Thierry Meyssan*
É com prudência e determinação
que a Federação de Rússia e o Presidente Trump põem definitivamente fim à
dominação do mundo pelos interesses transnacionais.
Convencido que o equilíbrio entre
potências não depende das suas capacidades económicas, mas antes das militares,
o Presidente Putin melhorou, é certo, o nível de vida dos seus concidadãos, mas
desenvolveu o Exército russo antes de procurar enriquecê-los. A 1 de Março, ele
revelava ao mundo as principais armas do seu arsenal e o início do seu programa
de desenvolvimento económico.
Nos dias que se seguiram, a
guerra concentrou-se na Ghuta Oriental. O Chefe do Estado-Maior russo, General
Valeri Guerasimov, telefonou ao seu homólogo dos EUA, o General Joseph Dunford.
Ele frisou-lhe que, em caso de intervenção militar dos EUA, as forças russas
alvejariam os 53 navios dos EU do Mediterrâneo e do Golfo, incluindo os seus
três porta-aviões de propulsão nuclear. Sobretudo, instou-o que informasse o
Presidente Trump sobre as novas capacidades militares do seu país.
No fim, os Estados Unidos não
obstaram a que o Exército Árabe Sírio e alguns soldados de infantaria russos
libertassem a Ghuta dos jiadistas que a ocupavam.
Só o Reino Unido tentou
antecipar-se aos acontecimentos montando o «caso Skripal»: se a ordem mundial
actual se afunda, há que restaurar a retórica da Guerra Fria opondo os gentis
cowboys e os malvados ursos russos.
Em Junho, quando o Exército Árabe
Sírio, apoiado pela Força Aérea russa, se deslocava para o Sul do país, a
Embaixada dos EUA na Jordânia prevenia os jiadistas que, doravante, eles
deveriam defender-se sozinhos, sem ajuda nem apoio do Pentágono e da CIA.
A 16 de Julho, em Helsínquia, os
Presidentes Putin e Trump iam ainda muito mais longe. Abordaram a reconstrução,
quer dizer, os danos da guerra. Donald Trump, escrevê-mo-lo aqui
frequentemente, desde há dois anos, opõe-se à ideologia puritana, ao
capitalismo financeiro e ao imperialismo que daí decorre. Ele acredita,
justamente, que o seu país não deve suportar as consequências dos crimes dos
seus predecessores, das quais o seu povo tem também sido vítima. Ele afirma que
estes crimes foram cometidos por instigação, e em proveito, de elites financeiras
transnacionais. Considera, portanto, que deverão ser elas a pagar, mesmo que
ninguém saiba exactamente como as obrigar a tal.
Os dois Presidentes acordaram
igualmente em facilitar o regresso dos refugiados. Ao fazê-lo, Donald Trump
reverteu a retórica do seu predecessor segundo a qual eles fugiam à «repressão
da ditadura» e não à invasão dos jiadistas.
Enquanto no Sul do país, os
jiadistas fugiam, por sua vez, diante das forças sírias e russas --- e algumas
unidades desesperadas do Daesh(E.I.) cometiam atrocidades inimagináveis--- o
Ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, e o Chefe do
Estado-maior russo, Valeri Guerassimov, empreendiam uma tournée (turnê-br)
europeia e médio-oriental.
Eles foram recebidos na União
Europeia o mais discretamente possível. De facto, segundo o discurso ocidental,
o General Guerasimov é um conquistador que invadiu e anexou a Crimeia. Ele
está, portanto, interdito de entrar na União, defensora auto-proclamada do
«estado de direito». Infelizmente, como já era demasiado tarde para retirar o
seu nome da lista de sanções, a União decidiu fechar os olhos aos seus grandes
princípios e deixar, excepcionalmente, entrar o herói da reunificação da
Crimeia e da Rússia. A vergonha que atinge os dirigentes europeus-ocidentais,
face à sua hipocrisia, explica a ausência de fotografias oficiais das
audiências concedidas à delegação russa.
