terça-feira, 30 de julho de 2019

Câmara de Contas timorense aponta irregularidades na adjudicação de obras públicas


Díli, 30 jul 2019 (Lusa) - A Câmara de Contas timorense criticou a forma como as obras públicas são adjudicadas e geridas em Timor-Leste, com certificações dadas a "empresas de fachada", falta de supervisão e fiscalização dos projetos e recurso excessivo ao ajuste direto.

As conclusões fazem parte de um extenso relatório da Câmara de Contas (CC), a que a Lusa teve acesso, que questiona algumas das práticas da gestão de obras públicas, manifestando "reservas" sobre os "certificados de empresas de construção civil" atribuídos.
No relatório, a CC diz ter detetado "a emissão de 'certificados' a empresas de fachada, que não dispõem sequer de escritório, máquinas ou funcionários" -- o que "constitui um indício da prática de atos com relevância criminal".

Além disso, nota, "a adjudicação de obras a empresas por valores acima dos limites autorizados pelos respetivos certificados e a adjudicação de contratos com valores de vários milhões de dólares a empresas não certificadas, são exemplos paradigmáticos e preocupantes sobre a forma como o setor das obras públicas tem sido gerido pelo Ministério das Obras Públicas" (MOPTC).

O relatório de análise, dividido em três volumes, apresenta os resultados de uma "Auditoria de Conformidade à Execução do Orçamental do Fundo das Infraestruturas" no ano de 2015, ainda que "alargado a anos anteriores e posteriores" em casos considerados pertinentes.

"O Sistema de Controlo Interno em matéria de execução das obras públicas é fraco", nota o relatório, que aponta o dedo ao Conselho de Administração do Fundo de Infraestruturas e a várias Ministérios, especialmente o de Obras Públicas, Transportes e Telecomunicações.


O fundo é, desde 2011, o principal veículo para os grandes investimentos do Estado na construção de infraestruturas, tendo atingido em 2012 o seu valor mais elevado (875,1 milhões de dólares, 787 milhões de euros) -- dos quais apenas executou 45%.

Entre 2011 e 2015 foram realizadas despesas com infraestruturas, através do fundo, no valor total de 1,6 mil milhões de dólares (1,43 mil milhões de euros), dos quais 957,6 milhões (59%) com o Programa Eletricidade e 349,3 milhões (21%) com infraestruturas relacionadas com Transportes (estradas, pontes, aeroportos e portos).

A Câmara de Contas diz que no período analisado "o CAFI extravasou as suas competências em matéria de alterações orçamentais" porque "alterou os orçamentos dedicados aos vários programas (e projetos) sem considerar as respetivas finalidades" determinadas no OGE.

"O orçamento foi alterado livremente para permitir, por um lado, o pagamento de contratos que não se encontravam previstos nem orçamentados no FI, e outros projetos cuja execução foi muito além do valor orçamentado, como é o caso das estradas urbanas", nota.

"Estas alterações resultam na não-execução de um grande número de projetos que se encontravam previstos e orçamentados", sublinha, referindo que 93 (54,1%) do total de 172 projetos "previstos e orçamentados no OGE retificativo não tiveram qualquer execução financeira".

O relatório nota que "a quase totalidade das obras públicas incluídas no FI não é objeto de supervisão/fiscalização)" que ocorre quase só em projetos financiados por entidades internacionais e como "imposição destas entidades e não de uma decisão livre do Governo".

"Parece verificar-se uma tendência de contratar empresas consultoras para fiscalizar as obras realizadas por empresas internacionais, deixando as obras realizadas por empresas nacionais sem qualquer fiscalização", refere o documento.

O relatório aponta ainda a "prática preocupante" de que "os serviços do MOPTC assinem e aprovem certificados de pagamento apresentados pelas empresas em que constam percentagens de execução muito superiores às verificadas de facto".

"A assinatura e aprovação de certificados de pagamento por funcionários, dirigentes e membros do Governo, que não reflitam, de facto, o progresso físico da obra, faz estes incorrer, nomeadamente, em responsabilidade financeira pela prática de tais atos", considera.

A Câmara de Contas levanta várias questões relativamente ao sistema de controlo interno do FI, que considera "razoável", tendo em conta que permite gerir anualmente centenas de projetos.

Ainda assim, aponta vários problemas incluindo o facto de "existirem projetos que apresentam execução financeira sem que os contratos a eles subjacentes tenham qualquer relação com o projeto", como é "exemplo mais flagrante o do programa Turismo".

ASP // VM

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