domingo, 27 de janeiro de 2013

O PODER NA RUA




Diário de Notícias, editorial

Ao fim de alguns meses de acalmia nos protestos, os professores voltaram ontem de novo à rua. A manifestação, mesmo tendo, segundo números da organização, reunido 40 mil pessoas, está longe das demonstrações do tempo de José Sócrates.

Além das emboscadas sistemáticas dos sindicalistas do sector aos governantes, mais de cem mil profissionais ligados ao ensino contestaram na rua a ministra Maria de Lurdes Rodrigues, levando à sua remodelação. Mário Nogueira, o líder da Fenprof, justificou os tempos de bonança recentes com "o medo" de toda uma classe e não qualquer concordância com as linhas políticas atuais.

Apesar das graves medidas de austeridade, os portugueses têm de facto mostrado alguma resignação. As manifestações sindicais foram pacíficas e os incidentes registados terão sido provocados por radicais infiltrados. Mas o equilíbrio social em crise está sempre no fio da navalha. Por isso o atual Governo sempre mostrou preocupação com possíveis focos de revolta social, reforçando seguranças e garantindo orçamentos às polícias.

Os professores podem ser de novo o aríete que agitará a governação e rebocará novos protestos em várias áreas. O relatório do FMI que aponta para o corte de 200 mil funcionários públicos considera os professores um grupo "relativamente privilegiado" e sugere cortes substanciais, quer em número quer em salários, além de propor o aumento do horário para 40 horas. Há aqui questões factuais em que importa refletir para melhorar o ensino nacional. Mas há também questões puramente contabilísticas, que nunca podem ser prioritárias numa reforma como a que está em curso.

Perdido o "medo" de que fala Mário Nogueira, a rua deve voltar a agitar-se quando, no final do mês que vem, o Governo revelar onde vai cortar os quatro mil milhões prometidos à troika. Uma rutura social está longe de estar afastada. Vítor Gaspar, na euforia do regresso aos mercados, não o pode esquecer.

Egito: Sinais contraditórios

Dois anos depois do início da revolta que derrubou Mubarak e um ano após o massacre de 74 jovens apoiantes do Al-Ahly em Port Said, o Egito continua a enviar sinais contraditórios para o mundo. Por um lado, julga com severidade 21 dos acusados pela tragédia; por outro, deixa de lado as chefias militares e os funcionários do Ministério do Interior que muitos consideram responsáveis (ou no mínimo, cúmplices) de um ato de vingança organizado contra uma claque conhecida pelo apoio ativo à luta contra a ditadura e o poder militar de transição que se lhe seguiu. Por um lado consegue, em pouco tempo, organizar eleições presidenciais e legislativas e aprovar uma nova Constituição; por outro, todo esse processo só serviu para deixar o poder nas mãos dos islamitas, que tendo feito um esforço para mostrar uma moderação inédita, em questões fundamentais não fogem à sua verdadeira essência.

Perante os confrontos que não cessam e as dezenas de mortos que, todas as semanas, deixam nas ruas, a oposição laica lançou um desafio: ou o Presidente propõe uma "solução global" para a crise, incluindo um "Governo de salvação nacional", ou boicotará as legislativas na primavera.

Dois anos depois, o Egito ainda não encontrou o seu rumo e os egípcios que lutam pela democracia plena ainda não podem descansar.

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