quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Neoliberalismo, o caminho negro para o fascismo

O peixe grande come o pequeno. Desenho de Pieter Bruegel, o Velho, 1556
Chris Hedges [*]

neoliberalismo como teoria económica sempre foi um absurdo. Tinha tanta validade quanto as ideologias dominantes do passado, como o direito divino dos reis   e a crença fascista noÜbermensch . Nenhuma das suas alardeadas promessas era remotamente possível.

Ao concentrar a riqueza nas mãos de uma elite oligárquica global – oito famílias detêm hoje tanta riqueza quanto 50% da população mundial – enquanto procedia à demolição de controlos e regulamentações governamentais, gerou sempre maciças desigualdades de rendimento, poder dos monopólios, alimentou o extremismo político e destruiu a democracia. Não é necessário folhear as 577 páginas de Capital in the Twenty-First Century de Thomas Piketty para descobrir isso. Mas a racionalidade económica nunca foi o ponto. O ponto era a restauração do poder de classe.

Como ideologia dominante, o neoliberalismo foi um êxito brilhante. A partir dos anos 70 do século XX, os seus principais críticos keynesianos foram expulsos das universidades, instituições estatais e organizações financeiras, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial e excluídos dos media. Os cortesãos e intelectuais impostores, como Milton Friedman , foram preparados em locais como a Universidade de Chicago, foram-lhes dados lugares proeminentes e pródigos fundos de grandes empresas. Disseminaram os dogmas oficiais de teorias económicas desacreditadas, popularizadas antes por Friedrich Hayek e pela escritora de terceira categoria Ayn Rand.

Uma vez ajoelhado diante dos ditames do mercado, anulando regulamentações governamentais, reduzindo os impostos para os ricos, permitindo o fluxo de dinheiro através das fronteiras, destruindo sindicatos e assinando acordos comerciais que desviavam empregos para fábricas sem condições na China, o mundo seria mais feliz e livre, um lugar mais rico. Foi um golpe. Mas funcionou.

"É importante reconhecer as origens de classe deste projeto, que ocorreu na década de 1970, quando a classe capitalista estava em grandes dificuldades, os trabalhadores estavam bem organizados e começavam a avançar", disse David Harvey , autor de A Brief History of Neoliberalism , quando falámos em Nova York. "Como qualquer classe dominante, eles precisavam de ideias dominantes. Assim, a liberdade do mercado, as privatizações, o empreendedorismo do eu, a liberdade individual e tudo o mais deveriam ser as ideias dominantes de uma nova ordem social, e foi essa a ordem implementada nos anos 80 e anos 90".

"Como projeto político, foi muito habilidoso, disse ele. "Conseguiu muito consentimento popular porque falava sobre liberdade individual e liberdade de escolha. Quando eles falavam sobre liberdade, era a liberdade do mercado. O projeto neoliberal disse à geração de 68: "Tudo bem, você quer liberdade? É Isso que o movimento estudantil pretende nós vamos dar isso a vocês, mas vai ser a liberdade do mercado. A outra coisa que você procura é justiça social – esqueça. Então, vamos dar-lhes liberdade individual, mas esqueçam a justiça social. Não se organizem". O objetivo era desmantelar as instituições, as instituições coletivas da classe trabalhadora, particularmente os sindicatos e pouco a pouco os partidos políticos que representassem algum tipo de preocupação com o bem-estar das massas".

"A grande coisa sobre a liberdade do mercado é que parece ser igualitária, mas não há nada mais desigual do que o tratamento igual dos desiguais", continuou Harvey. "Promete igualdade de tratamento, mas se você for extremamente rico, isso significa que pode ficar ainda mais rico. Se você for muito pobre, é mais provável que fique ainda mais pobre. O que Marx mostrou brilhantemente no primeiro volume de O Capital é que a liberdade de mercado produz níveis cada vez maiores de desigualdade social ".

A disseminação da ideologia do neoliberalismo foi altamente organizada por uma classe capitalista unificada. As elites capitalistas financiaram organizações como a Business Roundtable, a Câmara de Comércio e grupos de reflexão como a The Heritage Foundation para vender a ideologia ao público. Inundaram universidades com doações, desde que as universidades retribuíssem com fidelidade à ideologia dominante. Usaram a sua influência e riqueza, bem como serem donos dos media, para transformar a imprensa no seu porta-voz. Silenciaram ou dificultaram o emprego a quaisquer heréticos. O aumento dos valores das ações, em vez da produção, tornou-se a nova medida da economia. Tudo e tudos foram financiarizados e tornados mercadorias.

"O valor é fixado por qualquer que seja o preço verificado no mercado", disse Harvey. "Assim, Hillary Clinton é muito valiosa porque fez uma palestra na Goldman Sachs por 250 mil dólares. Se eu der uma palestra para um pequeno grupo no centro da cidade e receber 50 dólares, então obviamente ela vale muito mais do que eu. A valorização de uma pessoa e do seu conteúdo é avaliada por quanto consegue obter no mercado".

"Esta é a filosofia por trás do neoliberalismo", continuou. "Temos de atribuir um preço às coisas. Mesmo que não sejam realmente coisas que devam ser tratadas como mercadorias. Por exemplo, a assistência médica torna-se uma mercadoria. Habitação para todos torna-se uma mercadoria. A educação torna-se uma mercadoria. Assim, os estudantes têm de pedir emprestado para obter a educação que lhes dará um emprego no futuro. Esse é o golpe da coisa. Basicamente, diz-se que se você é um empreendedor, se se qualificar, etc, receberá a justa recompensa. Se não recebe uma justa recompensa é porque não se qualificou suficientemente. Adquiriu o tipo errado de cursos. Fez cursos de filosofia ou de clássicos em vez de aprender técnicas de gestão de como explorar mão-de-obra.

O contra do neoliberalismo é agora amplamente compreendido em todo o espectro político. É cada vez mais difícil esconder a sua natureza predatória, incluindo suas exigências de enormes subsídios públicos (a Amazon, por exemplo, recentemente solicitou e recebeu incentivos fiscais multimilionários de Nova York e Virgínia para estabelecer centros de distribuição nesses estados). Isso forçou as elites dominantes a fazerem alianças com demagogos de direita que usam as táticas cruas do racismo, islamofobia, homofobia, fanatismo e misoginia para canalizar a raiva e a crescente frustração do público para longe das elites e canaliza-la para os mais vulneráveis.

Esses demagogos aceleram a pilhagem pelas elites globais e, ao mesmo tempo, prometem proteger os trabalhadores e as mulheres. A administração de Donald Trump, por exemplo, aboliu numerosas regulamentações , das emissões de gases do efeito estufa [1] à neutralidade da Internet e reduziu os impostos para os indivíduos e empresas mais ricos, eliminando cerca de 1,5 milhão de milhões de dólares de receita do governo nos próximos dez anos, adotando linguagem e formas autoritárias de controlo.

