sexta-feira, 28 de setembro de 2018

ISTO ESTÁ A SER FEITO PELO ELITISMO, EM NOME DA CIVILIZAÇÃO!...

No Botswana os deuses estão mesmo loucos!

Martinho Júnior | Luanda
  
1- Há minorias em África, que sendo duma incomensurável riqueza antropológica para toda a humanidade, estão sujeitas a todo o tipo de pressionantes manipulações de carácter fascista, colonial e neocolonial!...

De entre essas minorias estão os povos bosquímanos, os mais antigos povos autóctones da África Austral, com culturas adaptadas aos espaços ardentes do Kalahári e suas periferias, onde nenhum outro povo se instalou, onde foi garantido o seu refúgio-habitat e onde a amenização é garantida pelo “motor a dois tempos” em que se rege tropicalmente o Cubango (Okawango) que, nascido na região central das grandes nascentes em Angol, se espalha num enorme delta interior que ocupa a parte norte do Botswana.

É essa a “casa” dos bosquímanos, cuja nomadização acompanha os regimes dos fluxos de água a norte (ao longo do Cubango para dentro do território de Angola) e os pequenos e secretos reservatórios no interior do Kalahári, bem no miolo central do território do Botswana, a sul.

Essa nomadização é também feita pelos grandes herbívoros: durante a estação das chuvas eles penetram a sul no delta do Cubango e, quando chega o cacimbo, eles deslocam-se ao longo do rio em direcção norte, para dentro do Cuando Cubango.

Sem o Kalahari para as suas nomadizações, os bosquímanos estão a ser integrados nas pequenas reservas naturais e atraídos à sedentarização nas imediações das “lodges” turísticas, como espécie rara de museu animando as paisagens que dão lucro aos promotores de tão original ecoturismo, numa altura em que esse tipo de iniciativas complementam a instalação dos “superiores interesses” do cartel!

O crescimento dos interesses nos diamantes intercala-se com a promissora indústria do turismo, em grande parte virado para os endinheirados do mundo em busca de retiros exóticos.

O Central Kalahari Game Reserve surgiu no miolo central do Botswana, ocupando a maior parte do espaço de nomadização dos bosquímanos porém, desde que começou a ser considerado um território rico em kimberlites diamantíferas nos anos 80 do século XX, as áreas de exclusão para a exploração de diamantes começaram a surgir e, com elas, as nomadizações dos bosquímanos dentro do habitat que constitui sua “casa”, estão a chegar ao fim…

2- A PIDE/DGS utilizou os bosquímanos com a criação dos Flechas pelo inspector Óscar Cardoso na segunda metade dos anos 60 do século XX e, no âmbito da esteira do Exercício ALCORA, eles continuaram a ser utilizados pelo "apartheid" na sua famigerada"border war", servindo desde logo no Batalhão 31 integrado nas Forças Territoriais do Sudoeste Africano durante a Operação Savana, na tentativa de tomar Luanda a 11 de Novembro de 1975!...

A manipulação foi de tal ordem que os bosquímanos não deram pela mudança das bandeiras, nem pela ordem ideológica e doutrinária da internacional fascista em África, que disseminava tribalismo e “bantustões”…

Hoje, por causa da exploração de diamantes, numa altura em que esgotados os recursos na África do Sul o cartel passa-se, “com armas e bagagens”, para o paralelo do Bostwana, os bosquímanos estão a ser confinados, sedentarizados à força, tendo sido retirados do imenso Kalahári os reservatórios de água que permitiam um melhor habitat para as deambulações no seu ambiente natural!...

Dum patamar sócio-político e institucional, com o fim do “apartheid” os mesmos interesses passaram do estado para a economia e exercem-na com o mesmo sinal elitista e exclusivista de sempre, inclusive no que diz respeito à gestão da vida em relação ao património natural comum, onde se inscreve a cultura em vias de extinção dos bosquímanos.

