Eduardo Lobão, da agência Lusa
Lobito, Angola, 07
out (Lusa) - Ex-número três da guerrilha da UNITA, António Urbano Chassanha
despiu a farda em 1992, e agora, radicado no Lobito, litoral sul de Angola,
trocou o passado militar pela vida de empresário, no ramo da floricultura.
Do passado guarda
as memórias que passou a escrito em dois livros, "Angola: Onde Os
Guerreiros Não Dormem" (2000) e "Esanju: A Rebelde Do Wambu"
(2003), e às quais promete voltar quando o projeto de vida que abraçou entrar,
como diz, em "velocidade de cruzeiro".
Agora, radicado na
Catumbela, entre o Lobito e Benguela, Urbano Chassanha explica que sendo
reformado das Forças Armadas Angolanas não queria passar o resto dos dias
"sentado no sofá à frente de uma televisão".
Em conjunto com a
mulher, Anabela, também reformada, tiveram há três anos a ideia de produzir
espécies vegetais de reposição e a partir daí avançaram para a produção de
árvores ornamentais, plantas e flores.
"Eu tive um
mestre que dizia que quem conhece o sofrimento aprecia melhor a felicidade dos
outros. Realmente, criar vida, meter a semente, esperar que ela brote,
acompanhar esse crescimento, colocar nos sacos, enfim toda essa dinâmica é uma
coisa que dá muito gozo", garante.
Antigo oficial
superior das Forças Armadas de Libertação de Angola (FALA/UNITA), Urbano
Chassanha coliderou a delegação do partido do "Galo Negro" na
Comissão Conjunta, órgão criado para supervisionar a aplicação do Protocolo de
Paz, assinado em 1994, em Lusaca, e foi deputado.
O despertar das
armas em 1999 apanhou-o já na vida civil, mas não voltou a pegar em armas.
Preferiu recorrer às memórias da guerra e publicou dois livros, em que ajustou
contas com o passado.
Há três anos mudou
de vida e assumiu um papel para que não parecia vocacionado: criou a Lobitus
Garden Horto e confessa-se realizado.
"Fizemos
experiências com árvores autóctones, cujas sementes estamos a tirar da área do
Balombo e do Bocoio (província de Benguela). Brotaram bem, estão bem de saúde,
e temos capacidade, quando nos for solicitado, de produzir milhões de espécies",
afirma, orgulhoso.
Consigo trabalham
42 pessoas. Ajudam-no no processo de criação de vida, que teve como ponto de
partida a edificação de viveiros.
"Fazem-se os
viveiros. Depois de as plantas brotarem, geralmente na quarta folha, como nós
chamamos, fazemos o transplante para os sacos pequenos. Vamos acompanhando o
desenvolvimento da planta. Quando atingir uma determinada altura, em função das
espécies, evolui para um saco médio, depois para um saco grande e depois para o
chão", explica.
Convertido à nova
identidade, Urbano Chassanha considera não ter sido difícil a transição de
ex-guerrilheiro para floricultor.
"Costumo dizer
que a guerra não nos criou muitas opções. A paz cria-nos todas as opções
possíveis e imaginarias. Não foi nada difícil. Gosto daquilo que faço e tenho
interesse em fazer mais, porque é uma área, como disse, que me dá imenso
prazer", frisa.
E Angola? Será que
o país, saído há 10 anos de uma guerra civil que deixou milhares de mortos e estropiados
e destruição para trás, está preparado para substituir as balas por flores?
"Penso que o
país tem todas as condições para seguir em frente. As insuficiências são
próprias de um processo que não é fácil Também ninguém vai pensar em
facilidades para o futuro. É preciso trabalhar. É preciso trabalhar
muito", diz.
"Acredito que
com o tempo todas as feridas podem ser saradas. Também noto, com muito agrado,
a ânsia das pessoas em aprender mais, se formar, o que é um sinal extremamente
positivo e nós, mais velhos, estamos aqui para contar as histórias,
provavelmente", adianta.
As memórias
permanecem intactas e depois de o projeto atual entrar na "velocidade de
cruzeiro" diz que vai insistir em passar para o papel as histórias que
protagonizou.
"Estou a dar
um compasso de criar este projeto, mas quando sentir que está em velocidade de
cruzeiro terei depois tempo para me dedicar à escrita", conclui.
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