O neoliberalismo gera pouca riqueza. Em vez disso, redistribui-a para as mãos das elites dominantes. Harvey chama isso de "acumulação por desapossamento".

"O principal argumento da acumulação por desapossamento baseia-se na ideia de que quando as pessoas ficam sem capacidade de produzir ou fornecer serviços, elas criam um sistema que extrai riqueza de outras pessoas", disse Harvey. "Essa extração então torna-se o centro de suas atividades. Uma das maneiras pelas quais essa extração pode ocorrer é criando mercados onde antes não existiam. Por exemplo, quando eu era mais jovem, o ensino superior na Europa era essencialmente um bem público. Cada vez mais [este e outros serviços] se tornaram uma atividade privada como os serviços de saúde. Muitas dessas áreas que você consideraria não serem mercadorias no sentido comum, tornam-se assim mercadorias. Habitação para a população de baixos rendimentos era frequentemente vista como uma obrigação social. Agora tudo tem de passar pelo mercado. Impõe-se uma lógica de mercado em áreas que não deveriam estar abertas ao mercado".

"Quando eu era criança, a água na Grã-Bretanha era fornecida como um bem público", disse Harvey. "Então, é claro, foi privatizada. Você começa a pagar taxas de água. Eles privatizaram o transporte [na Grã-Bretanha]. O sistema de autocarros é caótico. Há empresas privadas a circularem por toda parte. Não é o sistema que as pessoas realmente precisam. A mesma coisa acontece na ferrovia. Uma das coisas agora interessantes na Grã-Bretanha é que o Partido Trabalhista diz: 'Vamos trazer tudo isso de volta à propriedade pública porque a privatização é totalmente insana e tem consequências insanas, não está a funcionar devidamente. A maioria da população concorda com isto".

Sob o neoliberalismo, o processo de "acumulação por desapossamento" é acompanhado pela financiarização.

"A desregulamentação permitiu que o sistema financeiro se tornasse um dos principais centros de atividade redistributiva através da especulação, predação, fraude e roubo", escreve Harvey no seu livro, talvez o melhor e mais conciso relato da história do neoliberalismo. "Promoções de ações, esquemas Ponzi, destruição de ativos estruturados pela inflação, espoliação de ativos por meio de fusões e aquisições, promoção de níveis de endividamento que reduzem populações inteiras – mesmo nos países capitalistas avançados – à escravidão pelas dívidas. Para não falar em fraudes empresariais, desapropriação de ativos, invasão de fundos de pensão dizimados em colapsos de ações e por manipulação do crédito e do valor de ações, tudo isso se tornou uma característica central do sistema financeiro capitalista".

O neoliberalismo, exercendo um tremendo poder financeiro, é capaz de fabricar crises económicas para deprimir o valor dos ativos e depois apossar-se deles.

"Uma das maneiras pelas quais se pode engendrar uma crise é cortar o fluxo de crédito". "Isso foi feito no leste e sudeste da Ásia em 1997 e 1998. De repente, a liquidez secou. As principais instituições deixam de emprestar dinheiro. Havia um grande fluxo de capital estrangeiro para a Indonésia. Eles fecharam a torneira. O capital estrangeiro fugiu. Fecharam a torneira do crédito em parte porque, uma vez que as empresas fossem à falência, poderiam vir a ser compradas e colocadas novamente a funcionar. Vimos a mesma coisa durante a crise da habitação aqui [nos EUA]. As execuções hipotecárias das habitações deixaram muitas vazias que poderiam ser apanhadas a preços muito baixos. A Blackstone [2] apareceu, comprou todas as casas e é agora o maior senhorio dos Estados Unidos. Tem 200 mil propriedades ou algo parecido. Está à espera que o mercado dê uma volta. Quando o mercado muda, o que pode acontecer em breve, então poderá vender ou arrendar e ganhar imensos lucros com isso. Desta forma, a Blackstone ganhou uma fortuna a crise dos arrestos hipotecários, onde todos perderam. Foi uma enorme transferência de riqueza".

Harvey adverte que a liberdade individual e a justiça social não são necessariamente compatíveis. A justiça social, escreve ele, requer solidariedade social e "disposição de subordinar necessidades e desejos individuais à causa de uma luta mais geral por, digamos, igualdade social e justiça ambiental". A retórica neoliberal, com ênfase em liberdades individuais pode efetivamente "separar as ideias de liberdade, identidade política, o multiculturalismo e, eventualmente, o consumismo narcisista, das forças sociais alinhadas na procura de justiça social através da conquista do poder de Estado".

O economista Karl Polanyi entendeu que existem dois tipos de liberdade. Há as más liberdades para explorar os que nos rodeiam e extrair enormes lucros sem levar em conta o bem comum, incluindo o mal que é feito ao eco-sistema e às instituições democráticas. Essas más liberdades têm origem no facto de as grandes empresas monopolizarem as tecnologias e os avanços científicos a fim de obter enormes lucros, mesmo quando, como no caso da indústria farmacêutica, um monopólio significa que as vidas daqueles que não podem pagar preços exorbitantes são colocadas em risco. As boas liberdades – liberdade de consciência, liberdade de expressão, liberdade de reunião, liberdade de associação, liberdade de escolher o seu trabalho – acabam por ser extintas pela primazia dada às más liberdades.

"Planeamento e controlo são atacados como negação da liberdade", escreveu Polanyi. "A livre iniciativa e a propriedade privada são declaradas essenciais para a liberdade. Uma sociedade construída sobre outros fundamentos é dito que não merece ser chamada de livre. A liberdade que a regulamentação cria é denunciada como falta de liberdade; a justiça, a liberdade e o bem-estar que ela oferece são denunciados como uma camuflagem da escravidão".

"A ideia de liberdade" degenera, assim, numa mera defesa da livre iniciativa, que significa "a plenitude da liberdade para aqueles cujo rendimento, lazer e segurança não precisam ser promovidos, e uma mera margem de liberdade para as pessoas que podem em vão tentar fazer uso de seus direitos democráticos para se defenderem do poder dos donos do capital", escreve Harvey, citando Polanyi. "Mas se, como é sempre o caso, "nenhuma sociedade é possível em que o poder e a compulsão estejam ausentes, nem num mundo em que a força não seja necessária", então a única maneira pela qual esta visão utópica liberal poderia ser sustentada é pela força, violência e autoritarismo. A utopia liberal ou neoliberal está condenada, na opinião de Polanyi, a ser frustrada pelo autoritarismo, ou mesmo pelo fascismo total. As boas liberdades estão perdidas, as más são assumidas.