A cada um de seus interlocutores,
a delegação russa resumiu algumas das decisões da Cimeira de Helsínquia. Dando
provas de sabedoria, ela absteve-se de pedir contas sobre o papel de cada
Estado durante a guerra e, pelo contrário, apelou a que ajudassem ao seu fim:
retirada de forças especiais, paragem da guerra secreta, supressão da ajuda aos
jiadistas, retorno de refugiados, reabertura de embaixadas. Ela afirmou,
nomeadamente, que todos poderiam participar na reconstrução sem exclusão.
Assim que a delegação partiu, a
Chancelerina Angela Merkel e o Presidente Emmanuel Macron ingenuamente mandaram
interrogar o Pentágono para saber se era verdade que o Presidente Donald Trump
tencionava fazer certas companhias transnacionais (KKR, Lafarge, etc.) pagar
---só para semear a confusão além-Atlântico--- . Esta atitude do Presidente
Macron, antigo quadro bancário, é tanto mais deplorável quanto ele procurara
simbolizar a sua boa fé oferecendo 44 toneladas de ajuda humanitária à
população síria, encaminhadas pelo exército russo.
No Médio-Oriente, a viagem da
delegação russa foi mais noticiada pelos média (mídia-br). Lavrov e Guerasimov
puderam anunciar a criação de cinco comissões para o regresso dos refugiados.
Todas, no Egipto, no Líbano, na Turquia, no Iraque e na Jordânia, incluem
representantes do Estado anfitrião e delegados russos e sírios. Ninguém se
atreveu a colocar a pergunta que incomoda : porque é que uma tal comissão não
foi constituída com a União Europeia?
A respeito da reabertura das
embaixadas, os Emirados Árabes Unidos apanharam os ocidentais e seus aliados de
surpresa ao negociar já a reabertura da sua em Damasco.
Restava a preocupação dos
Israelitas em obter a partida da Síria dos conselheiros militares iranianos e
das milícias pró-iranianas, entre as quais o Hezbolla. O Primeiro-ministro
Benjamin Netanyahu multiplicou as idas e vindas a Moscovo e a Sochi para
defender a sua causa. Lembremos que Guerasimov havia ironizado sobre o
descaramento dos vencidos israelitas exigindo a partida dos vencedores
iranianos. Lavrov, quanto a ele, refugiara-se diplomaticamente refugiado atrás
de uma recusa de princípio de não se ingerir na soberania síria.
A Rússia resolveu o problema: a
polícia militar russa reinstalou as forças da ONU ao longo da linha de
demarcação sírio-israelita, da qual tinham sido expulsas há quatro anos.
Durante todo este período, elas haviam sido substituídas pela Alcaida, apoiada
pelo Tsahal (FDI). A Rússia também instalou por trás da linha de demarcação, em
território sírio, oito postos de observação militar. Desta forma, Moscovo pode,
ao mesmo tempo, garantir tanto à ONU como à Síria que os jiadistas não
retornarão e a Israel que o Irão não o atacará a partir da Síria.
Israel, que até aqui apostava
pela derrota da República Árabe Síria e qualificava o seu Presidente de
«carniceiro», subitamente admitiu pela voz do seu Ministro da Defesa, Avigdor
Lieberman, que a Síria saía vencedora do conflito e que o Presidente al-Assad
era o seu chefe legítimo. Para manifestar a sua boa vontade, Liberman mandou
bombardear um grupo do Daesh(EI) que até agora apoiava por trás da cortina.
Pouco a pouco, a Federação Russa
e a Casa Branca põem ordem nas relações internacionais e convencem os
diferentes protagonistas a retirar-se da guerra, ou até a apresentar
candidatura para a reconstrução. Por seu lado, o Exército Árabe Sírio prossegue
a libertação do seu território. Resta ao Presidente Trump tratar de retirar as
suas tropas do Sul (Al-Tanf) e do Norte do país (Leste do Eufrates) e ao
Presidente Erdoğan abandonar à sua sorte os jiadistas refugiados no Noroeste
(Idlib).
* Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: Sous nos yeux. Du 11-Septembre à Donald Trump. Outra obras : L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación(Monte Ávila Editores, 2008).
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