Clara
Viana e Ana Dias Cordeiro – Público, ontem
Durante
esta quinta-feira chegaram a Lisboa 24 dos 4500 refugiados do Médio Oriente e
de África que Portugal se comprometeu a receber. Não se sabe quando virão mais.
Chegaram
ao aeroporto de Lisboa às 13h35 desta quinta-feira: dez adultos, a maioria de
nacionalidade eritreia. Foram os primeiros dos 4500 refugiados que Portugal se
comprometeu a acolher no âmbito do compromisso assumido pela União Europeia no
final de Setembro. Às 20h, chegaram outros 15, sírios e iraquianos, entre os
quais três crianças - com dez meses, um ano e dez anos, segundo fonte
oficial do Ministério da Administração Interna. A mesma fonte adiantou que
um dos refugiados que estava previsto chegar hoje à noite ao aeroporto de
Lisboa acabou por não embarcar, por não ter comparecido no aeroporto de origem.
Para
além da Eritreia, entre os primeiros 24 refugiados há gente que fugiu da Síria,
Iraque, Sudão e Tunísia. Tanto a ministra da Administração Interna, Constança
Urbano de Sousa, como o ministro-Adjunto, Eduardo Cabrita, que receberam o
primeiro grupo no aeroporto, escusaram-se a indicar novas datas para
acolhimento de mais refugiados.
Os
primeiros chegaram num voo oriundo de Roma. Não se sabe há quanto tempo
esperavam em Itália por um novo porto de abrigo. O mesmo se passa com o grupo
que aterrará esta noite, vindo de Atenas, na Grécia. Aliás quase nada foi
divulgado pelas autoridades portuguesas sobre estes refugiados. “Por uma
questão de respeito pelos direitos humanos e pela privacidade de cidadãos que
provêm de territórios em guerra e que foram vítimas de situações traumáticas”,
justificou Eduardo Cabrita. As mesmas razões foram apontadas para o facto de
nenhum dos refugiados prestar declarações à comunicação social.
“Espero
que este seja para eles o início de uma vida feliz”, disse também o
ministro-adjunto. No grupo que chegou a Portugal ao princípio da tarde desta
quinta-feira, estará um casal da Síria que, por razões de segurança, pediu para
não ser filmado, nem sequer ao longe, pela bateria de câmaras que os aguardavam
no corredor exterior do aeroporto. Foi o que indicou a assessora de imprensa de
Constança Urbano de Sousa.
Já
a ministra, pelas mesmas razões evocadas por Eduardo Cabrita, não revelou quais
as nacionalidades representadas neste primeiro grupo. Disse apenas que a maioria
vem da Eritreia, que são cristãos, jovens e que as mulheres são maioritárias.
As duas últimas características tinham já sido testemunhadas pelos jornalistas,
quando o pequeno grupo emergiu do interior do aeroporto, depois de terem
passado pelo controlo de identificação e de recolherem a pouca bagagem, que
trouxeram consigo. Apenas se distinguiam dos outros passageiros por virem
escoltados por agentes fardados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
A
ministra da Administração Interna lembrou que os que chegaram esta quinta-feira
já foram registados em Itália e na Grécia, nos centros de triagem de Lampedusa,
tendo sido verificado que cumpriam as condições para virem a obter o estatuto
de refugiado em Portugal.
É
um processo que vai agora iniciar-se e durante o qual terão ao apoios sociais
previstos na lei, acrescentou. Entre eles figuram o direito à habitação, o
acesso a cuidados de saúde e a escolas para os filhos. Com a autorização de
residência que lhes virá a ser concedida poderão também ingressar no mercado de
trabalho, mas antes terão de aprender português, informou Constança Urbano de
Sousa.
Eduardo
Cabrita lembrou, por outro lado, que o primeiro-ministro, António Costa, já
manifestou a disponibilidade de Portugal para assumir “responsabilidades
alargadas” neste processo de acolhimento, mas escusou-se a dizer se tal passará
por alargar o número de refugiados que o país se prontificou a receber. “Não
está mais nada definido por agora”, disse.
