Pedro
Ivo Carvalho – Jornal de Notícias, opinião
No
laboratório de Berlim, a Grécia foi sempre o ratinho mais estimado. E
sacrificado.
Foi
a primeira nação a ser pregada na cruz da austeridade, a primeira a projetar
para o Mundo o ideário maligno de uma Europa desregulada, despesista, quase
selvagem no uso dos dinheiros públicos. A Grécia, com a sua ultrajante economia
paralela, manifestações violentas e hordas de gente sem emprego e com fome, era
uma doença de que todos queriam fugir. Mas a resiliência do vírus prevaleceu.
Contagiou a Irlanda e a Espanha. Chegou a Portugal.
Ainda
assim, há cinco anos, Angela Merkel não queria ouvir falar na possibilidade de
a Grécia abandonar o euro. Reinava a chamada teoria do dominó: se caísse a
Grécia, caía tudo. Os tempos eram outros. E, em política, como é sabido, os
tempos ditam os estilos.
A
teoria do dominó deu, agora, lugar a uma novel designação, mais prosaica,
chamada teoria da cadeia: quando o elo mais fraco sai, o resto da cadeia
torna-se mais forte. É assim uma espécie de limpeza higiénica em favor da
sobrevivência.
A
mesma Angela Merkel que não se comoveu com as convulsões sociais vividas pela
Europa no dealbar da crise económica fica de joelhos trémulos ante a
possibilidade de o Syriza, partido da Esquerda radical que tem ganho ascendente
no eleitorado helénico, poder vir a ganhar as eleições legislativas do próximo
dia 25. Partido esse que, embora tenha vindo a moderar o seu discurso, não
abdica, no essencial, de acabar com a austeridade, garantindo o perdão de uma
parte da dívida do país aos credores, por considerá-la impagável.
É
disto que falamos quando vemos Berlim a deixar cair Atenas: a Alemanha não
aceita que um povo que durante anos sentiu o cajado da austeridade nas costas
possa escolher livremente o seu governo, seja ele qual for, porque essa escolha
pode ser contrária aos interesses não da Europa, mas da ideia da Europa que a
Alemanha quer fazer vingar. Facilmente se percebe onde quer chegar Merkel: este
aviso é para ser escutado pela Frente Nacional, em França, pelo Movimento Cinco
Estrelas, em Itália, e pelo Podemos, em Espanha. Esta Europa
que a Alemanha abomina é a Europa que a Alemanha gerou.
Para
Merkel, a democracia é uma maçada. Os gregos foram bons sacos de boxe enquanto
dar pancada nos países do Sul foi um desporto de massas; os gregos tornaram-se
nuns empecilhos quando ameaçaram usar em sua defesa o poder que verdadeiramente
faz a diferença em democracia: o voto.
Editor-Executivo-Adjunto
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