É
tolo insistir em modelo de “desenvolvimento” que devasta natureza e
penaliza especialmente países pobres, sustenta, no Brasil, norueguesa Gro
Brundtland, relatora da ONU
Elenita
Malta – Outras Palavras
A
ex-primeira ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, foi uma das
conferencistas noFronteiras
do Pensamento de 2014, em Porto Alegre , no último dia 29. Gro falou sobre
desenvolvimento sustentável e o maior desafio atual da humanidade: as mudanças
climáticas.
Gro
Harlem Brundtland, médica especializada em saúde pública, foi ministra do meio
ambiente da Noruega e em 1981 tornou-se a primeira mulher a ocupar o cargo
político mais importante de seu país, o de primeira ministra, durante três
mandatos. Entre 1983 e 1987 presidiu a Comissão Brundtland, da ONU, dedicada ao
estudo do meio ambiente e sua relação com o progresso. Dessa comissão
derivou o relatório Nosso futuro
comum, que cunhou o termo “desenvolvimento sustentável”.
Para
a diplomata, o modelo atual de desenvolvimento é insustentável e há riscos de
danos irreversíveis aos sistemas da Terra. Entre os mais importantes e
ameaçados estão os oceanos, cada vez mais quentes e ácidos. Ela mencionou que a tundra siberiana está
derretendo e que têm ocorrido constantes vazamentos de metano no fundo dos
mares. Ao produzirem a maior parte do oxigênio, os oceanos são fundamentais à
vida na Terra, pelo menos se queremos uma vida saudável.
Como
já defendia o ambientalista José Lutzenberger há 40 anos, Gro falou da
insanidade da economia mundial, ao considerar o PIB como medida de
desenvolvimento, e ao não contabilizar o custo da natureza destruída. Para ela,
é necessário medir o custo do ambiente – os custos ecológicos e humanos da
produção industrial. Assim, poderia haver um uso mais criterioso dos elementos
naturais, que, no modelo econômico atual, não passam de recursos, matérias
primas à disposição gratuitamente. Gro defendeu também a taxação das emissões
de carbono como uma das principais medidas para conter as mudanças climáticas:
“as emissões não podem ser gratuitas; quem quiser poluir, deve pagar”.
Um
dos pontos mais enfatizados foi a necessidade do corte dos subsídios aos
combustíveis fósseis. Segundo Gro, o mundo gasta anualmente 500 bilhões de
dólares por ano para subsidiar carvão e petróleo, um enorme recurso que poderia
ser destinado à pesquisa e produção de energia renovável. Sinal de esperança
nessa área é a China, que vem reduzindo sua dependência dos combustíveis
fósseis e tem investido pesado em energias alternativas. Esse movimento deve
ser seguido, pois Gro estima que o petróleo acabe em 50-60 anos.
A
norueguesa lembrou dos anos 1990, quando a crise ambiental foi tema em
evidência num contexto mais favorável. Com a queda do muro de Berlim e às
vésperas da Cúpula da Terra (Rio-92), tudo parecia possível. Passada a euforia,
contudo, a sequência de conferências globais gerou muita discussão e poucas
medidas efetivas. Por exemplo, o Protocolo de Kioto: “teria ajudado muito se
todos os países tivessem assinado”. O problema é que muitos governantes ainda
pensam numa base nacional, e hoje, mais do que nunca, precisamos pensar e agir
em termos globais. Além disso, qualquer acordo será ilusório se os Estados
Unidos e os emergentes BRICS não assinarem. É preciso uma redução global de
CO2, pois o cenário climático, alertam os cientistas, não prevê mais o aumento
de “apenas” 2 graus na temperatura até o fim deste século, mas sim de
preocupantes 4 graus.
Também
motivo de preocupação é o previsto aumento demográfico global – o planeta vai
abrigar mais de 9 bilhões de pessoas em 2050. Isso vai gerar maior demanda por
alimentos, energia e consumo em
geral. Por outro lado, Gro considera positiva a pressão dos
jovens por um ambiente melhor, pois eles já são as gerações futuras que
herdarão o planeta adoecido. Defendeu ainda a promoção do papel das mulheres
nas sociedades, a exemplo do que vem acontecendo no Brasil, Argentina e Chile,
países com mulheres na presidência.
Para
minimizar as consequências da mudança climática, Gro sugeriu uma modificação na
forma de fazer negócios, a ênfase em políticas públicas e a busca da eficiência
energética, por meio das energias renováveis. Acabar com os subsídios dos
combustíveis fósseis e taxar as emissões de CO2 são medidas de extrema
urgência, sustenta.
Apesar
do quadro preocupante pintado na conferência, Gro mostrou-se confiante na
assinatura de um acordo global no ano que vem, em Paris. “Precisamos defender
progresso para todos ou para ninguém. Ainda estou otimista”, afirmou.
É
preciso questionar que tipo de desenvolvimento é possível e desejável para toda
a humanidade, para além dos termos econômicos. Não podemos defender um
desenvolvimento que destrua a diversidade da vida na Terra, como o capitalismo
tem feito até aqui. Tomara que Gro esteja certa em seu otimismo e que ainda
haja tempo para uma mudança real e significativa. Afinal, toda a vida depende
disso.
Leia
mais em Outras
Palavras
Sem comentários:
Enviar um comentário