O
Programa de Relocalização de Refugiados na União Europeia prevê que sejam
acolhidos na UE 160 mil refugiados, que estão agora em centros na Grécia e
Itália. Mas os últimos dados disponibilizados pelo Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados dão conta de que apenas pouco mais de 200 foram já recebidos
noutos países. Segundo o ACNUR, entre Janeiro e Novembro deste ano, chegaram
ilegalmente à UE 1,5 milhões de pessoas, das quais perto de 80% têm condições
para pedir asilo e receber o estatuto de refugiados, Mais de metade
chegaram à Grécia (742 mil) e Itália (159 mil). Oficialmente, 3671 morreram no
Mediterrâneo quando tentavam chegar à Europa.
Entre
as entidades envolvidas no acolhimento em Portugal figuram a Câmara
Municipal de Lisboa, o Conselho Português para os Refugiados, o Alto
Comissariado para as Migrações, a Plataforma de Apoio aos Refugiados, a Cruz
Vermelha Portuguesa, a União das Misericórdias Portuguesas, o Serviço Jesuíta
aos Refugiados e a Fundação Islâmica de Lisboa. No conjunto da operação
participarão 110 municípios, lembrou Eduardo Cabrita.
Dos
que chegaram esta quinta-feira, alguns ficarão em Lisboa e outros são esperados
no Cacém, Torres Vedras, Marinha Grande, Penafiel e Alfeizerão. Estava prevista
também a colaboração de Vinhais, no distrito de Bragança, que no entanto
não conseguiu, para já, reunir as condições para assegurar o acolhimento de
alguns destes primeiros refugiados.
O
futuro em Portugal
Na Santa Casa da Marinha Grande e de Alfeizerão já há alguns meses que se esperava por este momento, mas foi só no início da semana que foram avisadas de que as pessoas que iriam acolher chegavam esta quinta-feira. No primeiro caso, um casal de iraquianos. No segundo, três homens de idades diferentes – que chegam de Itália e da Grécia mas de nacionalidades não mencionadas.
“O
importante agora é procurar integrá-los nesta comunidade agrícola e de pequeno
comércio”, diz Luís Monteiro de Castro, provedor da SCM de Alfeizerão sobre as
expectativas da freguesia que se prepara agora, “um pouco à pressa”, para
acolher e integrar os refugiados, o que dependerá também “muito das
aptidões deles, académicas ou profissionais”, acrescenta.
Nesta
primeira fase, a prioridade será o ensino do português, reitera Luís Monteiro
de Castro. E para isso, os três refugiados que irão viver em Alfeizerão começam
em Janeiro a frequentar aulas de português para estrangeiros na Universidade
Sénior da localidade. Também o casal de iraquianos que vai residir na Marinha
Grande começará em breve a aprender português, diz Joaquim João Pereira,
provedor da SCM da cidade do distrito de Leiria.
As
professoras da Misericórdia vão começar nos próximos dias a prepará-los. A fase
seguinte será definida pela SCM “em colaboração com o Instituto do
Emprego e a Direcção-Geral de Educação”, explica o responsável.
As
duas instituições, entre outras, estão entre as que mostraram disponibilidade
para receber refugiados, quando foram contactadas, a partir de Maio, pela União
das Misericórdias Portuguesas (UMP). A União Europeia iniciou o processo de
acolhimento numa cimeira extraordinária do Conselho Europeu dedicada ao tema no
dia 23 de Abril, depois do naufrágio no Mediterrâneo, de 18 de Abril, em que
800 pessoas perderam a vida.
“O
habitual é afectar [as casas disponíveis] a pessoas necessitadas daqui [da
região] mas esta é uma situação de emergência”, diz Joaquim João
Pereira. O casal iraquiano vai viver desde o primeiro dia num apartamento
da instituição que ficou vago há pouco tempo. “É um T2. Está tudo preparado. A
cozinha tem todo o equipamento necessário. O roupeiro está cheio de roupas para
eles”, diz o provedor.
A
senhora poderá vir a trabalhar num dos lares de idosos da Santa Casa de Leiria.
O marido, pintor da construção civil, será eventualmente integrado numa empresa
de moldes da região, diz Joaquim João Pereira.
O
financiamento da operação será coberto por verbas atribuídas por Bruxelas ao
Estado português, que as distribui depois pelas entidades que estabeleceram
protocolos para o efeito com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, entre elas
a União das Misericórdias Portuguesas.
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