sábado, 16 de fevereiro de 2019

Moçambique | Detenção de cinco arguidos "uma encenação teatral"?


Vinte e quatro horas após a detenção de cinco arguidos do processo instaurado pela justiça moçambicana em ligação com as dívidas ocultas continua a constituir manchete e a dominar as conversas nas redes sociais e não só.

Um total de cinco pessoas foram detidas na quinta-feira (14.02.) em ligação às chamadas dívidas ocultas, que lesaram o Estado moçambicano em mais de dois mil milhões de dólares, na sequência de empréstimos concedidos ilegalmente a três empresas.

As autoridades moçambicanas ainda não fizeram qualquer pronunciamento público sobre estas detenções, as primeiras que acontecem no âmbito de um processo instaurado em 2015 pela Procuradoria Geral da República (PGR) moçambicana.

Figuram entre os detidos o Administrador delegado das três empresas, António do Rosário, o ex-Director do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), Gregório Leão, e Bruno Tandade, operativo daquele serviço da secreta moçambicana.

O grupo inclui Teófilo Nhangumele, alegado promotor junto de Moçambique da ideia de criar as empresas e contratar o financiamento e Inês Moiane, Secretária pessoal do ex-Presidente Armando Guebuza na altura da contração dos empréstimos.

Formalização da detenção

Os cinco deverão ser ouvidos por um juiz até segunda-feira (18.02.) para a formalização da detenção.

O analista Fernando Lima considera que estas detenções podem constituir uma operação de teatro.

"A questão é que a PGR em Moçambique caiu num grande descrédito". Afirmou Lima a DW África para acrescentar "mesmo que isto seja um passo na direção correta há muito ceticismo e pessimismo em relação a esta detenção".

Para o analista, a detenção em si não significa muito porque "também assistimos há alguns meses atrás a detenção de três suspeitos de envolvimento num caso de corrupção em relação a compra de aviões para a companhia estatal de aviação aqui em Moçambique e uns dias depois estes três suspeitos foram soltos e até hoje nem sequer há data marcada para o seu julgamento".

Por seu turno, o analista Alexandre Chiure vê, igualmente, nestas detenções alguma encenação teatral.

"Primeiro, o processo que envolve estes cinco e mais outros treze ainda não fechou... está na fase preparatória ou primária, segundo, esse processo para ter pernas para andar precisa de um tipo de informação que a Procuradoria Geral da República pediu aos Estados Unidos da América, a Inglaterra e aos Emiratos Árabes Unidos para poder fechar o processo. Essa informação ainda não está nas mãos da Procuradoria".

Caso Manuel Chang

Várias vozes têm associado estas detenções à captura na África do Sul a pedido da justiça norte-americana do ex-ministro das Finanças de Moçambique, Manuel Chang, em ligação com as dívidas ocultas.

O analista Fernando Lima afirma que "claramente que as autoridades moçambicanas estão numa luta contra relógio para impressionar as autoridades quer sul-africanas quer norte-americanas de que estão a fazer qualquer coisa em relação a esta questão nomeadamente para tentarem assegurar que Manuel Chang seja extraditado para Moçambique".

As autoridades sul-africanas têm sobre a mesa dois pedidos de extradição de Manuel Chang nomeadamente de Moçambique e dos Estados Unidos da América.

Chang está a ser ouvido num tribunal em Joanesburgo e nesta sexta-feira (15.02.) viu recusado um pedido para responder em liberdade provisória mediante o pagamento de caução.

Sem surpresa decisão do tribunal sul-africano

O analista Alexandre Chiure afirma não ter ficado surpreendido com a decisão do tribunal tendo em conta as alegações do Ministério Público que manifestava receios de que Chang pudesse fugir.

"Esta recusa dá algum sinal de que as coisas poderão ser muito complicadas do ponto de vista de termos Chang aqui em Moçambique. Estou a falar de extradição a favor de Moçambique".

Para Fernando Lima a decisão demonstra que o tribunal tem reservas sobre as iniciativas das autoridades judiciais moçambicanas para conseguir a extradição de Chang mas também "demonstra que o caso elaborado pelo tribunal de Nova York é um caso sério e que impressionou favoravelmente as autoridades judiciais sul-africanas, neste caso o tribunal de Kempton Park".

Leonel Matias (Maputo) | Deutsche Welle

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