Ana
Alexandra Gonçalves*
François
Hollande prepara-se para deixar o Palácio do Eliseu e numa cimeira organizada
por si e que teve lugar em Versalhes - centro de ostentação da monarquia
francesa - deixou o seu presente de despedida: "ou há uma UE a duas
velocidades ou ela explode". Segundo o ainda Presidente francês, a UE a 27
"já não pode ser uniforme a 27 e a ideia de uma Europa a várias velocidades
suscitou resistência, mas hoje essa ideia impõe-se, senão é a Europa que
explode".
Ora,
onde é que fica o projecto europeu nesta Europa sonhada a duas velocidades?
Onde fica a coesão, ambição maior da Europa? Ou alguém acredita que uma Europa
a duas velocidades cinge-se à vontade de uns irem mais longe em matéria de
defesa, harmonização fiscal, cultura ou juventude, em diferentes graus de
integração? E essa ideia não é precisamente contrária ao propósito da UE?
Com
este presente de despedida, a Europa reconhece a existência da hegemonia de
alguns Estados; a Europa reconhece a visão derrotista que se traduz na
existência de uma vasta maioria de Estados-membros que se subjugam a dois
Estados-membros e o reconhecimento das desigualdades como norma.
É
evidente que a frase de Hollande esconde a sua ambição de se tornar Presidente
do Conselho europeu o que implica lambidelas criteriosamente dadas em certos
traseiros e, por outro lado, exprime a tentativa francesa de recuperar a
hegemonia perdida, talvez com ideias de ressuscitar o velho eixo franco-alemão.
Seja
como for, uma Europa a duas velocidades como ambição é o reconhecimento da
condição periclitante da UE, consolidando a ideia de que esta é uma Europa a
caminho do abismo, mas com um sorriso nos lábios.
Neste
contexto, como é que um Brexit pode causar choque?
Pelo
meio, líderes como António Costa mostram-se favoráveis, mas com condições... o
tal Estado-membro que reconhecidamente anda a uma velocidade mais branda - e
que defende a sua velocidade - quer impor condições. Risível.
*Ana
Alexandra Gonçalves, em Triunfo da Razão
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