Deutsche Welle
Começou este sábado
(25.05) o recenseamento eleitoral para as eleições autárquicas e gerais de 2013
e 2014, respetivamente. A seis meses do primeiro escrutínio já se notam
irregularidades, diz analista moçambicano.
A ameaça de boicote
e impedimento das eleições por parte da RENAMO, o maior partido da oposição, ou
a composição da Comissão Nacional de Eleições (CNE) têm agitado a política e
sociedade moçambicana, particularmente nas últimas semanas.
O anúncio repentino
da criação de novos 10 municípios, a pouco mais de uma semana do início do
recenseamento eleitoral, veio colocar mais lenha na fogueira. A esse respeito,
a DW África entrevistou Silvério Ronguane, analista político e docente
universitário moçambicano.
DW África: Será
viável o registo eleitoral nestes lugares?
Silvério Ronguane
(SR): O registo não é um problema grave. É, antes, um problema em termos
políticos, pois os partidos sem assento parlamentar, os grupos de cidadãos,
foram apanhados de surpresa.
Parece-me que há
aqui uma injustiça à partida, porque o partido no poder, que domina a agenda
política, provavelmente já tinha a informação. Sabia que havia mais dez
municípios e foi fazendo a sua preparação. Ao contrário, grupos de cidadãos,
partidos políticos sem assento parlamentar ou mesmo da oposição não sabiam.
Portanto, esses só começam agora a sua preparação. Partem em desvantagem.
Não há uma
igualdade à partida. E não havendo igualdade à partida é evidente que também
não haverá igualdade à chegada.
DW África: Já é
conhecida a composição da CNE. Para si, esta composição é justa?
SR: É
tremendamente injusta, pois os membros da sociedade civil estão todos próximos
do partido no poder, de uma ou outra maneira. Todos aqueles candidatos que não
estivessem próximos foram excluídos. Isso significa, na prática, que, dos 11
membros possíveis na CNE, só 1 é que não está direta ou indiretamente ligado ao
partido no poder. Trata-se do representante do MDM, uma vez que a RENAMO não
apresentou os seus dois.
Um [dos membros]
vem da magistratura, mas quem nomeia o Procurador é o Presidente da República,
que pertence ao partido FRELIMO [no poder]. A mesma coisa também na
magistratura judicial. Quem nomeia o presidente do Tribunal Supremo é o
Presidente da República. Portanto, não há, desses dois, nenhuma hipótese de
isenção e imparcialidade. Quando alguém é jogador e árbitro ao mesmo tempo
afigura-se um jogo injusto.
É verdade que houve
avanços, na medida em que o Sheik Abdul Carimo [eleito recentemente presidente
da CNE], em relação ao professor Leopoldo da Costa, é uma pessoa mais ajuizada,
que tem uma história de participação no processo político, conhece os atores e
tem pautado a sua vida por um certo equilíbrio.
DW África: Esta
nomeação é uma tentativa de aproximação aos muçulmanos, que se têm mostrado
muito descontentes com o Governo? O que significa?
SR: Penso que
é uma questão de equidade religiosa. Porque repare, o primeiro presidente da
CNE, o professor doutor Brazão Mazula, é um ex-padre católico. O seguinte, o
doutor Jamisse Taímo, é protestante. Neste momento, penso que tem muito sentido
que seja integrado alguém das confissões muçulmanas para reafirmar que
Moçambique não é apenas um país cristão, é também um país muçulmano.
DW África: Até que
ponto as ameaças de boicote feitas pela RENAMO podem colocar em perigo as
eleições?
SR: Eu acho
que não colocam só em perigo, mas também podem trazer uma certa justeza nas
eleições. Com uma CNE em que só um de 11 componentes não está ligado ao partido
no poder, parece-me que qualquer um que quer ganhar as eleições percebe que não
poderá ganhar. Os partidos não têm a ilusão de ganhar as eleições. Participam
apenas para conquistar alguns lugares, continuar a ser uma voz ativa na
sociedade.
Mas para as
eleições serem ganhas, é fundamental a existência de uma CNE equilibrada, que
nós não temos. É fundamental a existência de um secretariado técnico (STAE),
equilibrado, que também não temos.
Penso que a RENAMO
tem toda a razão e legitimidade. A minha esperança é que, com a sua perseverança,
se possa trazer algum equilíbrio para que, de facto, tenhamos eleições que
possam permitir a alternância democrática, e não visem apenas legitimar como
democratas os atuais governantes.
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