Rui Peralta, Luanda
I - A
economia-mundo necessita, para a sua concretização, de instituições
homogeneizadas e hegemónicas, globais, como o Banco Mundial e o FMI, ou de
estruturas regionais e inter-regionais como o Banco Federal dos USA ou o Banco
Central Europeu. Mas a economia-mundo já transformou a realidade,
uniformizando-a e a economia é agora a realidade única, pelo que torna-se
necessário, para além da globalização das instituições económicas e
financeiras, a internacionalização das instituições jurídicas e politicas,
transformadas na actual realidade em instituições subsidiárias das
primeiras.
Este processo é
visível, por exemplo, no litígio que opôs a Chevron e o Estado do Equador.
Acusada pelo Estado equatoriano de contaminar a área amazónica do país, a
Chevron foi condenada ao pagamento de 9 ml milhões de USD ao Equador. Mas a
Chevron recusa a condenação e afirma que os tribunais equatorianos ignoraram
provas que demostravam que a multinacional não era responsável pelo acidente. E
eis que agora os tribunais norte-americanos julgam a justiça equatoriana, por
esta ter ousado defrontar a Chevron.
Obviamente que a
Chevron tem direito a recorrer da sentença, tem direito a suspeitar da justiça
equatoriana, mas não será com certeza nos tribunais dos USA, onde a Chevron
pelos vistos exerce uma grande influência que o recurso deva ser apreciado.
Esta questão, teoricamente poderia ser resolvida por um tribunal
interamericano, mas, atendendo á realidade, este tribunal não seria uma instituição
judicial onde se verificasse uma igualdade plena entre Estados,
transformando-se em mais uma das inúmeras instâncias dos USA, país onde por sua
vez o Poder Judicial encontra-se cercado e infiltrado pelos grandes interesses
económicos, como qualquer outra instituição norte-americana, uma vez que nos
USA a corrupção foi institucionalizada pelo Poder Legislativo, quando este
permitiu que os corruptores (os chamados lobby´s) caminhassem nos seus
corredores, influenciando e comprando votos.
Desta forma a Chevron
e as todas as corporações transnacionais fazem o que muito bem entendem,
impunemente e transformam-se no único Poder Real da economia-mundo.
II - Os factores
hegemónicos podem ser melhor exemplificados se observarmos com atenção a
denominada U.S.A. Intelligence Community. Existem nos USA dezassete agências e
serviços de inteligência e contrainteligência. A este número devem ser
adicionadas as estruturas que formam o NSS, National Security State, onde
constam o Department of Homeland Security, o Departamento de Energia
(responsável pelo arsenal nuclear dos USA) e o Pentágono.
Edward Snowden
possui (segundo a NSA) mil e setecentos milhões de ficheiros, mas se pensarmos
na informação gerada pelas 17 agencias mais o edifício do NSS e se
considerarmos que Snowden apenas desviou uma pequena parte da totalidade dos
ficheiros de uma das agências, a NSA, poderemos imaginar a quantidade de
informação vedada aos cidadãos (que sustentam obrigatoriamente todo este
processo, na figura de contribuintes, sem que ninguém lhes preste contas).
Sabe-se que em 2011 todo o sistema governamental de segurança produziu 92
milhões, 64 mil 862 documentos classificados, ou seja, documentos de absoluta
confidencialidade, completamente vedados aos cidadãos.
Desta forma o
segredo de Estado é transformado em Estado do Segredo, o cidadão é afastado do
poder de decisão e torna-se num mero eleitor, idiotizado, que de tempos a
tempos vai votar em produtores de segredos, que governam nas suas costas e
manipulam a sua vontade, rompendo o equilíbrio entre a necessidade do Estado
manter segredo, durante um período de tempo constitucionalmente definido e a
necessidade e direito do cidadão em saber o que o seu governo anda a fazer e em
que situação se encontra o mundo onde vive, ele, cidadão, que é cada vez mais
chamado a “globalizar-se” pelas máquinas de propaganda.
