Régulo do Tchiboco, Rei da Lunda Tchokwe entre 1860 – 1880, primo da Rainha Nhakatolo, tio materno do Tchissengue ou Muatchissengue, personalidade aristocrática da corte do Muatiânvua dos mesmos anos.
Muene N’Dumba-Tembo ou Dumba Watembo, é homem elegante, da figura distinta, tipo inteligente, ar nobre e maneira delicada. Trajava um pano de riscado preso á cinta por uma correia, tendo suspensa adiante pequena pele de antílope. Casaco de fazenda escura, coberto de quadradinhos bordados a cassungo completava a sua modesta mas esquisita «toilette».
Uma coroa de latão, como a dos monarcas da Europa, singular cópia de que nunca podemos conhecer a proveniência, cingia-lhe a frente, tendo na parte inferior uma fila bordada a missanga de cores. Pendia-lhe no pescoço exótico colar, onde figurava dois búzios (Cyprea Moneta) e um pequeno chifre de antílope.
Os seus dedos guarnecidos de anéis de latão, terminavam por longas unhas do mesmo metal, dificultando os movimentos, e não lhe permitindo segurar o bordão que muitas vezes lhe caía por terra. Em extremo industrioso, segundo nos afiançaram, anéis, unhas e coroa, tudo era obra sua nos momentos roubados à governação do Estado.
ENCONTRO COM EXPLORADORES CAPELO E IVENS, CAMERON E LEVINGSTONE
Assim descreveram os exploradores portugueses Capelo e Ivens a figura de Dumba Watembo, quando no dia 11 de Julho do ano já distante de 1878 ou 1874, entravam em contacto com ele, no CUCHIQUE, sanza-capital dos Tchokwes daquela época (...) a sanza-capital cuchique situava-se um pouco a oeste das nascentes do rio Cuango e do rio Cassai. O rio cuchique, que difere frequentemente de nome, de mapa para mapa, é afluente norte do rio Luando, subafluente do rio Cuanza (...).
Na primeira das páginas citadas dão-nos os autores um muito curioso retrato do antigo Rei do Tchiboco, instruindo com ele a propósito, as páginas em que o descrevem. É sem dúvida um documento interessante e o único identificado que conhecemos, não apenas do referido Rei nativo dos Tchokwes como dos seus antecessores e sucessores.
Isolados nas extensas e formosas florestas hiemisilva dos seus territórios do TCHIBOCO, país do mel e do embriagante hidromel, os Dumba Watembo, e os seus irrequietos Tchokwes, encheram aquelas espessuras duma reputação temerosa que afastou, prudentemente, os viajantes, até porque as suas comitivas indígenas se negavam penetrar naqueles amedrontadores domínios dos «demónios silvícolas do Tchiboco», segundo a expressão de CAMERON que se desviou daqueles caminhos na sua travessia Zanzibar-Benguela, em 1875.
Já anteriormente, em 1854, o mesmo fizera LEVINGSTONE. Para mais, tivera ele a má ideia de retribuir um soba Tchokwe daquelas proximidades com um boi vivo ao qual faltava o rabo. Valeu-lhe, e dificilmente, a forte escolta dos seus Makokolos que aliás, o tornaram afoito para entregar boi incompleto, em tão exigentes paragens.
O Tchiboco foi, na verdade, e durante longo tempo, um país ensombrado de florestas e de atemorizantes lendas, e por isso sistematicamente evitado pelos exploradores europeus, como bem o confirmam as primeiras palavras do Rei Dumba Watembo aos exploradores: «NUNCA POR AQUI SE VÊM OS HOMENS BRANCOS»...
Isto explica a raridade de notícias e de documentos iconográficos dos antigos régulos daquela região ou estado e o interesse histórico da gravura citada.
Não há dúvida nenhuma que Dumba Watembo provinha das estirpes aristocráticas dos Muatiânvua, criadores e governantes do Império LUNDA, constituído nos finais do Século XV ou XVI, na Katanga Ocidental.
Á margem de dissidentes familiares e políticas, que inimizaram e dividiram LUNDAS e TCHOKWES, os altos chefes Tchokwes eram de etnia Lunda e das famílias aparentadas aos Muatiânvua. O próprio Dumba Watembo, historiando a sua genealogia, descreveu a Capelo e Ivens a existência, na Lunda de além-Cassai ou seja na Mussumba, duma mulher denominada Lukokessa mãe de três chefes Tembos, um deles, ele próprio (Dumba).
