quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Sigam o Rasto do Dinheiro -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A Procuradoria-Geral da República pediu às autoridades portuguesas que “recuperassem” a EFACEC porque a empresária Isabel dos Santos comprou-a com dinheiro desviado do Estado Angolano. No ano de 2019, ainda sob gestão da proprietária, a empresa facturava 355 milhões de euros e tinha em carteira quase 400 milhões. 

No seguimento da “recuperação” foram ver e afinal a empresária Isabel dos Santos comprou a EFACEC com empréstimos bancários. Quatro anos depois a empresa está de rastos e o Estado Português ficou com um rombo de 500 milhões de euros. Depois deste fiasco, vai ser difícil Portugal confiar nas autoridades judiciais angolanas.

Os fundos ilegais de cidadãos angolanos depositados no estrangeiro só são restituídos quando não existir a mínima dúvida quanto à sua origem. E mesmo assim vai ser difícil mandar milhões para Luanda, que fazem tanta falta aos falidos países do ocidente alargado e seus paraísos fiscais. Luanda pede que sigam o rasto do dinheiro mas ninguém vai nisso. O kumbu faz-lhes imensa falta.

Os Media nacionais e estrangeiros deram grande destaque à decisão de três juízes num Tribunal de Londres, que recusaram descongelar mais de 600 milhões de euros da empresária Isabel dos Santos. Mas ninguém vai repetir a aventura da EFACEC. E o dinheiro faz falta aos ingleses para fazerem figura de grandes senhores da alta finança. A vida está difícil para todos.

O Presidente João Lourenço no seu discurso na Assembleia-Geral da ONU disse que na “recuperação de activos” Angola teve dois casos de sucesso, graças à cooperação das autoridades do Reino Unido. Elogios merecidos. Londres, em 1974 e 1975, mandou-nos mercenários que se divertiam a matar angolanos.

Apesar do sucesso no Reino Unido, há muitos casos de insucesso. Disse o Chefe de Estado: “Lamentavelmente nem todos os países que aceitaram receber esses activos da corrupção, sem questionar na altura as origens dos mesmos, respeitam hoje as sentenças dos nossos Tribunais que são de cumprimento obrigatório.” Isso de outros países cumprirem obrigatoriamente as sentenças dos Tribunais Angolanos é uma piada que só contaram a sua excelência. 

E mais grave ainda: “Alguns desses países se arrogam mesmo ao direito de questionar a credibilidade dos tribunais angolanos, quase que querendo rever as sentenças emitidas pelos mesmos, como se de órgãos de apelação extraterritoriais se tratassem”.

Isto é autocrítica e muito corajosa. O Presidente João Lourenço sabe que a perda de credibilidade do Poder Judicial se deve a ele próprio. Mais ninguém. É ele que mantém Hélder Pita Grós como Procurador-Geral da República. No dia em que ele deu uma conferência de imprensa informando que num processo em segredo de justiça existiam provas suficientes para uma condenação em Tribunal, devia ser imediatamente demitido. Ainda está no cargo mesmo depois de ter anunciado que ia sair. 

A campanha pública da Procuradoria-Geral da República contra o presidente do Tribunal Supremo é motivo mais do que suficiente para fazer uma limpeza de balneário. Nada aconteceu.

O Tribunal Constitucional atirou para o lixo um Decreto Presidencial que era em si uma mancha na honra das Magistraturas, dos Tribunais e do Ministério Público. O famoso decreto que dava dez por cento de comissões a quem recuperasse activos. Era suposto demitir quem levou João Lourenço a assinar um diploma inconstitucional. Nada aconteceu. Impunidade.

O Tribunal Constitucional proferiu um Acórdão sobre o “Processo dos 500 Milhões” que devia levar a uma reflexão profunda. Nada. Nem sequer libertaram os arguidos, injusta e ilegalmente condenados. Ninguém confia num Poder Judicial que protagoniza situações tão graves. João Lourenço está a dar razão a quem o acusa de perseguir os familiares do Presidente José Eduardo dos Santos. Um dos arguidos, José Filomeno dos Santos (Zenu) é filho do anterior Chefe de Estado. Estas são manifestações de ódio à liberdade e vingança mesquinha

A Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos considerou arbitrária a prisão do empresário Carlos São Vicente e o seu julgamento ilegal. Recomendou medidas ao Estado Angolano. Uma delas, a sua libertação imediata. Continua preso graças a mais uma arbitrariedade. Já tem direito à liberdade condicional mas o processo está engavetado no Ministério do Interior e não chega ao juiz da execução de penas. Quem confia num Poder Judicial assim? Só mesmo quem se serve do seu cargo para transmitir ordens superiores aos magistrados e aos Tribunais.

Os alemães ocuparam Namíbia desde finais do século XIX e só saíram quando perderam a II Guerra Mundial. Chamavam a esta colónia Damaralândia ou Sudoeste Africano Alemão. Os europeus colonialistas chamavam aos hereros “dâmaras”. Em Angola habitam o território entre Quilengues, Lola e a Lucira, toda a província do Namibe (mucubais) e Huíla. No meu livro “Contos Populares Angolanos” publiquei vários contos hereros. Preciosidades que foram salvas do esquecimento.

Em janeiro de 1904, os hereros revoltaram-se contra os colonialistas alemães. Eles são pastores e os ocupantes transformavam as pastagens em terrenos cultivados. Impediam o acesso à água. Os combates decorreram em todo o território até Agosto, altura em que o general alemão Lothar von Trotha esmagou os revoltosos. Os sobreviventes foram empurrados para o deserto, onde morreram de sede. Os colonialistas também envenenaram as mulolas e os mananciais de água doce. Mais de 70 por cento da população da Namíbia morreu na guerra ou de sede. Este foi considerado o primeiro genocídio no século XX.

Os alemães nessa época tinham um projecto para instalação de um caminho-de-ferro em Angola que depois descia para a Namíbia e África do Sul. O canal ferroviário podia nascer na Baía dos Tigres, na cidade do Namibe ou no Tombwa, conforme o território que fosse ocupado militarmente na colónia portuguesa. Os estudos estão feitos há 100 anos! Hoje foi anunciado o Corredor do Namibe com a construção de um canal ferroviário que liga Angola à Namíbia. Não andem a torrar dinheiro à toa. Vão consultar o projecto dos alemães. 

O Eurocentrismo resulta do colonialismo. São os supremacistas brancos que excluem todos os brancos que não sejam europeus! Quem não é europeu e branco, é bicho feio. Se o Irão (Pérsia) ataca Israel é um crime contra a Humanidade. Se Israel ataca o Irão é o exercício do direito à defesa.

Ontem Israel destruiu um centro médico em Beirute. Matou socorristas e técnicos de saúde. Na passada também destruiu um centro de imprensa. Mais mortos. Foi umam forma eloquente de exercer o direito à defesa. Agora os eurocentristas imploram à Casa dos Brancos e aos nazis de Telavive que destruam o complexo de energia nuclear do Irão. Os judeus nada têm a ver com esta loucura assassina. Mas vão sofrer tanto como estão a sofrer os islâmicos. Os eurocentristas caminham voluntariamente para a extinção. 

* Jornalista

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