Presidente
da República vai seguir a "via-sacra" toda até haver um governo
estável. Se, é claro, houver acordo à esquerda
Cavaco
Silva - que vai chamar os partidos a Belém na próxima terça--feira - só
aceitará indigitar António Costa como primeiro-ministro se Passos Coelho vir o
seu programa de governo chumbado pela Assembleia da República, observou ontem
um elemento da Casa Civil do Presidente da República ouvido pelo DN.
"Não
acredito que o Presidente não faça isso", disse o interlocutor do DN,
confrontado com a possibilidade de Cavaco Silva, após um chumbo no Parlamento
do programa de governo da coligação, se recusar a indigitar o líder do segundo
partido mais votado, ou seja, António Costa, mantendo o atual executivo em
gestão corrente até maio/junho do próximo ano (só para essa altura poderão ser
convocadas novas legislativas).
A
mesma fonte sublinhou o facto de Cavaco Silva manter sempre nestas alturas um
grande secretismo em torno das suas decisões. Contudo, conhecendo o seu
comportamento histórico, recorda que o PR defendeu sempre a necessidade de o
poder político não ativar fatores externos que podem criar situações de desequilíbrio
graves nas contas públicas (por exemplo, alarmes no mercado da dívida pública).
Para
o chefe do Estado, adiantou a referida fonte, apenas contará o que António
Costa procura garantir à esquerda: um governo com apoio estável no Parlamento e
respeito pelos compromissos internacionais de Portugal.
Primeiro,
contudo, deverá seguir o que tem sido o comportamento tradicional de todos os
seus antecessores depois de eleições legislativas: convidar o líder da formação
mais votada - no caso, Pedro Passos Coelho - a formar governo. E deixar que
seja o Parlamento a assumir a responsabilidade de o chumbar, não o desonerando
desse ónus (o que aconteceria se fosse logo diretamente para a nomeação de
Costa).
Um
consultor do Presidente da República para os assuntos económicos, João Borges
de Assunção, assumiu ontem publicamente, numa conferência universitária, não
ver grande dramatismo na formação de um governo apoiado na esquerda
parlamentar. "Não parece ser exatamente igual àquilo que é o primeiro
governo [grego] do Syriza, seria sempre um governo mais moderado do que o
Syriza, mesmo que viesse a ter o apoio de entidades parecidas com o Syriza [BE
e PCP]", disse o economista, citado pela Antena 1. E "a nossa
situação financeira não é tão má como a da Grécia".
Bagão
Félix, conselheiro de Estado, assinalou ao DN que as diferenças nos programas
eleitorais do PSD-CDS e do PS são de pormenor, com exceção da TSU e do
plafonamento das pensões. Mas "à esquerda é ao contrário, pois PS, PCP e
BE não se entendem no essencial - euro, NATO, Tratado Orçamental, até as
nacionalizações - e concordam em coisas acessórias".
"Já
houve vários governos de esquerda em Portugal, porque é que este é diferente?
Porque é a única forma de António Costa passar de perdedor a vencedor" e
até de essa ser "a única maneira de sobreviver no partido",
argumentou.
Reconhecendo
não haver qualquer dúvida de natureza constitucional ou legal caso se forme um
governo de esquerda, Bagão Félix alertou no entanto para o problema de
"legitimidade ético-política" inerente a ser António Costa o primeiro
nome a ser indigitado para primeiro-ministro. "A tradição portuguesa manda
que seja Pedro Passos Coelho" o indigitado e, neste caso, Cavaco "não
tem previsão sobre o que vai acontecer" na AR - onde "não há partidos,
há deputados".
Pré-rutura
Costa-Passos
Outros
conselheiros de Estado ouvidos pelo DN preferiram não se estender em
comentários. Alfredo Bruto da Costa - próximo do PS - disse sentir-se
"completamente incapaz de fazer qualquer previsão".
Já
João Lobo Antunes - conselheiro pelo próprio PR - assumiu apenas ir
"seguindo com enorme preocupação" os acontecimentos.
Ontem
surgiram sinais de que está iminente uma rutura nas negociações entre PS e
coligação. "Talvez seja altura de pôr ponto final no que o país tem vindo
a assistir de forma atónita", disse Passos Coelho, acrescentando já ter
tido "duas reuniões com o PS" e não tencionar "ter mais
nenhuma" para "fazer de conta" que se está a "alcançar
algum resultado" já que o PS não deu contributo nenhum". "Não vamos
virar o resultado das eleições do avesso, não vou governar com o programa do
PS."
Através
de Carlos César, o PS respondeu acusando a coligação de não lhe ter fornecido
informação orçamental e financeira pedida no dia 10 (o PS revelou no seu site a
carta enviada à coligação). "O PSD assumirá as suas responsabilidades se
romper com um diálogo que visa a constituição de um governo estável",
avisou César. O novo Parlamento deverá reunir pela primeira vez no dia 22. Mas
só se os resultados finais das legislativas forem publicados no Diário da
República até dia 19 (inclusive).
João
Pedo Henriques e Manuel Carlos Freire – Diário de Notícias – foto Geraldo
Santos / Global Imagens
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