Com a decomposição
do equilíbrio entre transparência e segredo, o Estado passa a deter o monopólio
e o privilégio da informação e o cidadão deixa de ter decisão na definição dos
limites do que pode ser, como deve ser e quando é, segredo. Ao envolver a
segurança nacional e de Estado num manto de secretismo, escondendo as
actividades e as informações dos olhos e dos ouvidos dos cidadãos (e dos
aliados e inimigos, embora nestes dois casos com muito menos sucesso, o que
prova o quão inadequado é sistema utilizado), os pilares em que assentam a
divisão de poderes, a soberania popular, as liberdades individuais, os direitos
e as garantias, tornam-se conceitos formais, deixando, pura e simplesmente, de
serem pilares do contrato social assumido entre Estado e cidadãos.
Nos USA (mas não
são a excepção, pelo contrário, são o padrão) não existem formas, até ao
presente, de limitar a necessidade governamental de secretismo e de certeza que
os tribunais secretos (consequência desta lógica esotérica do Estado) ou os
comités do Senado não constituem qualquer obstáculo, sério, á paranoia
secretista. Em certo sentido a revelação de Snowden permitiu aos cidadãos
globais demonstrar algumas pontas do imenso icebergue, embora seja uma imagem
diluída. Isto não acontecia desde a década de 70 do século passado, com o caso
Watergate, em que o sistema de poder em Washington foi parcialmente decomposto
e posto a nu. Entre Watergate e as revelações de Snowden o Estado de Vigilância
Global foi sendo construindo (com algumas, poucas, brechas).
Mas não se iludam
os que consideram que o facto de sabermos qualquer coisa representa uma
retracção do sistema. Desenganem-se, pois afinal apenas se conseguiu tomar
conhecimento de uma milionésima parte da realidade esotérica com que as elites
globais exercem o seu domínio sobre os cidadãos, os povos e os indivíduos. Os
mil e setecentos milhões de ficheiros da NSA revelados por Snowden são apenas
uma molécula duma gota de água num imenso oceano.
O que sabe o
cidadão norte-americano sobre a Agência de Defesa e Inteligência do Pentágono,
cujos 16 mil e 500 funcionários embarcaram num ambicioso plano assente em
associações de redes de espionagem que rivalizam, em tamanho e volume de
informação, com a CIA? O que sabe o contribuinte norte-americano das
actividades da National
Geospatial-Intelligence Agency, com os seus 16 mil funcionários, cujos
quartéis-generais, construídos após o 11 de Setembro, consumiram mil e 800
milhões de USD ao erário público e que controla um sistema de satélites
espiões, eternamente encapotados de “exploradores planetários”? O que conhece o
eleitor norte-americano dos processos de investigação ao terrorismo controlados
pelo FBI? E o que acontecerá se os contribuintes exercerem o seu direito e
pedirem contas á CIA que gastou mais 4 mil milhões de USD que a NSA, para
organizar os seus corpos privados de espionagem, como parte da abordagem de expansão
geral da Inteligência norte-americana?
III - Nos USA a
mania pelo secretismo cresceu exponencialmente durante a administração Obama.
Se recordarmos as promessas de Obama, durante a campanha eleitoral, quando o
seu discurso era profícuo em frases como “sunshine administration dedicated to
“openness” and “transparency”, será com muita dificuldade que evitaremos um
sorriso de ironia. Mesmo para senadores, experientes nas manobras politicas e
homens habituados aos jogos de bastidores, as novas regras e procedimentos
“esotéricos” impostos pela Casa Branca são surpreendentes. Carl Levin,
presidente do Comité do Senado para os serviços de inteligência, um senador
habituado ao secretismo e ao segredo de estado, já por diversas ocasiões
revelou publicamente o desconforto do seu comité perante as novas regras que
dispensam a CIA de prestar contas sobre operações em curso, ao Senado e ao
Congresso.
