João Ramos de Almeida* | opinião
Em homenagem à luta dos
estivadores que, esta manhã, estiveram no porto de Setúbal a impedir
que trabalhadores vindos de fora carregassem os carros da firma
Autoeuropa para um navio fantasma e, assim, furassem a sua greve por condições
dignas de trabalho, contra
a precariedade e por um contrato colectivo.
Nesta luta, o Governo socialista esteve - até agora - mal.
O ministro da Economia Pedro Siza Vieira esteve mais preocupado que o sistema portuário nacional respondesse “às necessidades das empresas” - vulgo Autoeuropa - e manteve-se “em contacto com a empresa [Autoeuropa] no sentido de assegurar que as necessidades de escoamento da produção continuam a ser satisfeitas”. Esse era o problema que o Governo mais sentia!
Sobre as mais do que precárias condições de trabalho dos estivadores, a ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, começou por dizer que não havia razão para a paralisação e depois - face à cobertura mediática - foi forçada a emendar a mão. Mas em vez de exercer o seu poder de Estado e pedir a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho (no fundo, trata-se de uma questão eminentemente laboral saber se aquelas condições são legais), achou por bem intervir redundantemente. Pediu ao Instituto da Mobilidade e Transportes e Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) para que se entendam na contratação colectiva e pressionou os trabalhadores a acabar com a greve e a negociar. Algo que não tem funcionado muito bem e daí a greve. Ao mesmo tempo, o seu marido e ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, esvaziava o poder negocial da greve dos estivadores, ao colocar o corpo de intervenção da PSP a repor a "ordem pública" - ainda que com bons modos... -, deixando o autocarro com os fura-greves entrar no cais, para lucro da Autoeuropa e da Operestiva.
Imagens como estas são clássicas em muitos filmes. Podemos vê-las no filme de John Ford (1940), baseado na obra de John Steinbeck (1939), quando uma família fugida da grande depressão é conduzida a um campo de fruta por apanhar e vê-se envolvida num conflito, com guardas de varapaus e espingardas, a protegê-los dos outros trabalhadoresem
luta. Ou nos filmes que retratam a luta dos mineiros no Reino
Unido nos anos 80. Em todos eles, as forças da ordem alinharam com a liberdade de
contratação, e nunca para pugnar pela dignidade no trabalho.
Era impensável ver o mesmo quase um século depois e, ainda por cima, pela mão de políticos socialistas. Como se pode dizer que Marx está morto, na gaveta?
Aliás, não foi por acaso que, ouvido pela Antena 1, o representante da firma contratadora dos estivadores, Diogo Marecos (ver "11h00 estivadores de substituição ficam até tudo estar normalizado"), se mostrou satisfeito com a actuação da PSP, que repôs "a normalidade da situação", porque se tratava de um caso de... "emergência nacional" (sic!). Os carros da Autoeuropa não podiam esperar mais!
Vergonha.
[Actualização às 14h27: Citando de um post de Bruno Carvalho no Facebook:
Nesta luta, o Governo socialista esteve - até agora - mal.
O ministro da Economia Pedro Siza Vieira esteve mais preocupado que o sistema portuário nacional respondesse “às necessidades das empresas” - vulgo Autoeuropa - e manteve-se “em contacto com a empresa [Autoeuropa] no sentido de assegurar que as necessidades de escoamento da produção continuam a ser satisfeitas”. Esse era o problema que o Governo mais sentia!
Sobre as mais do que precárias condições de trabalho dos estivadores, a ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, começou por dizer que não havia razão para a paralisação e depois - face à cobertura mediática - foi forçada a emendar a mão. Mas em vez de exercer o seu poder de Estado e pedir a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho (no fundo, trata-se de uma questão eminentemente laboral saber se aquelas condições são legais), achou por bem intervir redundantemente. Pediu ao Instituto da Mobilidade e Transportes e Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) para que se entendam na contratação colectiva e pressionou os trabalhadores a acabar com a greve e a negociar. Algo que não tem funcionado muito bem e daí a greve. Ao mesmo tempo, o seu marido e ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, esvaziava o poder negocial da greve dos estivadores, ao colocar o corpo de intervenção da PSP a repor a "ordem pública" - ainda que com bons modos... -, deixando o autocarro com os fura-greves entrar no cais, para lucro da Autoeuropa e da Operestiva.
Imagens como estas são clássicas em muitos filmes. Podemos vê-las no filme de John Ford (1940), baseado na obra de John Steinbeck (1939), quando uma família fugida da grande depressão é conduzida a um campo de fruta por apanhar e vê-se envolvida num conflito, com guardas de varapaus e espingardas, a protegê-los dos outros trabalhadores
Era impensável ver o mesmo quase um século depois e, ainda por cima, pela mão de políticos socialistas. Como se pode dizer que Marx está morto, na gaveta?
Aliás, não foi por acaso que, ouvido pela Antena 1, o representante da firma contratadora dos estivadores, Diogo Marecos (ver "11h00 estivadores de substituição ficam até tudo estar normalizado"), se mostrou satisfeito com a actuação da PSP, que repôs "a normalidade da situação", porque se tratava de um caso de... "emergência nacional" (sic!). Os carros da Autoeuropa não podiam esperar mais!
Vergonha.
[Actualização às 14h27: Citando de um post de Bruno Carvalho no Facebook:
"O António
Mariano, presidente do SEAL
- Sindicato dos Estivadores e da Actividade Logística, contou-me que
recebeu a informação de que os fura-greves vão ganhar cerca de 500 euros
pelo trabalho de embarcar os automóveis da Autoeuropa. É um bom princípio para
a mesa de negociações. Se a empresa pode pagar 500 euros por um ou dois dias de
trabalho, isso significa que os estivadores em luta podem negociar, para além da
integração permanente, salários que rondem esse valor por dia?"]
*Em “Ladrões de Bicicletas”
Sem comentários:
Enviar um comentário