NUNO RIBEIRO - Público
Obiang
falou da “promoção dos princípios democráticos”, omitiu a pena de morte e
Portugal obrigou a uma referência explícita ao fim da pena capital. Protocolo
timorense deu protagonismo ao homem que governa Malabo há 35 anos e causou
enfado ao Presidente da República.
O
Presidente da República comparou esta quarta-feira a situação da Guiné
Equatorial com a do Coreia do Norte. Cavaco Silva falava em conferência de
imprensa após a X Cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)
ter admitido o país de Teodoro Obiang como Estado-membro da organização.
“A
lógica isolacionista de um Estado nunca conduziu ao aprofundamento da
democracia nem à melhoria do respeito pelos direitos humanos, e por isso penso
que o acolhimento da Guiné Equatorial, depois de a CPLP em várias missões de
observação ter reportado avanços na aplicação do roteiro de adesão, é a melhor
forma de contribuir por parte de todos os Estados-membros para a melhoria do
respeito pelos direitos humanos naquele país e para a constituição de instituições
verdadeiramente democráticas”, disse o Presidente da República. Uma situação
que, depois, Cavaco comparou ao exemplo da Coreia do Norte onde, salientou, “o
isolacionismo nunca conduziu à democracia e ao respeito pelos direitos
humanos”.
Perante
os jornalistas, o Presidente destacou “que o contributo de Portugal foi
decisivo para os avanços registados na implementação do roteiro de adesão, como
é o caso da moratória da pena de morte”, com a qual o regime de Malabo se
comprometeu a 4 de Março no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra. No entanto,
foi por pressão da delegação portuguesa que foi introduzida uma referência
explícita ao objectivo de abolição da pena de morte na Guiné Equatorial.
O
sexto ponto da proposta da Declaração de Díli apenas se referia à moratória,
mas na redacção final aparece a meta do fim da pena capital. Assim, entre as
condições que levaram ao alargamento da CPLP à Guiné Equatorial é expressamente
referida “a adopção da moratória da pena de morte até à sua abolição.”
Na
sua intervenção depois do almoço desta quarta-feira, o Presidente da República
já alertara para a necessidade de preservar o acervo de valores nos quais se
baseia a CPLP. “O potencial de atracção da nossa comunidade e o reconhecimento
internacional da CPLP assenta no conjunto de valores identitários que
partilhamos, como são a língua portuguesa, os princípios fundadores da defesa
da Paz, do Estado de Direito democrático, dos Direitos Humanos e do
desenvolvimento económico-social”, disse Cavaco Silva.
Destacou
ainda a importância destes princípios para o futuro da CPLP, no momento do
primeiro alargamento e numa altura de mudança da organização, com a ênfase na
dimensão económica. “É por isso fundamental que continuemos a deixar claro, no
presente e no futuro, que são esses valores que determinarão as nossas decisões
e iniciativas”, salientou. Foi um regresso, propositado, aos princípios
fundadores da CPLP.
Uma
situação que obrigou Teodoro Obiang a afirmar a sua sintonia com aqueles
valores, numa intervenção perante os chefes de Estado e de Governo. Não por
iniciativa própria, mas determinada por nova pressão de Portugal. Cavaco Silva
sugeriu ao anfitrião, o Presidente de Timor-Leste, Taur Matan Ruak, que
solicitasse a Obiang uma intervenção sobre o cumprimento do roteiro de adesão
imposto na cimeira de Luanda de 2010. Um roteiro no qual o respeito dos
Direitos Humanos, incluindo o fim da pena capital, a democratização do regime e
o português como língua oficial eram vectores chave.
No
seu discurso em português, o homem que dirige há 35 anos a Guiné Equatorial
afirmou que a CPLP se inspira na contribuição para a humanidade “dos valores
positivos que identificam os seus povos, suas línguas, usos e costumes, artes e
tudo aquilo que nos une para promover relações de entendimento e cooperação, na
promoção dos princípios democráticos, no espírito de amizade e na actual visão
da globalização das políticas.” Assim, na intervenção distribuída à agência
Lusa, é referida, de forma geral, “a promoção dos princípios democráticos”, uma
forma esquiva de abordar o potencial programático do roteiro para a adesão de
2010, que incidia, explicitamente, no cumprimento dos Direitos Humanos, na
democratização do regime e no fim da pena de morte.
Daí
o alerta da Human Rights Watch. “Este é mais um exemplo dos esforços do
Presidente Obiang para obter reconhecimento na cena internacional fazendo promessas
de Direitos Humanos que nunca cumpre”, comentou à Lusa, Lisa Misol,
investigadora da organização. Também a Amnistia Internacional (AI), que tem
denunciado o regime de Malabo, se pronunciou. “Esperamos que a entrada da Guiné
Equatorial na CPLP faça com que o país adopte reformas institucionais no
sentido de uma melhor protecção dos Direitos Humanos”, comentou o porta-voz da
AI.
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