O neoliberalismo transforma a liberdade de muitos em liberdade para alguns. O resultado lógico é o neofascismo. O neofascismo abole as liberdades civis em nome da segurança nacional e classifica grupos inteiros como traidores e inimigos do povo. É o instrumento militarizado usado pelas elites dominantes para manter o controlo, dividir e separar a sociedade e acelerar ainda mais a pilhagem e a desigualdade social. A ideologia dominante, não sendo mais crível, é substituída pela bota militar.

[1] O autor toma como boa a maior impostura científica da história da humanidade: a teoria do aquecimento global.   Ver Aquecimento global: uma impostura científica   e   Acerca da impostura global
[2] Blackstone: é o fundo abutre que em Portugal adquiriu o Novo Banco (ex-Banco Espírito Santo) por preço praticamente nulo. 


[*] Jornalista. Durante quase duas décadas foi correspondente estrangeiro na América Central, Médio Oriente, África e Balcãs. Fez reportagens em mais de 50 países e trabalhou para The Christian Science Monitor, National Public Radio, Dallas Morning News e The New York Times, no qual foi correspondente estrangeiro durante 15 anos. 

O original encontra-se em www.informationclearinghouse.info/50680.htm

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

Portugal | Ainda mais uma achega contra a caridadezinha


Jorge Rocha* | opinião

Na edição online do «Expresso» o economista Marco Capitão Ferreira acrescenta mais um argumento aos muitos já rastreados para que nos eximamos de dar qualquer apoio ao Banco Alimentar contra a Fome: “Sim, o Banco Alimentar gasta 300.000 euros ano em ordenados, para não falar noutras despesas que pouco têm a ver com o apoio a famílias necessitadas, e eu por mim tenho dificuldade em compreender isso.”

A exemplo do que Almada Negreiros escreveu na sua «Cena do Ódio» (esta é a “a pátria onde Camões morreu de fome/e onde todos enchem a barriga de Camões!”) a instituição de Jonet vale-se de haver tanta gente com fome para que muitos dos seus amigos e protegidos com eles lucrem. A começar pela própria líder acabada de ser premiada com um bem remunerado cargo na administração do Grupo José de Mello, que alegou encontrar nela as competências pretendidas para o seu negócio predador em função da continuada vigarice, que tem sido a sua carreira de «benemérita» nos últimos vinte e quatro anos.

Para quem andava há dias a queixar-se de nada ganhar com a atividade no Banco Alimentar, convenhamos que nova sinecura equivale a uma mentira com perna muitíssimo curta.

*jorge rocha | Ventos Semeados

Portugal | Pobre não é de Esquerda, nem de Direita, é pobre


Paulo Baldaia* | Jornal de Notícias | opinião

O populismo, que se alimenta de gente que leva décadas a ser esquecida, é que pode ser de Esquerda ou de Direita. Mas o perigo nunca é real por vir da Esquerda ou da Direita, é real porque os populismos crescem dividindo os mais frágeis, colocando uns contra os outros. Desempregados contra imigrantes ou brancos pobres contra pretos pobres são o conflito mais comum, num discurso que acaba sempre por apelar aos eleitores para se revoltarem contra os eleitos, todos corruptos.

Em Portugal não temos ainda terreno fértil para semear e colher rapidamente conflitos anti-imigração ou conflitos raciais, mas o potencial existe. O que garantidamente seria um êxito eleitoral era um partido anticorrupção, liderado, por exemplo, pelo juiz Carlos Alexandre. Sem outra agenda que não fosse o combate a esta chaga, que os portugueses acreditam ser generalizada na elite política e económica, um partido com Carlos Alexandre como cabeça de cartaz estaria em condições de ganhar as eleições. Se não já em 2019, na seguinte. Sem uma liderança forte, podem ambicionar, ainda assim, eleger vários deputados e formar um grupo parlamentar.

E sabem porque é que os pobres acabam sempre por dar a mão aos populistas de Direita, ou aos populistas de Esquerda? Porque os políticos "sérios" nunca se preocupam em resolver estruturalmente os problemas dos mais pobres. Os que são verdadeiramente pobres demoram décadas para ver uma pequena parte do seu exército entrar no elevador social, mas estão sempre a vê-lo avariar-se e a ter que voltar para baixo, quando há uma crise. Em Portugal, o salário dos gestores não desceu com a última crise e a Função Pública não perdeu emprego, perdeu salário que já recuperou, mas os milhões que vivem com menos de 800 euros por mês são sempre precários no acesso ao direito de ganhar a vida com trabalho. Se a política gosta de brincar com os mais frágeis, é da mais elementar justiça que os mais frágeis gostem de brincar com a política. Foi assim nos Estados Unidos, no Brasil, na Europa... e haverá de ser assim em Portugal.

*Jornalista

Programa europeu reforçou medidas de resposta às alterações climáticas em Timor-Leste


Díli, 06 dez (Lusa) -- Um programa europeu de combate às alterações climáticas em Timor-Leste permitiu reforçar a monitorização meteorológica, a diversificação agroflorestal ou construção de viveiros, disse hoje o embaixador de Portugal, país que apoiou o projeto.

A capacitação de técnicos do setor foi outro dos aspetos dominantes do Programa de Apoio à Aliança Global para as Alterações Climáticas em Timor-Leste (GCCA-TL na sigla em inglês) que começou a ser implementado em julho de 2014 e que termina este mês.

Os resultados do projeto, com um orçamento da UE de quatro milhões de euros e cofinanciamento do Instituto Camões em quase 109 mil euros, foram hoje apresentados na Embaixada de Portugal em Díli.

Intervindo no encontro de hoje, o embaixador de Portugal em Díli, José Pedro Machado Vieira, destacou a importância de programas como este para ajudar a combater os efeitos das alterações climáticas que já se fazem sentir em Timor-Leste.

"Os efeitos das alterações climáticas são visíveis na imprevisibilidade das chuvas e nos fenómenos climáticos extremos, que originam períodos de chuva curta e intensa, intercalados com longos períodos de seca, com impactos diretos ao nível da produção agrícola, principal fonte de rendimento da população timorense", disse.

"Este programa reflete uma das prioridades da Cooperação Portuguesa - o reforço de parcerias estratégicas com Estados-Membros da UE - e a união de esforços para o desenvolvimento de programas em Timor-Leste, em setores tão importantes como o ambiente e a agricultura", sublinhou.

Hugo Miguel Trindade, coordenador-geral do projeto, explicou que o objetivo foi "contribuir para a sustentabilidade do bem-estar das comunidades rurais em Timor-Leste", ajudando a "melhorar a capacidade das populações vulneráveis aos riscos das alterações climáticas para lidarem com os efeitos destas alterações".

Questões como a gestão sustentável dos recursos naturais e melhoria das suas opções de modos de vida, alcança-as através "do uso dos mecanismos de desenvolvimento local que tenham em conta a inclusão social e a gestão de conflitos".

Além do Camões e da Cooperação alemã (GIZ), o projeto foi implementado com a colaboração do Ministério da Agricultura e Pescas de Timor-Leste (MAP).