É bom não esquecer
que o caso Watergate foi completamente desvendado na imprensa, no Congresso e
no Senado, e que as comissões e comités do Poder Legislativo foram decisivas e
determinantes em todo o processo. Todos os procedimentos pós Watergate
revelaram uma teia de conspirações e de atentados á cidadania efectuados pela
NSA, CIA e FBI e todos estes atentados foram revelados e travados pela
actividade fiscalizadora do Congresso e do Senado. Lógico que esta
“transparência” anteriormente possibilitada era comedida. Um exemplo desse
comedimento foi a criação, nessa época, do Foreign Intelligence Surveillance Court, um tribunal
secreto cujo funcionamento e corpo jurídico escapavam aos cidadãos
norte-americanos e às instituições públicas e jurídicas internacionais.
Actualmente a
“extra-legalidade” da Guerra Global ao Terror, com o seu arsenal secreto, o seu
sistema prisional “extrajudicial” que permite a utilização de “prisões
secretas” onde a tortura é uma norma quotidiana e os prisioneiros podem ser
raptados, ou os “terroristas” podem ser assassinados, conduz á impunidade
total. As agências sabem que nada pode acontecer se prevaricarem, porque deixou
de existir prevaricação. Tudo é permitido na “guerra secreta” e nas novas
doutrinas da “guerra antiterrorista”. É uma América “pós-legal”, formada
durante décadas nas suas neuroses e paranoias, devidamente arquitectada no 11
de Setembro, estruturada no dia seguinte aos ataques às torres gémeas e
meticulosamente restruturada e inovada pela administração Obama.
É provável, neste
panorama, que, mais dia, menos dia, surja um projecto de remodelação para a
Estátua da Liberdade, passando esta a designar-se: Estátua da Segurança.
IV - Este modelo de
Estado Policial, que globalizou a tirania aeroportuária, que aposta na livre
circulação de capitais e reprime a livre circulação de trabalho, que pretende a
livre circulação de mercadorias, mas que oprime a livre circulação de pessoas é
o regime vigente, também, na U.E. É assim que os cidadãos europeus são
confrontados com uma nova realidade politica partidária que tem como padrões a
austeridade e a privatização.
Terminaram os
tempos gloriosos em que a Europa poderia escolher, debater e decidir sobre
alternativas diversas, que passavam pela social-democracia, a democracia-cristã,
o liberalismo e estendiam-se às várias tonificações de conservadorismo e ao
comunismo ou projectos socialistas diversificados. Longe vão os tempos em que,
apesar de toda a lama, os europeus podiam debater sobre matérias diversas,
defenderem apaixonadamente as suas posições, terem um discurso critico, ao
invés do linguajar dos actuais clones tecno-burocratas, que vestem
uniformemente.
Longe parecem ir os
tempos em que a Europa tinha visões que iam muito para além dos monossílabos da
Goldman Sachs e em que a vida politica não era uma “questão de imagem e de
marca” e que ao invés dos fedelhos impertinentes que deixaram a inteligência
nos testículos do pai, que aparecem por aí a alvorarem-se em governantes, havia
tipos que por muito detestáveis que fossem, sabiam algo mais do que o BA Bá do
discurso neoliberal (por muito detestáveis que fossem De Gaulle, Bruno Kreisky,
Olaf Palm, Willy Brandt e outros, eram gente culta e que defendiam, para além
de interesses, ideias e projectos e que sabiam transformar esses interesses em
percursos viáveis, de forma a que a coisa não terminasse apenas nos bolsos e
nas carteiras).
Os tempos em que se
distinguia um social-democrata de um liberal e este de um conservador acabaram.
Hoje resta uma miscelânea, um produto transgénico, hibrido, em que os conceitos
são inexistentes e onde os princípios e os valores são lixo ideológico. Há
quatro décadas a esquerda europeia, social democrática, pretendia realizar
alterações no equilíbrio de poder, que reduziam o fosso entre ricos e pobres,
que ampliavam a propriedade pública e introduzia mecanismos eficazes nos
sistemas nacionais de saúde, nas redes públicas de educação e nos sistemas de
Segurança Social. Era a Europa, na época, sinal de esperança. Hoje não passa de
uma pocilga fedorenta onde as elites evacuam os seus excrementos.