Pergunta pertinente, numa altura em que foram criados no Sudeste de Angola, em função do jogo de interesses elitista e exclusivistas, os Parques Nacionais que integram o KAZA TFCA:

O QUE ESTAMOS E VAMOS FAZER EM ANGOLA COM ELES NO CUANDO CUBANGO, NO CUNENE E NO NAMIBE?

Martinho Júnior - Luanda, 18 de Setembro de 2018

Todas as ilustrações foram recolhidas do Survival International

Alguns suportes:
Botswana government lies exposed as diamond mine opens on Bushman land – http://www.survivalinternational.org/news/10410
Botswana, Kalahari Bushmen evicted to make space for diamond mining – https://www.lifegate.com/people/news/botswana-kalahari-bushmen
Diamond miners exploit land of the Bushmen – https://www.theguardian.com/world/2003/feb/20/rorycarroll


ARTIGO-MANIFESTO DO SURVIVAL

Existem 100.000 Bosquímanos em Botsuana, Namíbia, África do Sul e Angola. Eles são indígenas da África do Sul e têm habitado a região por dezenas de milhares de anos.

Na região central de Botsuana encontra-se a Reserva de Caça do Kalahari Central, uma reserva criada para proteger o território tradicional dos 5.000 Bosquímanos Gana, Gwi e Tsila (e seus vizinhos os Bakgalagadi), e a caça da qual dependem para sua sobrevivência.

No início da década de ’80, foram descobertos diamantes na reserva. Logo depois, oficiais do governo entraram na reserva para notificar os Bosquímanos, que lá viviam, que eles teriam que deixar a área por causa dos diamantes encontrados.

Em três grandes despejos, em 1997, 2002 e 2005, praticamente todos os Bosquímanos foram expulsos. Suas casas e seu poço de água foram destruídos, sua escola e posto de saúde foram fechados, e as pessoas foram ameaçadas e transportadas em caminhões.


Os Bosquímanos agora vivem em campos de reassentamento fora da reserva. Raramente conseguem caçar, e são presos e espancados quando o fazem; eles são dependentes das subvenções do governo. Agora, sofrem com o alcoolismo, o tédio, a depressão e doenças como a tuberculose e o HIV/AIDS.

A menos que eles possam retornar às suas terras ancestrais, suas sociedades originais e modo de vida serão destruídos, e muitos deles morrerão.

Embora os Bosquímanos tenham ganhado o direito na justiça de voltar às suas terras em 2006, o governo tem feito todo o possível para impossibilitar o seu retorno, inclusive proibindo-os de acessar um poço de água que utilizavam antes de serem despejados. Sem ele, os Bosquímanos dificilmente encontram água suficiente para sobreviver em suas terras.

Os Bosquímanos entraram com um novo processo judicial contra o governo em uma tentativa de ganhar acesso ao seu poço. Uma audiência foi realizada em junho de 2010, mas o juiz indeferiu o pedido dos Bosquímanos.

Ao mesmo tempo que o governo impede os Bosquímanos de terem acesso à água, ele tem perfurado novos poços para os animais selvagens e permitiu a empresa Wilderness Safaris de construir um alojamento turístico na reserva.

O Kalahari Plains Camp foi inaugurado depois que a Wilderness Safaris firmou um contrato de arrendamento com o governo. No entanto, o contrato não fez provisões para os direitos dos Bosquímanos em cujas terras ancestrais o alojamento foi construído, nem foram consultados sobre o empreendimento.

Enquanto os Bosquímanos dificilmente encontram água suficiente para sobreviver em suas terras, os hóspedes podem saborear cocktails na piscina do alojamento.


Além disso, o governo:

tem recusado a emissão de licenças para caçar nas suas terras (apesar da decisão do Supremo Tribunal de Botsuana que a sua recusa de emitir autorizações era ilegal),

prendeu mais de 50 Bosquímanos por caçar para alimentar suas famílias,

tem impedido os Bosquímanos de trazer seus pequenos rebanhos de cabras de volta para a reserva.

Sua política é claramente para intimidar e assustar os Bosquímanos em permanecer nos campos de reassentamento, e tornar impossível a vida dos que voltaram à sua terra ancestral.

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