No
acórdão a que a Lusa teve hoje acesso, e que confirma uma notícia avançada pela
revista Visão, o TRL deu razão a um recurso do Ministério Público (MP) contra
um despacho do juiz de instrução, de 13 de novembro de 2016, que declarou a
incompetência absoluta dos tribunais para investigar factos praticados por um
cidadão de outro país, nomeadamente de Angola, pelo que absolveu a filha do
Presidente angolano.
Em
causa, está um inquérito por suspeitas de branqueamento de capitais contra
Welwitschea José dos Santos, também conhecida como "Tchizé", e
outros-
Os
juízes desembargadores da 5.ª secção do TRL decidiram ainda revogar "todas
as apreciações efetuadas e declaradas" no despacho do TCIC, incluindo a
consideração relativamente à insuficiência indiciária do crime de branqueamento
e preenchimento deste tipo de crime, pelo que o MP pode agora retomar a
investigação, que tem como assistente o ativista angolano Rafael Marques, e na
qual foi denunciada Welwitschea José dos Santos.
Segundo
o recurso do MP dirigido ao TRL, os factos em investigação prendem-se com
relatos que sustentam a suspeita de que Welwitschea José dos Santos se
encontraria a utilizar o sistema financeiro português para proceder à
introdução camuflada na economia legítima de quantias por si obtidas através do
desenvolvimento de atividade económica e negocial, em Angola, por via do
exercício de influência indevida juntos dos órgãos decisores do governo
angolano.
"Tal
factualidade é passível, em abstrato, de consubstanciar a comissão, em Portugal,
do crime de branqueamento", adianta o MP, precisando que o objeto dos
"presentes autos prende-se com a análise dos movimentos financeiros que
foram detetados, em instituições de crédito a operar em território português,
envolvendo, entre outros, Welwitschea José dos Santos".
No
recurso, o MP invocou ainda que o crime de branqueamento de capitais é punido
ainda que os factos que integrem a infração subjacente tenham sido praticados
fora do território nacional ou ainda que se ignore o local da prática do facto
ou a identidade dos seus autores, sublinhando que esta
"transterritorialidade" resulta da vinculação do direito português a
regras europeias.
Em
resposta ao MP, Welwitschea José dos Santos veio dizer que o inquérito do MP
teve origem numa queixa do cidadão angolano Adriano Alfredo Teixeira Parreira,
ex-embaixador de Angola junto de organizações internacionais, em Genebra,
exonerado em consequência de práticas criminosas, do exercício daquela função,
que culminaram na respetiva condenação, em 15 de março de 2000, pelo Tribunal
Supremo de Angola, pelo crime de apropriação ilegítima de bens na
pena de quatro anos de prisão e na obrigação de indemnizar o Estado angolano em
1.259.251,17 dólares norte-americanos.
Welwitschea
José dos Santos sublinha que até ao presente "nunca foi constituída
arguida" no inquérito e nota que a essência da questão diz respeito à
"forma ilegal e discriminatória como o MP (...) pretende continuar a
investigar em Portugal os factos integradores do `crime precedente´
alegadamente praticados em Angola quando está documentalmente provado nos autos
o arquivamento, em Angola, dos processos emergentes de queixas apresentadas na
Procuradoria-Geral da República de Angola" pelo assistente no processo.
A
filha do Presidente de Angola lembra ainda que "não é sujeito passivo
fiscal residente em Portugal" e que o MP "bem sabe e não ignora que
nos autos inexiste a prática de qualquer ilícito prévio ou crime
precedente" por si praticado.
"A
recorrida [Welwitschea] não tem antecedentes criminais em Angola por crimes
precedentes de branqueamento de capitais, nem processos-crime em investigação,
de tal facto emerge automaticamente uma impossibilidade objetiva de verificação
do tipo inerente àquele crime, pelo que não há, nem pode haver, crime de branqueamento
de capitais", alegou ainda Welwitschea.
Da
informação patrimonial recolhida no inquérito pelo MP relativamente a
Welwitschea José dos Santos consta, entre outros, um prédio urbano, em
Alcabideche, Cascais, no valor de 1.518.490,00 euros, um prédio urbano, em
Oeiras e S. Julião da Barra, no valor de 222.891,21 euros, outro terreno
urbano, também na mesma localidade, no valor de 225.812,13 euros e duas
viaturas automóveis (Mercedes-Benz e Audi).
Os
autos referem ainda que, quanto a Welwitschea, mais se apurou que a mesma era
detentora de contas bancárias junto do Banco Santander Totta, sendo uma delas
creditadas no valor de 150.000 euros e outra creditada em 19 de outubro de 2010
por uma transferência de 800.000 dólares norte-americanos provenientes do BPN
(Banco Português de Negócios).
Como
justificação para os fundos, foi invocada a atribuição de um "success
fee" pela empresa "Westside Investiment, SA", da qual a Welwitschea
José dos Santos é administradora.
FC
// HB // LUSA
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