domingo, 6 de outubro de 2013

Portugal - Passos: AUSTERIDADE NÃO É SADISMO

 

Liliana Valente – Jornal i
 
Primeiro-ministro diz que austeridade é para manter "por muito tempo" e que as condições para o fecho do resgate estão quase garantidas
 
O primeiro-ministro reabriu ontem os debates quinzenais no parlamento carregado com um cheque de 5,5 mil milhões de euros depois do encerramento das duas avaliações da troika; da manutenção da austeridade sobre os portugueses e das linhas gerais do discurso que vai delinear até às próximas legislativas. Passos Coelho, versão 2013-2015, acomoda-se ao cumprimento do programa de austeridade e cola-se às palavras do Presidente da República para lembrar a alegada irresponsabilidade daqueles (sobretudo António José Seguro) que dizem que a dívida pública não é pagável. Em síntese: o líder do PS diz que Passos anda "aos abraços e aos beijinhos com a troika" e Passos nega "sadismo" do governo.
 
O fim deste ano é para o primeiro- -ministro "o momento da verdade". Aquele em que os agentes políticos e também as "instituições portuguesas" têm de perceber como histórico, e como tal têm de fazer escolhas para futuro. A dele está feita: a austeridade - em 2014 na versão manutenção da sobretaxa de IRS, contribuição solidária dos pensionistas e mais cortes na despesa - é para continuar "durante muito tempo se Portugal se quiser manter no euro" e a dívida é para pagar e é pagável. Para já, nem a possibilidade de segundo resgate é afastada por completo. No debate, Passos diz que o país tem as condições para fechar o resgate "praticamente" asseguradas, mas, repetiu mais tarde, "não é garantido, não há absoluta garantia disso" [fim do programa].
 
No regresso ao parlamento e ao frente-a-frente com a oposição, Passos tem já um tubo de ensaio daquilo que pode ser o discurso para a campanha eleitoral às legislativas. Para o primeiro-ministro, o objectivo é aparecer em 2015 como o governante que foi responsável e fechou o programa de ajustamento ao cumprir com o acordado com a troika. E foi por isso que ontem apontou baterias ao discurso dos socialistas.
 
No início do debate, Passos, dramatizando o actual momento, disse que era necessário "separar com clareza aqueles que querem ajudar o país - não o governo - a sair desta situação difícil e aqueles que entendem que o país não deve cumprir os seus compromissos e importar um custo excessivo". Falava directamente para António José Seguro e repetiu a ideia mais três vezes.
 
Para a argumentação teve um aliado de peso. Passos apoiou-se nas palavras do Presidente da República para acusar todos aqueles que dizem que a dívida portuguesa é insustentável. "Não há nenhum sadismo. O governo não entende que a dívida seja impagável ou insustentável". E acusou Seguro quando "numa fase de maior volatilidade", em que Portugal estava a preparar o regresso ao mercado, "veio dizer que não temos uma dívida que possa ser sustentada sem a ajuda do exterior". Passos não falou em diálogo nem em consenso, mas de modo indirecto falou na necessidade de compromissos para o futuro.
 
O primeiro-ministro - que nunca falou das eleições autárquicas - ia preparado para fazer frente a um António José Seguro apoiado numa vitória eleitoral no domingo. Mas nem Seguro lembrou as autárquicas. O secretário-geral do PS preferiu confrontar o líder do governo com o facto de este ter admitido a possibilidade de um segundo resgate. E deixou a garantia de que "o PS tudo fará para evitar um segundo programa de ajuda externa" quando o primeiro-ministro o confrontou com a atitude dos socialistas. Passos pediu-lhe que explicasse como era possível o PS ter-se comprometido com a Lei de Enquadramento Orçamental e com o Tratado Orçamental e não defender as medidas necessárias para os cumprir. E entre as medidas que estão em cima da mesa, Seguro garantiu ontem que o PS votará contra a convergência dos regimes de pensões da Caixa Geral de Aposentações e da Segurança Social. Mais que isso, o líder do PS garante que vai pedir a fiscalização ao Tribunal Constitucional e quando for governo vai revogar a mesma lei.
 
Do lado da restante oposição, Jerónimo de Sousa, líder do PCP, preferiu pegar nas palavras do Presidente da República para defender a renegociação da dívida: "Só por masoquismo se pode considerar sustentável uma dívida desta natureza." Já Catarina Martins, co-líder do BE, começou por acusar o governo de estar a trocar a "austeridade" pela "compressão", em jeito de crítica a Paulo Portas. No final perguntou ao primeiro-ministro se confirmava que o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, tinha pedido "desculpas diplomáticas" a Angola por investigações criminais de Portugal a empresários. Passos não respondeu.
 
Foto: Rodrigo Cabrita
 

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