A política europeia
americanizou-se, no pior sentido da palavra. Hoje termos como nacionalização ou
renacionalização foram banidos do léxico político europeu e o sistema
partidário europeu evoluiu para um sistema de partido único, ao estilo dos USA,
dividido entre duas facções de interesses diferentes, mas complementares, que
não podem sobreviver uma sem a outra. A “promoção da democracia” que anda nas
bocas das elites europeias e sempre presente nos seus eloquentes sermões é um
grande e rentável negócio construido por cima das ruinas da soberania popular.
Acabou a Europa
Social, a Europa dos direitos e das liberdades. Está aí, senhoras e senhores a
Europa do Embuste, a Europa dos filisteus, dos merceeiros da poupança e dos
contabilistas dos cortes orçamentais, a Europa dos economistas domésticos que
aplicam o método da dona de casa, a politica do corta aqui, corta ali, mais
daqui, menos de acolá.
Senhoras e
Senhores, meninos e meninas venham votar na Europa da Segurança, negócio sempre
rentável, assente na vigilância electrónica, nos chips de identificação e no
“bastão inteligente” dos mercenários da nova ordem. Façam da Europa um grande
circo, transformando os vossos países em terrenos para montar a tenda e onde os
que não são empresários do circo são palhaços.
A americanização
deixará a Europa a um passo da mexicanização, que será seguida da congolização,
depois de 2050, quando a troika tiver estatuto de superestrutura e designar-se
por Santíssima Trindade.
V - E já que o
México é referido (pelo pior motivo: a mexicanização) convém assinalar que uma
importante componente da elite mexicana, com muitos amigos na U.E e nos USA,
realizou uma grande festa. Foram os 85 anos do Partido Revolucionário Institucional
(PRI).
Fundado em 1929, o
Partido Nacional Revolucionário (PNR) - num período socialmente conturbado do
país, em que a repressão e o clima de violência preponderavam em todo o
território enquanto manifestava-se o início da Grande Depressão e no plano
externo o fascismo ascendia em Itália e por toda a Europa reinava um clima de
grande instabilidade politica, económica e social - foi sempre um partido de
Estado. O funcionamento do PNR foi regulado por um decreto presidencial que
obrigava todos os funcionários públicos a contribuírem com 7 dias de salário,
por ano, para o partido. Dez anos depois da sua fundação uma Convenção Nacional
Ordinária propôs que todos os estabelecimentos de ensino ficassem sob controlo
directo do Ministério da Educação, avançou com a institucionalização das Ligas
Camponesas, a criação da Camara Nacional do Trabalho, discutiu o papel dos
sindicatos e das organizações dos trabalhadores e a sua institucionalização,
concluiu pela nacionalização do sector petrolífero e a realização de diversas
reformas estruturais, entre elas a reforma agrária, o objectivo fundamental da
Revolução de 1910/1917, mas que nunca foi implementada, sendo concretizada
durante o governo Cárdenas que suprimiu os grandes latifúndios e efectuou a
entrega aos camponeses de mais de 18 milhões de hectares de terras, o que
provocou o desaparecimento da oligarquia latifundiária.
Por sua vez o
Sindicato dos Trabalhadores dos Petróleos reivindicava a contratação geral
única e elaborou um projecto de Contrato Colectivo de Trabalho, que esteve na
origem da grande greve geral do sector petrolífero em 1937. Este grande
movimento grevista foi também decisivo na criação da Confederação dos
Trabalhadores Mexicanos (CTM), que conjuntamente com a Confederação Operaria
Mexicana e a Confederação Geral dos Trabalhadores estiveram na base da
transformação do PNR em PRM (Partido Revolucionário Mexicano), ainda durante a
presidência de Cárdenas.
Antes de terminar o
mandato de Cárdenas, o PRM inicia uma viragem á direita, evidenciada em finais
de 1940 com a repressão sobre os sindicatos independentes e no assalto às sedes
do Partido Comunista do México, ao mesmo tempo que executa um “movimento de
rectificação” e implementa a política de “unidade nacional” introduzindo
reformas na legislação agrária e uma nova Lei Federal do Trabalho. Em 1946 o
PRM foi transformado em PRI (Partido Revolucionário Institucional) e a
repressão sobre os sectores sindicais aumentou enquanto o aparelho sindical
ligado ao PRI fazia uma ofensiva no sentido de controlar os sindicatos e as
confederações.
