Daniel Oliveira –
Expresso, opinião, em Blogues
Nos países que se
querem civilizados a sociedade organiza-se para garantir aos deficientes, na
medida em que isso seja possível, a mesma qualidade de vida, oportunidades de
trabalho e direitos que aos restantes cidadãos. E isso implica custos que, como
um todo, assumimos.
O que o Estado
português garante aos deficientes é muito pouco. Pouco mais de 200 euros de pensão
social de invalidez para quem, em grande parte dos casos, tem de gastar
muitíssimo mais do que isso para garantir o que aos não deficientes sai de
borla: a mobilidade e as capacidades físicas essenciais que para a maioria são
tão naturais como respirar. O subsídio de assistência por terceira pessoa - que
é dado a quem tenha uma pessoa deficiente a cargo que precise de assistência de
pelo menos 30 horas por semana - é de 88 euros. Dá cerca de cinquenta cêntimos
por hora. O subsídio mensal vitalício, também para quem tenha uma pessoa
deficiente a cargo com mais de 24 anos, para supostamente pagar todas as
despesas, é de 177 euros. Na realidade, não estamos a falar de subsídios mas
sim de esmolas. Dinheiro que não daria para uma pessoa sem qualquer deficiência
sobreviver.
Para além disto, os
produtos de apoio - cadeiras de rodas, andarilhos, adaptações dos automóveis,
próteses, fraldas, sondas ou algalias - são, em parte, suportados pelo Estado.
Porque se tratam de despesas extra que o resto dos cidadãos não têm e que são
indispensáveis para que estas pessoas vivam e trabalhem. O orçamento para este
apoio era de 12 milhões de euros anuais. Em PPP's e BPN's são menos do que
trocos. E correspondem a 40 António Borges por ano.
Como se não
bastasse a ridicularia, o Estado decidiu cortar 30% nesta despesa. Para 8
milhões. Tem uma desculpa: a execução do ano passado foi baixa. Pois foi.
Porque o despacho que a determinou chegou tarde e a más horas. E porque os
deficientes se depararam, de forma sistemática, com desumanas recusas na
atribuição destes apoios. E há verbas que deveriam ter sido transferidas para
os hospitais em 2011 e nem em 2012 lá chegaram. 6 milhões (metade) ficaram na
gaveta apesar de tanta gente precisar deles e ver esse apoio, que lhes é
devido, recusado. Conclusão: se o Estado consegue deixar estes cidadãos sem
apoio, mais vale tirar isso do Orçamento.
Quando José
Sócrates estava no governo decidiu cortar nos benifícios fiscais dados aos
deficientes. Benefícios fiscais mais do que justificados. Porque, repito, para
um deficiente viver com os mesmos direitos que os restantes cidadãos tem de
gastar mais dinheiro. Esses custos acrescidos estão quantificados por um estudo
do CES da Universidade de Coimbra. Variam entre os 4.103€ e 25.307€ anuais,
dependendo do tipo e grau de incapacidade. Mais do que os rendimentos de muitos
destes cidadãos.
Na altura, escrevi
sobre o assunto, tendo apoiado a oposição - toda ela -, que se revoltou com
esta medida. O PSD apresentou mesmo uma proposta de alteração ao orçamento de
2009 para repor esses beneficios. Chegado ao poder, esqueceu-se da sua
indignação e deixou tudo como estava. Garantido o voto, tudo pode continuar
como antes.
Para se
manifestarem contra o pornográfico corte que foi feito no ridículo orçamento
para apoio aos deficientes e exigir que a maioria que suporta este governo seja
coerente com o que defendeu quando estava na oposição, centenas de deficientes
estão em frente à Assembleia da República. Mantive contacto com alguns
organizadores e sou testemunha do enorme esforço logístico e humano que este
combate lhes exige. Mas, sendo gente habituada a lutar pelos mais básicos dos
direitos, não desistem e só de lá sairão quando o governo tiver a decência de
voltar atrás neste crime. Ainda não tinham chegado a São Bento e já estavam a
vencer. O Instituto Nacional para a Reabilitação anunciava o reforço da verba
em cerca de 1 milhão de euros. Faltam os outros três milhões e os benefícios
fiscais que lhes foram retirados pelo governo anterior. Que resistam. E que
tenham de todos os cidadãos a solidariedade e apoio ativo que merecem.
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