quinta-feira, 13 de março de 2025

Moçambique | "Daniel Chapo pode acabar com a repressão dos protestos"

Amnistia Internacional teme o regresso à repressão em larga escala dos protestos e da dissidência que se seguiu às eleições gerais do ano passado. Defensores dos direitos humanos pedem investigação e responsabilização.

Amnistia Internacional quer investigações urgentes aos tiroteios registados nas últimas semanas contra apoiantes da oposição em Moçambique. O apelo é lançado pela diretora regional adjunta da organização, Khanyo Farise, para quem "estes incidentes fazem temer um regresso à repressão dos protestos em larga escala da dissidência que se seguiu às eleições do ano passado".

Tais incidentes, acrescentou Khanyo Farise, "refletem a impunidade que existe atualmente em Moçambique". A diretora regional adjunta afirmou que "as autoridades moçambicanas devem abrir urgentemente investigações sobre todos os relatos de violações dos direitos humanos cometidos desde as eleições, incluindo os assassinatos de mais de 300 pessoas".

As declarações de Farise são reforçadas por Miguel Marujo, diretor de comunicação da Amnistia Internacional Portugal, que também receia a impunidade perante os crimes cometidos durante estes meses, após o anúncio dos resultados das eleições de 9 de outubro.

DW África: Pode fundamentar este apelo da Amnistia Internacional para a África Oriental e Austral sobre os tiroteios contra apoiantes da oposição em Moçambique?

Miguel Marujo (MM):  Aquilo que a Amnistia Internacional constatou é que, nas últimas semanas, houve relatos de um conjunto de tiroteios que suscitam novamente preocupação. Há relatos de homens armados que dispararam contra a casa de um funcionário da oposição, há um tiroteio fatal de dois membros da oposição num carro e também o facto de a polícia ter alegadamente disparado contra um protesto pacífico liderado pelo líder da oposição moçambicana, Venâncio Mondlane, ferindo pelo menos uma dúzia de pessoas. Para a Amnistia Internacional, estes incidentes fazem temer o regresso à repressão em larga escala dos protestos e da dissidência que se seguiu às eleições do ano passado.

DW África: Esta necessidade urgente de investigações tem constituído uma das grandes lacunas das autoridades competentes moçambicanas diante dos vários casos de repressão na sequência dos protestos?

MM: Sim. No entendimento da Amnistia Internacional, há de facto uma urgência em abrir investigações sobre todos os relatos de violações dos direitos humanos que foram sendo notificados e cometidos desde as eleições de outubro, incluindo-se, neste caso, os assassinatos de mais de 300 pessoas. Há números de diferentes organizações da sociedade civil moçambicana que sustentam a morte de mais de 300 pessoas e tudo isto deve ser investigado pelas autoridades moçambicanas.

O Presidente Daniel Chapo, que tomou posse recentemente, deve defender também os apelos a uma responsabilização de todos os atores envolvidos e usar a sua autoridade para acabar com a repressão dos protestos e dos opositores políticos e levar os suspeitos destes crimes a tribunal.

DW África: Pela postura da Justiça moçambicana, considera que estes casos de violação dos Direitos Humanos podem cair na impunidade?

MM: Até agora, aquilo que temos assistido é isso. De facto, há uma impunidade perante os crimes cometidos durante estes meses. A Amnistia Internacional já tinha lançado um alerta, no final de fevereiro, de que era importante o novo Governo moçambicano dar início imediato a essas investigações que devem ser independentes, eficazes e exaustivas a todas as mortes relativas a estes protestos e incidentes de tortura e muitos outros maus tratos que foram identificados. E as autoridades moçambicanas devem, depois, publicar as conclusões dessas investigações. É outro desafio que a Amnistia lançou para que, de facto, estes crimes não fiquem impunes.

DW África: O Estado moçambicano, nomeadamente as forças policiais, devem ser responsabilizados por tais atos? Responsabilizados até que ponto?

MM: O Estado moçambicano tem a primeiríssima responsabilidade de investigar o que se passou e de verificar aquilo que aconteceu. Há relatos credíveis, como eu disse, de violações generalizadas dos Direitos Humanos. Há mais de 300 pessoas que foram mortas, incluindo crianças e pessoas que passavam na rua sem qualquer relação com os protestos. E durante as tentativas de esmagar estes protestos também se verificaram relatos muito credíveis de que estas mortes aconteciam por responsabilidade das forças de segurança. Por isso, é urgente que o Estado moçambicano atue junto das forças de segurança, que não podem estar associadas a estas mais de 300 mortes. 

DW África: O apelo que a Amnistia faz ao Presidente de Moçambique, Daniel Chapo, é suficiente?

MM: É o apelo ao mais alto dignatário da nação moçambicana. Para nós, é o destinatário que, neste caso, deve atuar. O Presidente Daniel Chapo tem as competências para poder exercer a sua autoridade e terminar com a repressão dos protestos e dos opositores e para pôr termo ao ataque aos opositores políticos, levando os suspeitos a tribunal. Faz falta que o Presidente Daniel Chapo, de facto, ponha em marcha esta sua possibilidade de acabar com esta impunidade generalizada das forças de segurança.

João Carlos | Deutsche Welle

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