Direcionado em particular para técnicos do MAP e para agricultores, o programa incidiu nas bacias hidrográficas das ribeiras de Loes e de Seiçal, com o Camões a ficar responsável pela implementação em 14 sucos em Loes (6 sucos em Liquiçá e 8 sucos em Ermera) e a GIZ a assumir a responsabilidade em 21 sucos (15 em Baucau e 6 em Viqueque).

O programa ajudou a estabelecer monitorização meteorológica confiável nos 13 municípios, ajudando a medir os efeitos do clima na produção agrícola e no ambiente.

"Os resultados da regular análise agrometeorológica são produzidos de forma acessível para os produtores rurais e as conclusões obtidas suportarão a definição de políticas nacionais com base em evidências", explica uma nota do GCCA-TL.

As "respostas de adaptação aos desafios climáticos" já são incorporadas em pelo menos 50% dos planos de desenvolvimento de suco, nos postos administrativos identificados como vulneráveis aos riscos das alterações climáticas, e de uma forma "socialmente inclusiva".

Medidas de recuperação ambiental, a implementação de atividades sustentáveis de desenvolvimento de meios de vida e a melhoria do diálogo social ajuda a "melhorar a resiliência das comunidades rurais que habitam em pelo menos 50% dos postos administrativos identificados como vulneráveis aos riscos das alterações climáticas".

O programa ajudou ainda a elaborar um conceito para a gestão da rede de estações agrometeorológicas sob responsabilidade do MAP, instaladas em todo o país, que "serve de guia de procedimentos para a recolha de dados e manutenção das estações".

Conferências e campanhas nacionais sobre alterações climáticas, visitas de campo, uma campanha televisiva de promoção de práticas de diversificação agroflorestal fizeram ainda parte do programa.

Nas zonas de intervenção foram ainda instalados 139 viveiros comunitários que, em conjunto, produziram cerca de um milhão de mudas agroflorestais que permitiram reforçar de sistemas florestais e agroflorestais existentes e criar novos.

Em termos globais 2.400 famílias receberam apoio para plantarem nos seus terrenos, ajudando a criar fontes adicionais de rendimento, mas também na conservação dos recursos naturais para a mitigação dos efeitos das alterações climáticas.

ASP // VM

Timor-Leste quer ajuda de Portugal para criar Instituto de Medicina Legal no país

Lisboa, 05 dez (Lusa) -- Timor-Leste pediu esta semana a Portugal apoio para a criação de um Instituto de Medicina Legal no país, disse o ministro da Justiça timorense, que termina hoje uma visita a Lisboa, onde se reuniu com a sua homóloga, Francisca Van Dunem.

"Adianto desde já que Timor-Leste precisa de um Instituto de Medicina Legal (...) e conto com o apoio de Portugal, que tem a obrigação de ir lá investir, porque somos irmãos. Quero ver tudo a ser concretizado enquanto for ministro da Justiça de Timor-Leste", afirmou Manuel Cárceres da Costa, em declarações à Lusa.

O ministro acrescentou que já falou sobre o assunto com o diretor do Instituto de Medicina Legal de Portugal e que vai agora formalizar uma proposta para ser discutida.

Um assunto que diz também foi falado com a ministra da Justiça de Portugal, Francisca Van Dunem, com quem se reuniu na segunda-feira em Lisboa, adiantando que a governante portuguesa se mostrou "muito recetiva".

Manuel Cárceres da Costa referiu que durante a sua estada em Lisboa se reuniu também com responsáveis da Polícia Judiciária, que tem vindo a formar investigadores timorenses.

A reforma da justiça de Timor Leste, considerou, "é um fator muito importante para o desenvolvimento do país", por isso tem que avançar. "Não há governação sem justiça nem justiça sem governação", concluiu.

O Governo de Timor-Leste pediu também a Portugal apoios para a justiça, incluindo juízes, procuradores, defensores públicos, advogados e oficiais de justiça portugueses, disse esta terça-feira em Lisboa o ministro da Justiça timorense, estendendo o apelo aos países lusófonos.

Mas, sublinhou, esses "juízes e procuradores portugueses não vão ser titulares de processos, vão ser formadores e mentores para formar quadros timorenses" em português.

Manuel Cárceres da Costa encontrou-se ainda com a secretária-executiva da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Maria do Carmo Silveira, e com a secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Teresa Ribeiro.

Das reuniões com as governantes portuguesas, disse levar promessas que podem ajudar o seu país a consolidar o desenvolvimento da Justiça: "O objetivo desta visita a Portugal, que é a minha primeira visita de trabalho como ministro da Justiça da República de Timor Leste, é procurar apoios para consolidar o desenvolvimento da justiça do país".

O ministro considerou que o reforço do ensino da língua portuguesa "é crucial para o desenvolvimento" deste setor porque com 24 anos de ocupação estrangeira, "Timor-Leste quase perdeu a ligação à língua portuguesa e hoje tem juristas jovens, falando no caso específico do setor da justiça, que nasceram durante a ocupação da Indonésia e estão a lidar com uma legislação escrita em português".

Nyusi, empregado dos moçambicanos? Não será em vez disso outro carrasco?


O sujeito sorridente da foto é presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi. Foi ele que ao ser eleito se auto nomeou "empregado dos moçambicanos", estando para os servir após a eleição e tomada de posse do seu mandato.

Empregado? Não será antes outro carrasco que se senta na cadeira de que dispõe no Palácio Presidencial? 

O que faz ele para servir sem mácula os moçambicanos? Conforme prometeu insistentemente durante a sua campanha eleitoral? Que combate intenso e sério é que ele, do alto do seu presidencialismo, ordena e acompanha contra criminosos que roubam e assassinam moçambicanos e/ou estrangeiros?

Aos olhos de quem assiste impotente à miséria que grassa em Moçambique, ao alastramento da corrupção e do roubo dos que desempenham cargos distribuídos pela Frelimo em órgãos de soberania e etc. é evidente que Nyusi está muito longe das suas promessas e mais parece um cúmplice dos crimes constantemente constatados e das violações de Direitos Humanos, da ausência de um regime democrático e civilizado de facto. 

Para quem insiste na existência de crime organizado por elementos das pseudo "forças de segurança", às matanças e outros horrores, Nyusi o que parece representar e chefiar é um bando de criminosos que aterrorizam o povo moçambicano reservando-lhes várias formas de padecimento e injustiças. 

Quem diria que um "empregado" daquele jaez tem o descaramento e ausência de vergonha, a insensibilidade, de maltratar os seus "patrões", os eleitores que o elegeram e os restantes moçambicanos de outras forças políticas ou nem por isso? 

