Pedro Tadeu –
Diário de Notícias, opinião
Ontem os jornais e
as televisões falavam mais sobre uma nova argolada do consultor governamental
António Borges do que da manifestação que envolveu, na véspera, a mobilização
de milhares, não, dezenas de milhares, não, centenas de milhares de portugueses
que resolveram ir protestar, outra vez, contra as políticas dos chefes do dito
doutor Borges.
Não, não estou a
criticar a comunicação social, até porque a cobertura à manifestação envolveu
meios bem superiores ao habitual e o tom geral, como acontecera na anterior, a
15 de setembro, foi nitidamente favorável aos manifestantes - mesmo, por vezes,
em desfavor, reconheço, da isenção que supostamente o jornalismo deve manter.
Isto deve ter
irritado imenso quem odeia, por ideologia ou diletantismo, esta coisa do
"povo que sai à rua" e está habituado, há anos, a deleitar-se com,
nas pantalhas dos telejornais, a caricatura (também ela nada independente)
deste tipo de participação política, seguida da inevitável menorização nos
matutinos do dia seguinte, seguida ainda das previsíveis análises enxovalhantes
nos hebdomadários do regime. Até isso a TSU mudou!
O que se passa é
que o doutor António Borges é notícia irresistível sempre que decide abrir a
boca. Ele é uma criança, inocente, que grita "o rei vai nu". Ele é o
maluco da aldeia que diz tudo aquilo que o pudor dos aldeões esconde no
silêncio cúmplice. Ele é a peneira que não consegue esconder o sol. Ele é o
delator dos segredos de polichinelo. Ele é, portanto, notícia, clássica e pura como
poucas.
Desta vez, depois
de ter suspendido a destruição da RTP ao anunciar precocemente uma concessão
que irritou meio mundo, depois de ter revelado as escondidas intenções
governamentais ao dizer, plácido, que "a diminuição de salários não é uma
política, é uma urgência", o homem que conseguiu transformar em anátema o
glorioso currículo de quadro de topo da Goldman Sachs e do FMI declarou que os
empresários (quase todos) que não gostaram das mudanças pretendidas por Passos
Coelho na taxa social única "são uns ignorantes". E aí estão, os
ditos empresários, danados contra com quem, afinal, deveria defendê-los!!!
Uma das razões, das
poucas, que mantêm o Governo no poder é o medo de que a instabilidade política
possa vir a ser fatal para a economia deste país aflito. Os que acreditam que,
pelo contrário, assim é que o País se trama devem, já, ir a correr a São Bento
manifestar-se a favor do doutor Borges, o amigo que ninguém precisa ter... Nem
o Governo!
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