O controlo imposto
pelo PRI e a repressão aos sindicatos e confederações que não estavam debaixo
do controlo do Partido e que manifestavam atitudes contrárias á da burocracia
do PRI não evitou o grande movimento grevista geral de 1958, liderado pelos
trabalhadores ferroviários e que se estendeu a todos os sectores da produção
nacional e às escolas e universidades. A influência do PRI no movimento
sindical sofreu um duro golpe e as suas lideranças foram varridas de todos os
sindicatos e confederações.
A década de 60
assistiu a grandes mobilizações sindicais no México e foi uma década em que a
repressão se fez sentir de forma persistente sobre o movimento sindical. Em
1968 reina um ambiente de insurreição na Cidade do México. Este movimento
assenta nas transformações económicas e politicas realizadas entre os finais da
década de 30 e a década de 60. Em 30 anos o México passou de uma sociedade
predominantemente rural para uma sociedade urbana. A esperança média de vida dos
mexicanos aumentou em cerca de 20 anos, o analfabetismo foi consideravelmente
diminuído, a taxa de mortalidade diminuiu substancialmente, a oportunidade de
aceder á educação sofreu um rápido crescimento (a Universidade Nacional
Autónoma do México passou de 15 mil estudantes em 1938 para 100 mil em 1968), o
país montou um importante sector industrial, que implicou um crescimento
quantitativo do operariado e das classes médias. A sociedade mexicana sofreu
uma transformação da estrutura económica e com ela, da estrutura de classes e
de grupos sociais. Esta estrutura entrou em ruptura com a estrutura politica,
que se mantivera quase inalterável durante o mesmo período de tempo.
O movimento
estudantil e popular de 1968 sacudiu a sociedade mexicana. Exigia a libertação
dos presos políticos, a destituição dos generais responsáveis pela repressão
politica e sindical, a extinção do Corpo de Granadeiros (responsáveis pela
violência contra os trabalhadores), fim do delito de dissolução social e
profundas alterações no quadro institucional, conducentes á democratização da
vida politica mexicana. As novas gerações de estudantes e trabalhadores
romperam com o regime do PRI e nem mesmo as tentativas de reformas nos anos
setenta (a “apertura democrática” do presidente Encheverria, que governou entre
1970 e 1976 e a “reforma politica” de Portillo, no mandato de 1976-1982, que
terminou mergulhado no nepotismo e na corrupção) atenuaram o descontentamento
manifestado em 1968.
O discurso
neoliberal foi imposto com Madrid Hurtado, presidente entre 1982 e 1988, que
iniciou um ciclo de administrações neoliberais e cada vez mais submissas aos
interesses norte-americanos. A crise económica instalada na década de 80 levou
ao consulado do FMI e do Banco Mundial e o país foi conduzida por uma equipa
tecnocrática. As portas foram abertas ao capital, mas os trabalhadores foram
privados dos seus direitos fundamentais, atingindo o desemprego, em 1987, 19%
da população da activa (cerca de 5 milhões de mexicanos entre os 20 e 50 anos). O PRI
dividiu-se e surgiram tendências internas. O último presidente do PRI, no
seculo XX, foi Ponce de Leon (1994-2000), que viu a crise económica atingir
proporções dantescas.
VI - A actuação
desastrosa do PRI, no seu ultimo período da longa governação, deu lugar aos
governas ultraliberais do Partido da Acção Nacional (PAN), sendo hoje o México
um imenso palco de violência, onde as vitimas da “guerra dos gangs da droga”
deixou de ser noticia, porque ocorrem às dezenas, diariamente. Em 2012 os
órgãos de comunicação social inundaram a opinião pública mexicana com a
propaganda eleitoral e desde aí um véu de silêncio foi colocado sobre a
violência. Em 2013 surgiram as “autodefesas” em vários estados mexicanos e o
véu foi temporariamente retirado, para o cenário levar umas pinceladas rápidas
e fugazes. Nada de aprofundar as causas da violência e o breve debate
limitou-se á questão da legalidade e legitimidade destes grupos de autodefesa.