Na foto Nyusi sorri, sorri de quê? Da sua boa vida e boa vida dos seus iguais? Não será que é mais que hora de servir os moçambicanos que todos os dias padecem de carências básicas e de pugnar pela justiça social, assim como abolir a podridão que corrói o país por via de uma elite que há décadas depaupera a economia moçambicana e o desejado bem-estar dos moçambicanos? (MM | PG)

Moçambique | ONG denuncia suspeitas de execuções e abusos das autoridades no norte do país


HRW denuncia novas suspeitas de execuções sumárias e abusos das autoridades de Moçambique contra alegados autores de ataques a povoações remotas no norte do país

A organização não-governamental (ONG) Human Rights Watch (HRW) denunciou esta terça-feira (04.12.) em comunicado novas suspeitas de execuções sumárias e abusos das autoridades moçambicanas contra os alegados autores de ataques a povoações remotas no norte do país.

"É fundamental que as autoridades moçambicanas tomem imediatamente medidas para pôr termo aos abusos cometidos pelas suas forças de segurança e para punir os responsáveis", disse Dewa Mavhinga, diretor da HRW na África Austral, em comunicado, sobre a situação de violência que se vive há um ano na província de Cabo Delgado.

A ONG entrevistou 12 vítimas e testemunhas de abusos, bem como oficiais das forças de segurança e jornalistas entre 10 e 27 de novembro, indicou no mesmo comunicado.

Dois soldados no distrito de Macomia confirmaram a morte de suspeitos, mas não forneceram mais detalhes, por receio de virem a ser identificados. Um dos soldados disse que tinham recebido "ordens dos superiores" para eliminar os "bandidos", o que, segundo o seu entendimento, significava que deviam "matá-los sempre que possível".

Um terceiro soldado partilhou fotos de cadáveres de alegados rebeldes que foram executados de forma sumária durante uma operação no distrito de Nangade, em 13 de novembro.

Muitas pessoas presas nos locais de detenção

Um habitante relatou à HRW que nos locais de detenção havia muitos outros presos e que alguns eram levados para o meio do mato, ouvindo-se gritos e tiros em momentos de tensão, após os quais alguns dos detidos não eram mais vistos.

Há casos em que quem não foge das aldeias durante os ataques fica detido por vários dias em quartéis improvisados para explicar porque não fugiu e relatar o que viu, disse à HRW um alto funcionário do exército, que classificou a privação de liberdade como normal.

Outros continuaram presos e fazem parte dos cerca de 200 arguidos no julgamento de alegados autores dos ataques a aldeias de Cabo Delgado, que decorre no tribunal de Pemba, capital provincial.

Atos de tortura para forçar confissões

Um procurador do Ministério Público da província de Cabo Delgado, que pediu para não ser identificado, disse à HRW que muitos dos réus acusaram os soldados de os manterem detidos durante várias semanas antes de os entregar à polícia, fazendo uso de tortura para forçar confissões e, nalguns casos, matando suspeitos de insurgência desarmados no mato.

A HRW citou o porta-voz nacional da Polícia da República de Moçambique (PRM), Inácio Dina, que negou a existência de suspeitos a serem interrogados de forma arbitrária, privados dos direitos previstos na lei.

Dirigentes islâmicos, ouvidos pela Lusa, têm denunciado, desde há um ano, detenções feitas sem transparência, nem respeito pela lei, junto das comunidades muçulmanas da região de Cabo Delgado.

A onda de violência naquela zona (dois mil quilómetros a norte de Maputo, no extremo norte de Moçambique, junto à Tanzânia) começou após um ataque armado a postos de polícia de Mocímboa da Praia, em outubro de 2017.

Na altura, dois agentes foram abatidos por um grupo com origem numa mesquita local, que pregava a rebelião contra o Estado e cujos hábitos motivavam, pelo menos desde há dois anos, atritos com os residentes.

Depois de Mocímboa da Praia, têm ocorrido dezenas de ataques que se suspeita estarem relacionados com o mesmo tipo de grupo, sempre longe do asfalto.

100 pessoas já morreram desde outubro de 2017

Os ataques têm acontecido fora da zona de implantação da fábrica e outras infraestruturas das empresas petrolíferas que vão explorar gás natural, na península de Afungi, distrito de Palma, na região, e cujas obras avançam com normalidade.

De acordo com números oficiais, cerca de 100 pessoas, entre residentes, supostos agressores e elementos das forças de segurança, morreram desde que a onda violência começou.

Agência Lusa, ar | em Deutsche Welle

Moçambique | Família de empresário português raptado entrega outra petição na Assembleia da República


Família do empresário português raptado em 2016, vai apresentar uma terceira petição na Assembleia da República de Moçambique, para pedir que as autoridades aceitem cooperação proposta por Portugal.

Familiares do empresário português raptado na província de Sofala, em 2016, vai entregar mais uma petição (terceira) na Assembleia da República de Moçambique, para pedir que as autoridades moçambicanas aceitem a cooperação judicial e judiciária proposta por Lisboa.

A mulher de Américo Sebastião, Salomé Sebastião, que estará em Moçambique a partir de quinta-feira (06.12.) e até quarta-feira (12.12.) da próxima semana para realizar uma série de diligências, espera que "esta insistência no Parlamento venha a ter frutos". 

"Da primeira petição, não temos conhecimento da tramitação, enquanto a segunda não foi considerada. Espero que seja diferente com esta terceira petição", disse à agência de notícias Lusa.

Salomé Sebastião, que também contactará a Provedoria da Justiça de Moçambique para que seja aceite a cooperação de Portugal, afirmou que, "após o encerramento do processo" judicial, em finais de outubro, "a família não desiste".

Petição na AR em maio de 2017

No esforço para encontrar o empresário português, Salomé Sebastião apresentou uma petição na Assembleia da República moçambicana em maio de 2017, algum tempo depois de ter solicitado, através de uma carta, ao Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, uma "intervenção direta".

Em maio deste ano, a "petição estaria no gabinete da senhora presidente" do parlamento moçambicano, Verónica Macamo, sem que tenha sido dado qualquer "conhecimento da tramitação" da solicitação, que "há mais de um ano e meio deu entrada na Assembleia da República de Moçambique".

Mais tarde, a mulher do empresário entregou também uma segunda petição, que, disse, não saiu do gabinete da presidente do parlamento com destino à Comissão de Petições nem foi arquivada.

Carta e não petição da família

A presidente da Assembleia da República de Moçambique, Verónica Macamo, disse que recebeu uma carta e não uma petição da família de Américo Sebastião.

"[A família] escreveu uma carta para mim, a pedir para eu intervir, não é petição-tipo, que é usada na Assembleia da República, mas uma carta, talvez tenham confundido com petição", afirmou Verónica Macamo, em declarações citadas pelo semanário Canal de Moçambique.

Macamo sublinhou que a família de Américo Sebastião pediu a sua intervenção e não da Assembleia da República no caso.

Salomé Sebastião pediu à Provedoria de Justiça de Moçambique que "recomende aos serviços convenientes da Assembleia da República que a petição (a primeira) seja tratada nos termos da lei".

