Educação, completamente desorientado, depois de várias tentativas frustradas, acha normal que, um mês depois de ter começado o ano lectivo, um professor seja colocado em 75 escolas (e muitos outros em 3, 5 ou 10 escolas). E que, em consequência, se fique a aguardar uma ou mais novas levas de colocações de professores.

Nuno Crato e Paula Teixeira da Cruz, que levaram até ao limite o exercício da incompetência técnica e da desfaçatez política, escondem-se atrás do primeiro-ministro que, orgulhoso, confere aval às suas desastradas actuações; o primeiro-ministro e a ministra das Finanças escondem-se atrás do governador do Banco de Portugal, a quem atribuem as decisões, e as respectivas consequências, sobre o desaparecimento do BES. Tudo se passa por detrás de uma espessa cortina de nevoeiro. Vai-se sabendo, como resultado de alguma investigação jornalística, que o Banco de Portugal soube da dimensão da exposição do BES ao Grupo Espírito Santo muitos meses antes de actuar, permitindo que o descalabro se ampliasse. Como se soube que foi permitida, durante dois dias, a venda de acções do BES quando já tinha sido tomada a decisão de mandar o banco para o lixo, facilitando a vida a quem tivesse acesso privilegiado a essa informação. O exercício do poder transformou-se na arte de enganar os cidadãos.

O resultado está à vista e até o senhor Presidente da República, que tem levado este governo aos ombros, se alarma, alertando para a possibilidade de "implosão do sistema partidário português". Não é para menos. O que chegou a ser o maior Banco privado português desapareceu num fim-de-semana de Agosto, tragado por uma "engenharia" inédita, à custa de dinheiro que os contribuintes vão amargar. Atrás seguiu a PT, a empresa portuguesa de excelência. Chegou a valer doze mil milhões de euros, vale agora milhão e meio e está à venda a retalho, com todas as consequências para o futuro dos milhares de trabalhadores e para a nossa economia.

O mito da boa gestão privada caiu com o BES, o GES e a PT. Os exemplos dados pelo governo, nomeadamente pelos ministros da Justiça e da Educação, incentivam à irresponsabilidade na gestão das empresas públicas. O país esboroa-se. Não há nenhuma "cultura de compromisso" que nos salve deste plano inclinado por onde deslizamos. O país precisa, urgentemente, de um governo com uma cultura democrática e com uma política que olhe para cada português como um cidadão e não como um mero número de contribuinte. Esta é a fasquia mínima para regressarmos à normalidade democrática e a uma existência decente. Senão, o sistema implode. Ai implode, implode!

Jurista. Escreve à segunda-feira

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