sexta-feira, 26 de julho de 2019

Angola | Da acção dos marimbondos ao Banco Mundial e o FMI


Luciano Rocha | Jornal de Angola | opinião

Muitos angolanos, cada vez em maior número, vivem nova fase de incertezas quanto ao presente e futuro imediato, que o outro, o mais longínquo - se viverem até lá - há-de apoquentá-los quando chegar.

Muitos angolanos, designadamente os da cidade, são assim. E, por essa forma de estar na vida, além das interrogações que ciclicamente se colocam a eles próprios, têm, também, como é lógico, frequentes “amargos de boca”, que não há mbrututu, “laranja do Loje” mel ou açúcar que lhes valha. Por mais sustos pelos quais passem, mesmo que, nas fases de maior aperto, prometam “corrigirem-se”, quando dão por ela estão, em roda de amigos, a rirem-se deles próprios, vangloriar-se da forma como deram a volta à situação. 

Quando a crise económica internacional rebentou, muitos de nós mantivemos o nível de vida, com o qual jamais tínhamos pensado pouco tempo antes. Isto, mesmo que nos chegassem, ao momento, imagens e testemunhos dramáticos de encerramentos, quase que em catadupa, de empresas, algumas, até então, das mais prestigiadas a nível mundial. Com o consequente desemprego de famílias inteiras, que, de um dia para o outro, se viram a viver na rua. Por terem perdido a casa, cuja prestação de compra não pagaram na data estipulada, e a comerem o que lhes era dado por instituições de caridade. Todo este cenário dantesco era, não raro, acentuado com as cores da morte por suicídio daqueles a quem nada mais restava na vida do que o desespero.

A crise internacional era, para alguns de nós, algo de muito lá longe! Aonde se ia de férias e era recebido como marajá. Assim, os angolanos ganharam fama - e parte deles proveito - de encher restaurantes luxuosos já sem hábitos de clientes, cujos empregados e proprietários não se cansavam de lhes fazer vénias.

O petróleo que sustentava as vaidades pacóvias características do novo-riquismo continuava, assim, a servir para alguns de nós irem pavonear-se lá fora. E viverem cá dentro, num “país de fantasia”. Até que um dia, a crise bateu-nos à porta sem estarmos minimamente preparados para a receber. Então, todos perceberam, mesmo os menos atentos, que afinal a propagandeada Angola próspera era tudo menos isso. 

Muitos foram os angolanos que se sentiram atordoados, como se o mundo inteiro lhes tivesse desabado em cima. Maldisseram, então, a vida, o que tinham gasto sem dever, comprado sem poder. Pior ficaram quando verificaram que a crise que lhes abalava o dia-a-dia não era para todos. A mesma escumalha que os levara a acreditar numa terra, onde cada vez mais, havia de apetecer viver, tinha afinal desbarato o erário em proveito próprio. Para encher os bolsos, não hesitara em pôr em causa a vida dos mais humildes entre os humildes, o futuro de crianças, a segurança nas estradas, o escoamento de produtos alimentares. Muitos desses larápios, cientes, desde sempre, do mal que causavam ao país e ao povo que não honravam, antes que se lhes descobrissem as manigâncias, puseram o dinheiro no estrangeiro. E dele - e com ele - vivem alheios ao sofrimento das vítimas que causaram.

Muitos angolanos, mal refeitos da crise e dos rombos no erário, rejubilaram com a disposição do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial apoiarem o país, mas já começam a torcer o nariz, esquecendo-se que qualquer das duas instituições não é de caridade. Fazem pagar-se e bem. E sabem como receber o que emprestam sob garantias. 

A verdade é que se o dinheiro público não tivesse servido de “cofre sem fundo” a uma minoria que se julgou - julga - integrante de uma casta de eleitos, acima de todos os mortais, muito provavelmente não tínhamos agora, entre nós, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial.

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