Segurança de cidadãos portugueses

Em 12 de novembro, o Governo de Portugal transmitiu ao embaixador de Moçambique em Lisboa "forte preocupação para com a perceção de crescente insegurança" de cidadãos portugueses naquele país africano, agravada com o rapto e homicídio do empresário José Paulo Antunes Caetano.

O embaixador de Moçambique em Lisboa "foi igualmente informado de que o Governo português tenciona reforçar as medidas de informação e de sensibilização dos cidadãos nacionais que se desloquem ou residam em Moçambique".

O corpo de José Paulo Antunes Caetano foi encontrado sem vida perto de Maputo, capital de Moçambique, depois de ter sido pago o resgate exigido logo após o rapto do empresário.

Américo Sebastião foi raptado numa estação de abastecimento de combustíveis e continua desaparecido desde a manhã de 29 de julho de 2016, em Nhamapadza, distrito de Maringué, no centro de Moçambique.

Rapto perpetrado por homens fardados

Segundo a família, os raptores usaram os cartões de débito e crédito para levantarem "4.000 euros", não conseguindo mais porque as contas foram bloqueadas logo que foi constatado o desaparecimento.

Nunca mais se soube do paradeiro de Américo Sebastião desde o rapto, perpetrado por homens fardados, que algemaram o empresário e o colocaram dentro de uma das duas viaturas descaracterizadas com que deixaram o posto de abastecimento de combustíveis.

Portugal ofereceu por várias vezes a cooperação judiciária e judicial acordada entre os dois países para tentarem localizar Américo Sebastião, mas as autoridades moçambicanas recusaram.

Agência Lusa, ar | em Deutsche Welle

CPLP | "O país faz o que quiser não há mecanismo que obrigue a cumprir decisão"


A secretária-executiva da CPLP, Maria do Carmo Silveira, esteve em Berlim, onde participou num colóquio internacional sobre o contributo das mulheres na comunidade lusófona.

A secretária-executiva da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Maria do Carmo Silveira, disse em entrevista à DW África que a organização lusófona aguarda um sinal do futuro Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, no que concerne ao reforço da cooperação entre a nova presidência e a CPLP, espera que as reformas do Presidente João Lourenço tragam mudanças na vida dos angolanos, pede ajuda dos membros na integração da Guiné-Equatorial e nega que a CPLP seja uma organização com cariz comercial. 

DW África:  A CPLP é muito criticada pelos povos de ser uma organização muito pacífica e com menos presença na política interna dos países membros. Como é que explica esta situação?

Maria do Carmo Silveira (MCS) - Nós vivemos em democracia e em democracia há liberdade expressão e as pessoas são livres de pensar e agir. E, eu pessoalmente respeito a opinião dos outros. Agora, relativamente à questão da passividade da CPLP, o que posso dizer é que, a CPLP é uma organização intergovernamental, não é uma organização supranacional. Portanto, uma organização intergovernamental é um fórum de concertação e de partilha de boas práticas. Mas não existe mecanismos para obrigar qualquer Estado a cumprir alguma decisão da CPLP. Portanto, os Estados cumprem se quiserem, não é o mesmo, por exemplo, com a União Europeia, onde há uma decisão e essa decisão tem que ser de cumprimento obrigatório para os Estados membros, caso contrário haverá sanção. Não é o caso da CPLP, portanto, é uma organização intergovernamental, aí está a diferença. Nós não dispomos de mecanismos para obrigar qualquer Estado a acatar qualquer que seja a decisão. É esta a diferença que provavelmente algumas pessoas não entendem e acham que a CPLP podia ser mais interventiva. A CPLP, neste momento não tem instrumentos que permitam obrigar ou sancionar qualquer Estado pelo não cumprimento de uma decisão. Não havendo, naturalmente, fica limitada.

DW África: Com a entrada da Guiné-Equatorial na CPLP continuam a surgir vozes que entendem que a organização passou a ser mais comercial do que política?

(MCS) - Eu acho que não. A Guiné-Equatorial aderiu à CPLP e tem um roteiro para a sua adesão que está em curso. Esse roteiro contempla um conjunto de medidas como a promoção da língua portuguesa e outras medidas que estão em curso. Portanto, creio que é um Estado membro normal que tem que fazer o seu caminho, até porque a Guiné-Equatorial não sendo um país falante da língua portuguesa tem algumas dificuldades ainda na interação com outros e eu creio que é também dever da CPLP apoiar a Guiné-Equatorial na sua integração no seio da comunidade.

DW África: Questiona-se muito sobre o futuro da CPLP. A Organização tem futuro?

(MCS) - Acho que sim. É uma organização que está a fortalecer-se a cada vez mais, apesar das assimetrias que existem entre os Estados membros que eventualmente podia nos distanciar, mas pelo contrário, somos uma organização coesa e forte, aliás basta ver participação dos chefes de Estado, agora na última cimeira, estiveram quase todos presentes. Portanto, isso por si só é uma mensagem política muito forte de união e de compromisso político com a CPLP. E quando nos olhamos para países terceiros que querem aderir à CPLP com estatuto de observador associado, que neste momento, já são 19, quando os Estados membros são só 9, isso diz muito. Quer dizer que, de fora da comunidade, os outros países olham para nós com muito interesse. Quer dizer que existe um potencial grande que é extremamente importante.

DW África: E outro grande problema continua a ser a livre circulação das pessoas no seio do espaço da comunidade?

(MCS) - É uma questão muito importante. Há avanços que estão a ser feitos entre os países nesta questão da mobilidade, já existem muitos arranjos, quer bilaterais e quer mesmo multilaterais, para a mobilidade. Só que a aplicabilidade dessas medidas é que está um pouco, digamos, deficiente. Então, nós temos que verdadeiramente assumir todos os compromissos que foram assumidos nessa matéria e dar outros passos. Estou convencido que esses passos serão dados em prol dos cidadãos da nossa comunidade.

DW África: Qual é o papel da CPLP face à situação política de Moçambique em que a RENAMO continua a contestar os resultados eleitorais das autárquicas. O cenário pode pôr em causa o processo de paz. A CPLP está preocupada com o evoluir da situação?

(MCS) - A CPLP tem acompanhado a situação em Moçambique, embora, formalmente não tenha uma intervenção neste conflito. Temos estado a acompanhar as negociações entre o Governo e a RENAMO e esperamos que o desfecho de tudo isso seja uma pacificação duradoura de Moçambique, para o bem dos moçambicanos.

DW África: Como é que a CPLP olha para a eleição de Jair Bolsonaro como Presidente do gigante da organização, o Brasil?

