Mário Augusto
Jakobskind – Direto da Redação
Muito importante o
Brasil ter uma presidenta atenta à voz rouca das ruas e dialogar com
representantes dos movimentos sociais. Faz parte do jogo democrático, mas só
que Dilma Rousseff já poderia ter feito isso desde o início do governo. Não foi
o que aconteceu, segundo admitem as lideranças.
Mas tudo bem, antes
tarde do que nunca. Para começar a decodificar a voz das ruas urge que o
governo federal se empenhe no sentido de pressionar os executivos estaduais e
municipais a abrirem as contas das empresas que exploram os serviços de
transporte coletivo.
Essas mesmas
empresas tinham recebido isenção fiscal por parte do governo Dilma Rousseff e
ainda por cima os prefeitos e governadores aumentaram o preço das passagens,
que acabaram reduzindo, mas sem informar por quanto tempo e se as empresas
serão subvencionadas pelo Estado para cobrir a redução.
No Rio de Janeiro,
empresários do setor de transportes coletivos financiam campanhas de
candidatos, que ao serem eleitos retribuem os favores concedidos. Conhecedores
do setor acusam prefeitos e governadores, não só os atuais, como anteriores, de
nomearem secretários de transportes indicados pelos empresários dos
transportes. Promiscuidade total.
A voz rouca das
ruas está dando outros recados. Da indecorosa privatização do Maracanã ao
sucateamento dos hospitais, isso em todo o país, passando pela repressão
indiscriminada em determinadas áreas.
Violência rotineira
- Sobre este último item, o povo das áreas carentes do Rio há tempos
conhece a truculência da PM, sob total silêncio da mídia de mercado. Agora, ao
reprimir as legítimas e pacíficas manifestações dos jovens, os batalhões de
choque cumprem a voz de comando, leia-se Sergio Cabral. A classe média sentiu
de perto a truculência rotineira nas áreas carentes, prática habitual do tempo
da ditadura.
Marginais e agentes
provocadores do gênero pitbul não fizeram parte das manifestações. Pegaram
carona, no caso dos agentes provocadores, para disseminar o pânico e mesmo
agredir militantes de partidos. Há denúncias até de que além de estimulados,
alguns receberam ajuda de custo para fazer o que fizeram.
Em Brasília foi
claríssima a ação de agentes provocadores no prédio do Itamaraty e na Catedral.
Manifestante na acepção da palavra não faz isso. Há indícios de incitamento por
parte de grupos extremistas descontentes com as denúncias que a Comissão da
Verdade vem divulgando e a discussão sobre a revisão da lei da anistia. É gente
que tem culpa no cartório e teme a verdade.
Quanto à
marginalidade no Rio, a Polícia Militar não estava presente durante a ação do setor,
tanto que as depredações ocorreram sem obstáculos sob o olhar, muitas vezes
exclusivo, das câmeras da Globo.
A Rede Globo, por
sinal, entrou de sola nas manifestações. Com a soberbia de sempre, tentou
pautar os acontecimentos. Aproveitou ao máximo as imagens dos quebra-quebras
para disseminar o temor e mesmo o pânico a quem não esteve nas manifestações
dos jovens, na prática tentando convencer a opinião pública que o melhor para o
país deve ser o que a mídia de mercado sempre defendeu, ou seja, a paz dos
cemitérios.
Depois de
criminalizar o movimento dos jovens, prática rotineira contra os movimentos
sociais, a mídia de mercado teve de mudar de enfoque na cobertura diante do
crescimento dos protestos e da ação truculenta da PM contra jornalistas. Mesmo
assim, os meios de comunicação de mercado priorizaram os quebra-quebras
relegando as manifestações propriamente ditas a segundo plano. Ou seja, na
batalha da opinião pública o papel da mídia de mercado foi o de sempre.
Voz de comando -
Não adianta apenas falar sobre o despreparo policial, pois os soldados e
oficiais obedecem a voz do comando de Sergio Cabral, um governador que não está
a altura da importância do mandato, como comprova até a afirmação do mentiroso
Secretário de Segurança, Mariano Beltrame, ao admitir que a PM perdeu o
controle da situação, não descartando inclusive a possiblidade de convocação do
Exército em próximas manifestações. A PM não perdeu o controle, ela
simplesmente deixou correr em certos momentos. Só reprimiu indiscriminadamente
e covardemente os verdadeiros manifestantes. Beltrame estava numa sala
informatizada da Secretaria de Segurança acompanhando a movimentação na cidade.
Dava ordens para reprimir e agora posa de bonzinho. Os covardes não assumem o
que fazem em matéria de truculência.
Outro recado que a
Presidenta deve considerar: a representação popular não pode estar sujeita aos
lobies empresariais, muito menos a campanhas milionárias financiadas por grupos
econômicos que vão cobrar a fatura depois das eleições.
Reforma política
para valer - A reforma política que se faz necessária para aprimorar a
democracia precisa levar isso em conta. Presidenta, por que não baixar um
decreto, ou encaminhar ao Congresso, projeto impedindo que empresas
financiadoras de campanhas eleitorais sejam impedidas de realizar obras
públicas?
Para tudo isso
acontecer é necessário que o povo seja informado de forma plural e não ficar
sujeito ao esquema do pensamento único a serviço de interesses econômicos dos
mais variados matizes. Dilma Rousseff, ouça a voz dos que pedem a
democratização dos meios de comunicação e não ceda às pressões da mídia de
mercado.
*É correspondente no
Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da
Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o
Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros,
de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
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