Anabela Natário - Expresso
O homem acusado de
perseguir aos insultos o ministro Miguel Relvas é um jornalista que anda pelos
Açores a pé, num projeto que já fez no continente, e nega toda a história
contada ontem, segundo a versão policial.
O
"homem", assim referido, sem identificação, que ontem foi detido na
cidade da Horta acusado de "ter agredido um agente da segurança de Miguel
Relvas" quando tentava chegar junto do quarto do ministro é o jornalista
Nuno Ferreira que disse ao Expresso tratar-se de uma história forjada mas que o
vai obrigar ir à tarde a tribunal.
Nuno Ferreira,
autor do livro "Portugal a Pé" e que ontem não teve
oportunidade de contar a sua versão, negou hoje ao Expresso ter qualquer
intuito de perseguir o ministro Miguel Relvas ou ter agredido quem quer que
seja, nem tão pouco se deslocou à Horta com outro propósito senão o de
prosseguir, na ilha do Faial, o seu projeto "Açores a Pé Pelas Nove Ilhas".
O jornalista, que
durante uma série de anos integrou a redação do "Público" e hoje é freelance,
também nega ter, "em diversas ocasiões, insultado e ameaçado o próprio
ministro dos Assuntos Parlamentares num hotel da cidade da Horta", como
sugeriam as primeiras notícias sobre a sua detenção.
Aterrou na Horta na
segunda-feira
"Atravessei a
Graciosa e o Pico todo a pé, fiz entrevistas, fui lá acima ao Pico, a fazer os
'Açores a Pé', projeto sucedâneo do continente a pé. Estava no Pico, quando
senti imensas saudades de casa e decidi interromper", conta Nuno Ferreira
acrescentando que assim o fez: regressou a Lisboa no dia 27 de outubro, esteve
uma semana com a família e voltou à Horta na passada segunda-feira. E não tem
data marcada para o regresso.
"Quando chego
a uma ilha quero ficar os primeiros dias num hotel. Aliás, eu já tinha estado
aqui, no Faial Resort Hotel, mas agora, na volta, vi no [site de reservas de
hotéis] Booking, que a dormida no Hotel do Canal era mais barata cinco euros no
e marquei três noites." Hoje, quarta-feira, é a última.
A história que leva
à detenção do "homem que tentou entrar no quarto de Relvas", segundo
Nuno Ferreira, começou à hora de almoço de terça-feira, no restaurante do Hotel
do Canal, onde se encontra instalado desde dia 5, segunda-feira.
Um final de almoço
agitado
"Já tinha
saído do Hotel do Canal quando resolvi voltar para almoçar. Só sentado é que
reparei numa mesa de deputados do PSD Açores, entre eles Berta Cabral e o
vice-presidente da Câmara de Ponta Delgada. Nem vi logo, estou muito desligado
da política, porque estou muito desagrado com isto tudo", explicou.
Nuno Ferreira conta
que, só quase no fim da refeição, viu o ministro Miguel Relvas levantar-se rumo
ao hall de entrada do hotel. Aí, sim, levantou-se e dirigiu-se ao governante
para lhe dizer: "Você não tem vergonha na cara de andar por ai depois de
tudo o que tem feito?"
Então, prossegue o
jornalista, ficam todos "muito alvoraçados", o ministro vira-lhe as
costas e, seguindo o seu caminho, diz: "Não te conheço de lado
nenhum". "Entretanto, aparecem os seguranças e eu digo: calma que não
quero bater em ninguém." Nuno Ferreira afirma que um dos seguranças age
logo de uma forma agressiva que o leva a perguntar-lhe se lhe queria bater, ao
que este terá respondido que se fosse preciso batia.
"E volto para
mesa, sentei-me e continuei a almoçar calmamente. A chefe de mesa até veio
falar comigo, aborrecida, que eu devia ter falado lá fora porque era mau para o
hotel. Disse até que me compreendia, que andamos todos muito revoltados, mas
pediu-me para não fazer nada ali dentro, mas lá fora. E eu pedi-lhe
desculpa", completou Nuno Ferreira.
Nessa altura, o
jornalista, que escolheu fazer os projetos do país a pé desde que ficou sem o
seu emprego no "Público", pensou: "Já que virou as costas, vou
fazer uma brincadeira". Foi comprar uma cartolina, nela escreveu
"Bem-vindo excelentíssimo sr. dr. Miguel Relvas, Angola gosta do senhor
doutor", e postou-se no passeio fronteiro à Assembleia Legislativa, onde o
ministro assistia à cerimónia de tomada de posse do novo Governo Regional dos
Açores.
Protesto pacífico
Nuno Ferreira diz
que esteve calmamente com o cartão na mão, sempre no passeio contrário e que
apenas o elevou quando Miguel Relvas abandonou de carro o Parlament, aliás um
graduado da polícia da Horta aproximou-se e inquiriu sobre as suas intenções,
ao ver o cartaz e ouvindo que o portador não tencionava nada mais do que estar
ali pacificamente, afastou-se dizendo-lhe que estava "no seu
direito".
"Depois,
pensei: acabou. Atirei com o cartaz para o lixo ao pé da Assembleia e fui ao
Peters. Estava cheio de deputados do PS, inclusive o ex-presidente [do Governo
regional] Carlos César, e de jornalistas. Estive sossegado a beber uma cerveja
e decidi voltar para o quarto do hotel, ao fim da tarde", contou, dizendo
que aí começou a segunda parte desta história que hoje será exposta a um juiz
do Faial.
"Para chegar
ao meu quarto, quando saio do elevador, tenho de percorrer o grande corredor.
Ao chegar, ao fim, viro para o meu quarto e tenho três indivíduos à espera.
Perguntam-me o que é que eu quero. Um deles era o segurança agressivo da hora
de almoço. Ao vê-lo, só disse: Eu só quero é que este senhor não me bata."
E o jornalista
acabou agredido
Nesse momento, Nuno
Ferreira tem dificuldade de contar exatamente o que se passou, porque, afirma,
o segurança saltou-lhe para cima, atirou-se-lhe ao pescoço e algemou-o,
tratando "como um animal", arrastando-o para o elevador de onde o
levaram para uma carrinha para o conduzir à esquadra.
Na esquadra,
mantiveram-no algemado durante "bastante tempo", tiveram "apenas
como preocupação" tirar-lhe "tudo dos bolsos", inclusive o
telemóvel, colocando-o numa cela, "incomunicável". Segundo conta,
nunca lhe apresentaram qualquer auto, somente "um polícia" lhe disse
que "estava acusado de injúrias ao ministro", e um outro que ele,
Nuno, tinha tentado dar-lhe uma cotovelada no hotel.
"Você está
mentir, eu não dei nada, e o polícia, que eu não vi lá na altura, não era
nenhum dos três, respondeu-me: eu disse que você tentou dar não disse que você
deu", precisou o jornalista.
Pelas 22h30, Nuno
Ferreira foi libertado. "Eu que era uma pessoa tão perigosa, deixaram-me
ir sozinho para o quarto. Passei pelo segurança, que era outro, na porta do
quarto do ministro, fui calmamente para o quarto. Neste momento estou no quarto
e nem faço ideia onde está o ministro nem quero cruzar-me com ele",
desabafou Nuno Ferreira.
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