(MCS) - Penso que a eleição refletiu a vontade de povo e a CPLP respeita essa vontade popular. Desejamos melhores sucessos ao novo Presidente e fazemos votos para que a sua eleição sirva para reforçar ainda mais os laços de cooperação e de amizade que existe entre o Brasil e todos os Estados membros da CPLP. Brasil é um Estado membro fundador da CPLP, bastante importante para a organização e a sua participação é importante.

DW África: Já há contatos como o novo Presidente do Brasil?

(MCS) - Ainda não tivemos. Naturalmente que nós felicitamos o novo Presidente pela sua eleição. E ficamos à espera de uma oportunidade para de fato poder receber uma resposta.

DW África: Como é que a CPLP vê as novas medidas de João Lourenço como Presidente de Angola?

(MCS) - O Presidente João Lourenço tem vindo a fazer algumas reformas extremamente importantes e que têm despertado a curiosidade da comunidade internacional e também da CPLP. Temos estado a acompanhar e fazendo votos para que tudo possa traduzir-se num sucesso para o desenvolvimento de Angola. No fundo, o que queremos é que os nossos países tenham estabilidade e possam desenvolver. E pensamos que em Angola existe essa estabilidade política e esperamos que as medidas que o o Presidente João Lourenço tem em carteira possam servir para relançar Angola no processo de desenvolvimento.

Braima Darame | Deutsche Welle

São Tomé | Jorge Bom Jesus elege combate à corrupção como prioridade do seu Governo


Novo primeiro-ministro sãotomense promete fiscalizar permanentemente a ação governativa de cada membro do executivo e não hesitar em "tomar medidas" de correção necessárias.

O Presidente de São Tomé e Príncipe, Evaristo Carvalho, deu posse esta segunda-feira (03.12.) ao primeiro-ministro, Jorge Bom Jesus, e aos membros do XVII Governo Constitucional, que integra 12 ministérios e duas secretarias de Estado. 

No seu discurso na cerimónia de posse, o chefe do décimo sétimo Governo constitucional sãotomense reconheceu que a situação económica e social que o país atravessa um momento difícil pelo que a sua missão será espinhosa.

"Para responder no curto prazo a crise energética, que ainda prevalece, os atrasos no pagamento dos salários, e das dívidas às empresas, a constante falta de medicamentos e consumíveis no hospital, as mudanças estruturais no setor da justiça e a aposta na consolidação do Estado de Direito democrático".

Mas como condição para enfrentar com o êxito os desafios, o novo primeiro-ministro conta com o total empenho da sua equipa de servir o povo.

"Eu acredito que todos somos capazes, mas cumprindo com uma condição fundamental: se os membros do Governo agora empossados assumirem de maneira clara e integral que estamos aqui para servir São Tomé e Príncipe e o progresso social do nosso povo", destacou Bom Jesus.

Desempenho será avaliado em permanência

O empossado defendeu por outro lado o combate à corrupção como uma das prioridades do seu Governo no qual os seus membros serão avaliados pelo seu desempenho.

 "Pela parte que me toca assumirei aqui, publicamente o compromisso de avaliar em permanência e com rigor necessário o desempenho dos membros do Governo e das direções intermédias da administração publica e tomar as medidas necessárias para corrigir o que for necessário", explicou.

Jorge Bom Jesus defendeu que "é um imperativo nacional que os responsáveis pela gestão danosa e pelos desvios de dinheiros e bens públicos comecem a ser criminalmente responsabilizados".

Dias melhores virão

O primeiro-ministro são-tomense, condenou o facto do seu antecessor, Patrice Trovoada, em parte incerta, não ter feito a "passagem da pasta" mas considerou que apesar de herdar uma situação difícil tudo indica que melhores dias virão.

No seu discurso, Jorge Bom Jesus garantiu ainda aos parceiros bilaterais e multilaterais a aplicação de uma política de "continuidade do Estado", envolvendo todas as instâncias implicadas com destaque explícito ao Presidente da República.

"Aos nossos parceiros internacionais e amigos de sempre, quero assegurar que teremos uma postura de continuidade de Estado e que a nossa política externa será uma política de Estado, envolvendo todos os atores institucionais e em particular o chefe de Estado", referiu.

Separação de poderes

Por seu lado, o Presidente da República, Evaristo de Carvalho, lembrou que o Governo, para executar o seu programa, deve basear-se na política de separação de poderes e interdependência de poderes entre os órgãos de soberania definidas pela Constituição da República.

"Significa dizer que apesar de separados politicamente, uns e outros são responsáveis perante outros o que permite, acima de tudo, defender os superiores interesses da nação", referiu Evaristo Carvalho.

O chefe de Estado dedicou "uma palavra de encorajamento" ao novo primeiro-ministro, considerando que a tarefa que espera o seu Governo "não se afigura fácil mas estamos confiantes que sabiamente encontrarão respostas aos anseios da população. Ao novo elenco governamental a minha total e inequívoca disponibilidade de cooperação pessoal, e institucional para defesa dos superiores interesses da nação".

Superiores interesses do país

Recorde-se que o Presidente da República Evaristo Carvalho nomeou na última quinta-feira (29.11.) Jorge Bom Jesus para chefiar o novo governo do arquipélago tendo justificado a decisão "com a correlação de forças no Parlamento e os superiores interesses do pais".

O executivo é composto por elementos do segundo e terceiro partidos mais votados nas eleições legislativas de 07 de outubro - Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe - Partido Social Democrata (MLSTP-PSD, com 23 assentos) e coligação PCD-UDD-MDFM (cinco mandatos) -- que assinaram um acordo pós-eleitoral com incidência parlamentar e fins governativos.

Este acordo assegurou a maioria absoluta às duas forças (28 deputados em 55) na Assembleia Nacional, uma vez que o partido vencedor, a Ação Democrática Independente (ADI) conseguiu apenas uma maioria simples (25 deputados).
"Democracia serve apenas para fazer eleições"

A professora da faculdade de letras da universidade Lisboa, Inocência Mata, disse em entrevista à DW África que o que se passa em São Tomé e Príncipe ilustra bem que a democracia serve apenas para fazer eleições e cita o caso de Patrice Trovoada, que, foi eleito através do sufrágio e comportou-se como um verdadeiro ditador.

"São Tomé e Príncipe é um caso evidente de que as eleições de 4 em 4 anos, seja lá do que for, de per si, não fazem de um regime, o regime democrático. O que se passa em São Tomé e Príncipe é que não existe uma democracia para além dessas eleições. E, nós vimos nos últimos 4 anos, como alguém que chegou ao poder através de uma democracia, Patrice Trovoada, se portou como um verdadeiro ditador, tentando controlar todos os órgãos de poder, de presidência aos tribunais”, afirma.

Instado a comentar a crise pós-eleitoral em São Tomé, Inocência Mata criticou a postura pouca democrática de Patrice Trovoada, e espera que a posse do novo Governo "ponha termo a crispação política que já dura dois meses, ou seja desde a realização das eleições legislativas", disse Inocêncio Mata à margem do colóquio internacional sobre o contributo das mulheres nos países africanos de língua oficial portuguesa, realizado em Berlim na passada sexta-feira (30.11.).