Podemos esclarecer que a Lukokessa (algumas vezes sob a forma gráfica de Lucoqueça) era um alto dignatário feminino da corte dos LUNDAS.
Dumba era filho da Tembo irmã de Yala Ya Muaka ou (Iala Maku deturpação Europeia), tia da Lueji, mãe ou avô de Muatiânvua Ianvo que foi o primeiro Muatiânvua eleito.
Provavelmente, a data do colapso e da separação das dinastias com o tabú da Lueji (por ter casado com Tchipinda Ilunga), fixa-se entre os anos de 1595 – 1650, a contar da presença do Tchingúri em Luanda.
Trata-se, neste caso, do antepassado de Dumba Watembo que conduziu a invasão dos Tchokwes da Mussumba, através do rio Luau, e seguidamente ao longo do Cassai superior, em épocas que fixamos no primeiro quartel do século XV ou XVII, seja uns dois e meio século antes da vista dos exploradores Europeus, ao Dumba Watembo, no Tchiboco.
Se atribuíssemos 20 anos a cada Reinado, o Dumba Watembo em questão seria o 12º ou 13º Rei do Tchiboco.
Dumba significa Leão, Tembo sua mãe, significa que Leão da Tembo. Trata-se de uma hierarquia nobre, apoiada no prestígio de nome ou de família e um título da governação no reino, tal igual o nome do Muatchissengue. O Dumba é tio do Muatchissengue de acordo com a linhagem dos Thumba Kalunga.
Encontram-se os nomes Tembo junto ao Lucala e a Massangano. Na língua de Matamba, o local onde se guardava os ídolos era designado Tembo. Há notícias dum nome Tembo-Ndumba, da mulher do Jaga Zimbo, e na Jinga venerava-se a memória de Tem-Bam-Dumba. Aliás, vários etnógrafos e historiadores têm encontrado correlações entre os Tchokwes e os Jagas.
Desse facto, e das ramificações do nome Tembo em Angola, o próprio Dumba Watembo deu elementos, nas conversas com os exploradores europeus, ao referir como parentes Muzumbo Tembo dos Songos ou Massongos, e Cassange Tembo, que se institui Jaga do Quembo-Songo e Holo.
O Dumba Watembo, da época de Capelo e Ivens, ainda se empenhou no alargamento de domínio, e blasonava do seu poderio, em arengas como esta: - “Os meus domínios são tão grandes que estendem daqui a Catende para lá do norte; neles só eu mando, a mim tudo obedece”.
Mantinha, também hábitos de grande corte Africana, com a sua guarda pessoal do comando dum seu sobrinho, «armado até aos dentes», um corpo de tamborileiros e xilofonistas para festas e recepção, e um estado-maior de notáveis de conselho e de guerra.
Esta actividade bélica e praxe da corte, estão de acordo com as ambições dos primeiros Dumba Watembo, que imaginaram a criação no Tchiboco dum Estado poderoso e organizado, nos moldes do estado dos LUNDAS da Katanga (do qual, aliás, foram dissidentes, para se eximirem ao seu poder nascente, aliado ao dos Balubas do II Império, nos finais do século XVI).
Aquela tentativa do Tchiboco, porém, foi uma concepção de classes aristocráticas, a que a massa Tchokwe, irrequieta e nómada, de perfeito acordo com a sua ancestralidade de caçadores savánicos, se não prestou.
Á volta dos anos 1857 a 1878 ou 1879 já os Tchokwes imigravam através dos Luchazes, atacavam os povos matabas no nortes da lunda e alcançavam com os seus primeiros bandos os territórios dos Batchilangues, por altura do quinto grau de latitude sul. O estado de Tchiboco entrava em rarefação.
Ao Dumba Watembo da época do Capelo e Ivens, outros se seguiram até a passagem do trono ao Tchissengue ou Muatchissengue, decerto mais decadentes, até que uma terrível época de fome assolou o Tchiboco, haverá pouco mais de meio século, levando as populações a um êxodo que baixou extraordinariamente os efectivos demográficos do Estado de Tchiboco. Uma epidemia de varíola elevou a alto grau o índice de mortalidade. Esta catástrofe, que ficou conhecido por “Muaka ua kapunga ou Muaka ua Nzala (Época da fome), terá sido a grande responsável pelo desaparecimento do Estado do Tchiboco.
Comissão do Manifesto Jurídico Sociológico do Protectorado da Lunda Tchokwe
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