Mário Silva – Expresso das Ilhas (cv), opinião
Tem setenta anos.
Passou a vida a trabalhar. Era pescador. Na Ribeira da Barca, pescou de tudo um
pouco. Inclusive, o presente. Sobreviveu. Nunca conseguiu pescar o futuro.
Nunca! E não sabe o porquê. Vai morrer sem saber onde mora o futuro. Destino
traçado.
Teve seis filhos,
com três mulheres diferentes. Poucos, para a sua geração. Os filhos cresceram.
Queria que estudassem. Mas o peixe não foi suficiente para tanto. Sabia que o
peixe ia acabar. Um dia. Como acabou. Mais cedo do que pensava.
Chegou a hora de fazer
o balanço da sua geração. Suas vidas. E concluiu: foram para o mar; fizeram
filhos; jogaram cartas; beberam grogue. Foi assim. Nas noites e nas tardes da
Ribeira da Barca. E de Rincão. Há cem. Trinta. Vinte anos. Desde o «tempo
Português». Passando pelo «tempo do partido único». E, agora, no «tempo da
democracia». Para eles nada muda. Salvo a idade.
Quando o céu está
limpo, desabafam. Falam com o Vulcão do Fogo. Aí à sua frente. Tão perto! Às
vezes, dá vontade de cair no mar. Nadar. Ir abraçá-lo. Mas o vulcão não resolve
o problema dos outros. O que pode fazer, e fá-lo sempre com prazer, é oferecer
a sua presença amiga.
Há uns anos
insistiu com os filhos. Para partirem. Não para o estrangeiro, claro está! Mas
para a Boa Vista. Ilha Prometida. Os pescadores de Santa Cruz entenderam isso.
Desde muito cedo, partiram. Hoje, são a maioria na Boa Vista. Tiveram boa vista.
Ainda não pescaram o futuro. Mas sabem onde fica. Já não é mau. Pode ser que um
dia o pesquem! Pode ser! Pode ser!
- Por que será, Joa
Quim, que para muitos, a vida não melhora? Governo vai. Governo vem. Ora do
centro; ora de esquerda; ora não se sabe muito bem de que lado. Se não souberes
responder-me, pergunta a quem sabe. Ou ninguém sabe?
Sem comentários:
Enviar um comentário