Ramusel Graça (São Tomé), Braima Darame | Deutsche Welle

Angola promete resolver problema dos angolanos indocumentados de longa duração em Portugal


Autoridades angolanas prometem resolver o problema dos angolanos indocumentados, residentes em Portugal. Segundo o Consulado de Angola em Lisboa, uma equipa técnica deverá começar a resolver o caso a partir de 2019.

A angolana Ana Maria Brito, de 56 anos, nasceu na aldeia de Samanguva, na província do Huambo, antiga Nova Lisboa. Veio para Lisboa com a madrinha um ano após a independência. Tinha então 13 anos de idade.

"Viemos para cá a 27 de março de 1976 por causa do conflito [armado]. Fugimos de Cuando Cubango, antiga Serpa Pinto. Dessa guerra entre a UNITA e a FNLA no Cuando Cubango, nós fugimos para o Calai. E depois do Calai, os sul-africanos mandaram-nos entrar para a Namíbia e dali viemos para aqui", conta Ana Maria Brito.

Hoje é mãe de três filhos nascidos em Portugal. Mas tal como a irmã continua sem nenhum documento angolano, mesmo depois de várias diligências junto do Consulado em Lisboa e de instituições portuguesas.

A Ana Maria Brito desabafa: "Escrevi uma carta para o cônsul, fui atendida pelo vice. Não tenho documentos nenhuns. Não tenho ajudas nenhumas. Nós vamos lá ao Consulado e é uma arrogância. Dá impressão que nós não somos angolanos também. Não somos nós que fizemos a guerra. Nós simplesmente fugimos."

Ana Brito diz que não sabe onde ir buscar uma certidão que prove o local de nascimento. Segundo lhe disse a madrinha, foi registada em 1969 para entrar para a escola, através de uma missão religiosa que já não existe: "Eu não tenho nenhum familiar lá em Angola a quem eu possa pedir para me tratar disto ou daquilo. Porque a minha mãe faleceu quando eu tinha 9 anos e fiquei com a minha madrinha. Tenho duas irmãs desaparecidas em Angola, não sei o nome delas, não sei onde é que estão. Não tenho maneira nenhuma de arranjar certidões.

"O Consulado tem que arranjar uma solução para nós", exige ela. Ana Brito é uma entre os muitos cidadãos angolanos indocumentados em Portugal.

Há casos complicados

A seguir à revolução de 25 de abril de 1974 em Portugal, com a chamada ponte aérea, muitos angolanos vieram para Lisboa sem papéis. "Há quem continue até então sem documentos", repete Jorge Silva, mediador sócio-cultural da Associação Solidariedade Imigrante junto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).

"Ainda há bastantes casos, de pessoas já com mais idade. Esses casos ainda são mais complicados, porque são pessoas que, por um lado, perderam a ligação à terra, perderam ligações familiares; com o passar do tempo começaram a estar mais afastadas - e não têm sequer qualquer hipótese de voltar ao país de origem para ir tratar dos documentos. Mas as dificuldades são tantas que elas deixam-se ficar [porque] não conseguem mesmo tratar desses documentos", esclarece Jorge Silva.

Alguns, entre os mais antigos, já desistiram, adianta Jorge Silva. Outros terão optado por ficar com o cartão de residência sem esperança de obter documentação, embora continuem com Angola no coração. A geração mais nova constituída por imigrantes angolanos, incluindo estudantes, também tem dificuldades em tratar dos documentos.

"As nossas embaixadas infelizmente não tratam documentos. Tudo acaba por ser remetido para Angola para ser feito em Angola para depois voltar para Portugal e então ser distribuído às pessoas", conta Jorge Silva.

Jorge Silva diz que as pessoas têm duas opções: ou vão a Angola fazer um novo documento, sendo o processo mais ou menos rápido, ou fazem o pedido junto do Consulado em Lisboa, mas ficam uma eternidade à espera, embora oficialmente se diga que demorará três a quatro meses. E isso tem uma implicação considerável na vida das pessoas, diz o ativista angolano.

Tudo pode mudar a partir de 2019

Contactado pela DW África, Mário Silva, vice-cônsul da Embaixada de Angola responsável por este processo, reconhece ter havido demora em responder às inquietações dos cidadãos por razões técnicas. Admite tratar-se de um problema antigo desde a ponte área, o que levou a desenvolver um trabalho de proximidade com a comunidade angolana desde 2010.

"E fruto desse trabalho, nós temos 120 angolanos nessas condições de indocumentados. Nós coordenamos com o Ministério da Justiça e Direitos Humanos de Angola no sentido de vir cá uma equipa técnica para trabalhar somente para resolver esse tipo de situação", conta Mário Silva.

A equipa estará em Lisboa no primeiro trimestre de 2019, de acordo com as orientações dadas pelo Presidente da República, João Lourenço, com a missão de dar resposta paulatina aos problemas dos indocumentados. De acordo com Mário Silva, é um problema que ficará resolvido a curto prazo.

"Também estamos a fazer a coordenação junto do Estado português para que o SEF (Serviços de Estrangeiros e Fronteiras) também dê um grande contributo porque essa nossa comunidade está a passar por determinadas situações, onde os seus filhos e os seus netos, infelizmente, ficam condicionadso de se regularizarem junto do Estado angolano", avança Mário Silva.

Recentemente, no âmbito deste processo de indocumentados, o Consulado entregou o respetivo passaporte ao nacionalista angolano, Adolfo Maria, que aguardou pelo novo documento durante oito anos, depois de muita pressão junto das autoridades de Luanda. Mário Silva revelou à DW África que o Consulado resolveu outros cinco casos semelhantes ao de Adolfo Maria.

Confiança do Presidente angolano

No encontro com a comunidade angolana em Portugal, a 23 de novembro último, o Presidente João Lourenço assegurou que os casos pendentes começarão a ser resolvidos no primeiro trimestre do próximo ano, nomeadamente a emissão de cédulas, bilhetes de identidade e passaportes.

"Portanto, as autoridades angolanas estão a criar condições - e posso dizer isso com segurança - para que no início do ano se instalem postos fixos aqui em Portugal. Evidentemente que não poderemos garantir que se instalem em todos os sítios onde temos a nossa comunidade. Eventualmente, alguns vão ter que andar alguns quilómetros para satisfazerem esse desejo", prometeu João Lourenço.

Ana Brito espera que, com as mudanças em Angola, seja possível sair da condição de cidadã ilegal em Portugal: "Eu acho que este senhor Presidente está a pensar em todos os angolanos. Não há angolanos de primeira nem angolanos de segunda. Somos todos angolanos. E Deus queira que venha essa equipa para resolver a nossa situação."

João Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle

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