Depois o véu tornou a ser colocado.
No período
compreendido entre Dezembro de 2012 a Janeiro de 2014, o Sistema Nacional de
Segurança Pública registou 21 mil mortes provocadas pelos bandos de
traficantes. Os raptos estão na ordem do dia, assim como as agressões e os
homicídios brutais de que são vitima as mulheres mexicanas. Os migrantes que
transitam pelo país são sequestrados e assassinados e no México o seu sonho de
chegar aos USA transforma-se num pesadelo. As agressões contra repórteres,
jornalistas, defensores dos direitos humanos e activistas sociais que denunciam
a cumplicidade entre o crime organizado e os órgãos institucionais continuam e
tornam-se cada vez mais corriqueiras.
Em 2011 o Movimento
para Paz com Justiça e Dignidade organizou uma campanha nacional que consistia
em percorrer o país em caravanas. Os depoimentos recolhidos na campanha eram,
em grande número, de cidadãos que denunciavam a cumplicidade da polícia com os
bandos criminosos, assim como inúmeros depoimentos denunciavam prácticas
criminosas realizadas pelos governos locais e funcionários do governo federal.
Depoimentos de familiares de pessoas desaparecidas reuniram provas de que
algumas das vítimas foram exploradas em negócios do crime organizado: nos
campos de cultivo, nos laboratórios, nos armazéns, no tráfico, na segurança,
prostituição, etc. Em muitos casos o rapto é selectivo. Por exemplo:
engenheiros civis, arquitectos e operários da construção são profissões
constantemente assediadas para a construção de residências, casas de
seguranças, estruturas de armazenamento, laboratórios dos cartéis, assim como
especialistas em comunicação e informática.
A cumplicidade das
autoridades e do mundo empresarial com o crime organizado é evidente e feita
abertamente em casos como o que ocorreu em 2013 no município de Aquila, onde um
grupo de autodefesa comunitária denunciou uma rede constituída entre a Mineira
Ternium, as autoridades locais e o cartel dos Cavaleiros Templários. Quando a
Policia Federal e o Exercito acudiram á zona, detiveram 45 membros do grupo de
autodefesa que denunciara a rede. A Ternium, o governo local e os Cavaleiros
Templários continuam impunes.
VII - O crime
organizado no México, como em todo o lado, adoptou as dinâmicas empresariais
actuais (e o vice-versa também é exacto). O dinheiro obtido nos negócios
ilícitos circula na banca mundial e estende-se a todo o tipo de investimentos
(com particular incidência no turismo e na indústria de segurança). Para os
cartéis do crime a globalização assente exclusivamente na livre circulação de
capitais e de mercadorias é o motor do seu crescimento e da internacionalização
das suas actividades.
A economia-mundo
necessita de instituições homogeneizadas e hegemónicas, globais, como o Banco
Mundial, e o FMI, ou de estruturas regionais e inter-regionais como o Banco
Federal dos USA ou o Banco Central Europeu. Mas a economia-mundo já transformou
a realidade, uniformizando-a e a economia é agora a realidade única, pelo que
torna-se necessário, para além da globalização das instituições económicas e
financeiras, a internacionalização das instituições jurídicas e politicas,
transformadas na actual realidade em instituições subsidiárias das primeiras.
Para além disso, a
economia-mundo, o capitalismo global, tem um motor auxiliar: Os cartéis do
crime organizado, novo modelo ético de predador. É a mão invisível…
Fontes
Garrido, Luis
Javier El partido de la Revolución institucionalizada Siglo XXI Ed., 1982.
Blanco, José
Rupturas en la cultura política en 1968 Revista Mexicana de Ciencias Políticas
y Sociales núm.158, octubre-diciembre de 1994.
Vega, María Eugenia
Valdés Una nueva legitimidad en el DF. Las elecciones de 1997 Nueva
Antropología, núm. 54, junio de 1998.