Díli, 30 jul 2019 (Lusa) - O
ex-primeiro-ministro timorense Xanana Gusmão rejeitou qualquer irregularidade
no programa de reabilitação de estradas em Díli, num texto enviado à Câmara de
Contas, após uma auditoria à execução orçamental do Fundo de Infraestruturas em
2015.
Xanana Gusmão afirmou, no texto,
que o Governo teve em conta a realidade do país, e quis apoiar as empresas
timorenses e melhorar a eficácia das obras.
Estas são algumas das linhas
essenciais do texto de contraditório que Xanana Gusmão enviou, em seu nome e de
ex-governantes, na sequência de um relatório da Câmara de Contas (CdC), que fez
uma auditoria à execução orçamental do Fundo de Infraestruturas em 2015.
Xanana Gusmão, que em 2015 era
primeiro-ministro, e posteriormente ministro do Planeamento e Investimento
Estratégico, respondeu à Câmara de Contas em nome de todos os membros do
Conselho de Administração do Fundo de Infraestruturas (CAFI).
O ex-primeiro-ministro lembra que
uma fatia significativa das obras públicas tinha, até então, sido atribuída a
empresas internacionais que "instalam-se em Timor, executam a obra, fecham
as portas e vão embora", pelo que defende "discriminação
positiva" em prol de empresas timorenses.
"Estamos convencidos que é
uma função do Governo a capacitação das empresas nacionais, preferindo a sua
contratação em relação a empresas estrangeiras, sempre que tal contratação não
represente um aumento de custos para o erário público", refere o texto.
"Precisamos de mais empresas
nacionais, com mais experiência, para que estas possam, no médio/curto prazo
apresentar-se aos concursos públicos internacionais em pé de igualdade com os
gigantes internacionais", sublinha.
Como exemplo do desequilíbrio, o
contraditório nota que 78% de todos os contratos atribuídos pelo Fundo de
Infraestruturas (FI) entre 2011 e 2018, no valor de mais de 2,46 mil milhões de
dólares (cerca de 2,3 mil milhões de euros) foram para empresas internacionais.
Empresas timorenses receberam
apenas 22% dos contratos num valor de 680 milhões de dólares, sendo que nesse
grupo fazem parte 'empresas afiliadas' de empresas internacionais, como a
espanhola San Jose (25,56 milhões) ou a portuguesa Ensul (6,54 milhões).
O texto rejeita igualmente as
críticas sobre o não cabimento orçamental do programa, e defende essa
necessidade por não haver orçamentos plurianuais e de alguns projetos avançarem
mais rapidamente que outros.
O contraditório defende a opção
de avançar com urgência no programa, notando que na altura, a realização de um
concurso público internacional demorava entre um e dois anos, que seria
ampliado dado o número de concursos e a falta de recursos da Comissão Nacional
de Aprovisionamento (CNA).
Nota ainda a "incapacidade
técnica" que se tinha vindo a demonstrar na gestão de contratos de obra
pública de grande dimensão, que se prolongaram no tempo e que evidenciaram
graves problemas.
Daí, explica, ter sido deliberado
no CAFI optar por contratos "mais pequenos, com menor volume de trabalhos
a serem executados, tornando a sua gestão e fiscalização mais fáceis".
Essa solução, sustenta, mostra
que foi possível "reduzir os custos totais, conseguir uma gestão mais
eficaz", e "refuta por completo todas as afirmações do relato
referentes a uma divisão artificial da obra pública para escapar ao controlo
jurisdicional das infraestruturas rodoviárias".
O texto questiona os critérios
usados pela CdC para afirmar que houve intencionalidade dolosa na divisão de
trabalhos entre os diferentes contratos, afirmando que atuou tendo em conta os
interesses do país.
O texto defende a decisão do CAFI
de aplicar a autonomia de que goza o fundo para alterar programas e projetos
durante o ano, frisando que isso ocorreu pelo "atraso em alguns projetos e
a necessidade de avançar urgentemente com outros".
Os governantes explicam a motivação
do programa de estradas, considerando-o urgente para lidar com as vias
"muito degradadas" da capital que, em muitos casos, só permitiam a
circulação de veículos todo-o-terreno.
"Impunha-se, no âmbito da
política de mobilidade urbana conferir as condições necessárias para
transformar a cidade numa urbe onde os veículos ligeiros (muito mais acessíveis
financeiramente) fossem capazes de circular", nota o contraditório.
Responder aos problemas das
cheias que as fortes chuvas sazonais provocavam em Díli foi outra das
motivações, tal como a decisão de melhorar os sistemas de drenagem "muito
degradados", no âmbito do programa de reabilitação das estradas.
Finalmente, o documento refere-se
ainda aos esforços do Governo para erradicar a malária em Timor-Leste, o que
exigia melhorias no sistema de escoamento das águas. A doença foi totalmente
eliminada em 2017, com praticamente nenhum caso registado desde 2013.
Xanana Gusmão critica a
metodologia seguida pela CdC, "ultrapassando de forma sistemática aquilo
que deveria ser uma auditoria de conformidade", contestando igualmente que
a instituição, em vez de se concentrar apenas em 2015, "extravasa
manifestamente" esse período na análise feita.
Isso implica, sustenta, que da
auditoria se devem retirar as referências a vários dos projetos por serem
anteriores a 01 de janeiro de 2015 ou posteriores a 31 de dezembro desse ano.
O ex-PM considera que o relato da
CdC "prossegue outros objetos ou fundamentos que não os
estabelecidos" pela instituição, ou neste caso, uma auditoria à
conformidade à execução orçamental do FI em 2015.
Em vez disso, considera, o relato
"analisa e opina aleatoriamente sobre a execução de empreitadas de obras
públicas, o preço do crude no mercado internacional, o regime jurídico de
certificação de empresas, a qualidade da engenharia", entre outros
aspetos.
"Opina sobre o que quer. E,
surpreendentemente parece esquecer de opinar sobre como decorreu a execução da
dotação orçamental", refere.
"O relato limita a 17
singelas páginas descritivas e sem qualquer observação, pelo que o resultado da
auditoria só pode ser o de o FI ter executado o seu orçamento, durante o ano de
2015, em conformidade", sublinha.
ASP // EJ
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