quarta-feira, 13 de abril de 2022

NÃO À GUERRA, SIM À PAZ

Manuel Augusto Araujo* | Praça do Bocage

Não se entende em que se possa criticar a posição do PCP sobre a invasão e guerra na Ucrânia. https://www.pcp.pt/pcp-apela-promocao-de-iniciativas-de-dialogo-paz-na-europa. Condenar esta guerra não é incompatível com a simultânea condenação do comportamento dos EUA e da UE desde a queda do muro de Berlim. Nenhuma guerra é inevitável em qualquer realidade social, em que como de resto em qualquer outra, não há determinismos. 

Ao contrário de muito pensamento viciado quer impingir, e que vai do mais linear e vulgar anti-comunismo da extrema-direita e direita o que é de esperar, ao de socialistas, sociais-democratas e radicais pequeno-burgueses entrincheirados em verdades, meias-verdades e mentiras, usado para denegrir a posição de condenação da guerra e do imperialismo feita pelo PCP, a posição do partido está em linha com os mais variados sectores anti-imperialistas em todo o mundo. Alguém de esquerda pode discordar desta análise: «A actual situação e seus desenvolvimentos recentes são inseparáveis de décadas de política de tensão e crescente confrontação dos EUA e da NATO contra a Federação Russa, nos planos militar, económico e político, em que avulta o contínuo alargamento da NATO e o sistemático avanço da instalação de meios e contingentes militares deste bloco político-militar cada vez mais próximo das fronteiras da Federação Russa.»? Isto não justifica a invasão e a guerra da Ucrânia como o PCP tem repetidamente condenado, que se distingue de quem também a condena mas é incapaz de ultrapassar as fronteiras das vagas conversas de palavras enroladas que não bastam para deter as organizações militaristas tanto da EUA/NATO, com a Europa a reboque, como da Rússia, nesta guerra que é mais um episódio da guerra mais funda e generalizada, que se tem desenvolvido em vários planos desde a queda do Muro de Berlim, para impor um mundo unipolar que viola sistematicamente a Carta das Nações Unidas e o direito internacional e que está agora a fissurar.

Cada vez mais é menor e possível a capacidade para se ficar impassível com o desequilíbrio mediático no tratamento deste assunto, tanto nos media como nas redes sociais, em que se assiste ao derrapar de muita gente que se diz de esquerda. O único caminho para quem é de esquerda é um lúcido não-alinhamento que se distinga dos alinhamentos acríticos para um lado ou para outro. Nem é concebível nem aceitável que alguém que se diz de esquerda alinhe em vagos e patéticos humanismos para se arrumar num desses lados ou se escude em argumentos insustentáveis justificativos desta cinicamente chamada «operação militar especial» para, até disfarçadamente, alinhar com o outro.

A cuidadosa, fundamentada e corajosa posição do PCP tem sido terreno aberto para a mais viciosa campanha anti-comunista. É um dos mais grotescos espectáculos a que se tem assistido nos últimos anos, agora catalisados por esta guerra. Felizmente entre essa turba multa, em que os detratores se misturam acríticamente ou fazendo críticas falaciosas, há algumas vozes desassombradas que se destacam nesse panorama inquietante em que nos deparamos com muita gente que merece consideração mas que enfileira com esse tom generalizado, alinhando sofismas sobre sofismas para desculparem a sua posição que trucida sem vergonha as posições do PCP, reafirmadas por Jerónimo de Sousa no comício realizado no Campo Pequeno: « O PCP não apoia a guerra. Dizer o contrário é uma vergonhosa calúnia. O PCP tem um património inigualável na luta pela paz. O PCP não tem nada a ver com o governo russo e o seu presidente. A opção de classe do PCP é oposta à das forças políticas que governam a Rússia capitalista e dos seus grupos económicos (…) Em nome da guerra está em curso a mais desbragada intolerância e difusão de ódio fascizante, a criminalização do pensamento e de toda e qualquer opinião que questione a ditadura do pensamento único, a instituição da censura, o condicionamento do acesso à informação a limitação de liberdades, direitos e garantias.»

Uma dessas lúcidas e corajosas excepções, num território que não é o dos militantes do PCP e seus companheiros de estrada, é Carmo Afonso, que se auto intitula “social-democrata da velha guarda” e que em relação à guerra escreve: « É preciso atender às vozes que dizem que os recentes avanços da NATO, em direção à Rússia, concretizados na adesão de novos países vizinhos, contrariaram entendimentos vigentes e que seguravam a paz» e em relação ao PCP: «Tristes tempos em que uma guerra é pretexto para diminuir uma força política que tem estado no lado certo das lutas que os portugueses travaram. É sobretudo um partido dos trabalhadores (…) Pode dar-se o caso de os portugueses já não precisarem da luta. Mas, voltando ao que faz sentido, é mais certo que estejam a ser distraídos por quem quer acabar com ela»(…) «As posições assumidas pelo PCP foram o pretexto para uma manifestação de anticomunismo digna da Guerra Fria, período em que os anticomunistas afirmam que o partido está. O regresso à história está ao virar da esquina». Será que quem se diz de esquerda não percebe o que esta "social-democrata dos bons velhos tempos" lucidamente entende, continuando a insistir na mentira sobre o apoio do PCP à invasão de Putin, uns sem se aperceberem mas outros compreendendo bem, que a propaganda em curso está objectivamente ao serviço do neoliberalismo armado e fazem-no atacando o PCP.

Por toda a Europa os sinais de fascização são evidentes. Como dizia um personagem do filme de João César Monteiro, Le Bassin de John Wayne «hoje, os novos fascistas apresentam-se como democratas». O que ficou bem manifesto no número mediático protagonizado pelo comediante presidente, na sua digressão instrumentalizadora dos vários parlamentos, no parlamento grego que o Syriza afirmou ser «uma provocação com um apelo claro à normalização do fascismo» e que mereceu mesmo a crítica dos partidos gregos equiparados ao PS e PSD que a classificaram de «vergonha histórica» Uma cena que à posteriori, só dá razão ao PCP ao votar contra um convite formal ao presidente Zelensky para intervir no parlamento português, por videoconferência, que foi aprovada na passada quarta-feira pela Assembleia da República.

Putin é um crápula e a sua guerra é infame. Os apoiantes de Putin são abjetos. Mas são tanto como aqueles que se sentam nas cimeiras da NATO e se dizem democratas e defensores dos direitos humanos. Não há distinções nem gradações entre uns e outros. A guerra na Ucrânia é um bárbaro espetáculo de perdas humanas por conveniência do imperialismo russo em que a Ucrânia é uma marioneta dos EUA/NATO. O único caminho de quem é de esquerda é ser contra o expansionismo russo e o do EUA/NATO com a UE a reboque.

NÃO À GUERRA, SIM À PAZ.

*Manuel Augusto Araujo | 12 de Abril de 2022

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