«Como é óbvio, não se trata de
considerar impróprio um abstrato museu sobre o salazarismo. Creio que o ponto
fundamental é outro: é que os museus têm contexto e estão inseridos num
território. O discurso produzido no local – e a experiência da visita – ficará
determinado pelo complexo memorial onde o museu se inscreve: a antiga escola, a
casa e os seus objetos domésticos, os espaços onde o ditador se fez moço, a
campa rasa para atestar a imagem desse político que se representou como
antipolítico e como humilde e desinteressado servidor da nação.»
Miguel Cardina, Ainda a história do «Museu Salazar»
Miguel Cardina, Ainda a história do «Museu Salazar»
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«O sobrinho neto do ditador português, Rui Salazar, é o grande entusiasta da iniciativa. Conheci Rui Salazar há uns anos. Vive num mundo paralelo. Solitário, rodeado dos livros do tio, das garrafas que o tio guardava na adega, dos sapatos e roupas velhas do tio, dos relatórios e contas dos quase 40 anos que levou de presidente do conselho (números que sabia de cor). O homem era simpático e lunático. (...) Confesso que ao ouvir um autarca avançar com a ideia do Museu Salazar, nos mesmos moldes que o sobrinho defendera numa conversa comigo vinte anos antes, me arrepiei.».»
Luís Osório, Postal do dia
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Joana Lopes, Museus de Ditadores
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«Se o museu sobre Salazar em Santa Comba Dão se apresenta, como li, como um
"centro interpretativo do Estado Novo", gostaria que os promotores me
esclarecessem se: 1. Terá uma secção, explícita e sem rodeios, sobre as
torturas e encarceramentos pela PIDE; 2. Terá uma secção, explícita e sem
rodeios, sobre o corporativismo que reprimiu os sindicatos, e sobre o apoio dos
e aos monopólios das grandes famílias empresariais; 3. Terá uma secção
explícita sobre pobreza e analfabetismo, sem uma desculpa histórica,
considerando que tais problemas não se verificavam em muitos contextos europeus
de então; 4. Terá uma secção, explícita e sem rodeios, sobre o racismo oficial
das primeiras décadas do regime, o trabalho obrigatório nas colónias, o
estatuto do indigenato, e a guerra colonial; 5. Terá uma secção, explícita e
sem rodeios, sobre o tratamento das mulheres como cidadãs de segunda, tuteladas
em tudo por pais e maridos; 6. Terá uma secção, explícita e sem rodeios, sobre
o tratamento de gays e lésbicas como doentes e criminosos, encaminhados para a
Mitra ou para tratamentos psiquiátricos violentos; 7. Terá uma secção que
contextualize a ditadura no mundo de então, no qual havia democracias
perfeitamente funcionais. Outras questões se colocariam, mas creio que estas
são suficientemente - como dizê-lo? - "interpretativas"...»
Miguel Vale de Almeida, O museu de Santa Comba dá?
«É quando o discurso sobre o passado deixa de ser politicamente relevante que esse passado se pode repetir. A memória da nossa ditadura não é o único elemento que trava o crescimento da extrema-direita, mas conta. A democracia não sobrevive quando se instala a ideia que entre ela e a ditadura há apenas divergências de opinião. Não trata os seus inimigos da mesma forma que trata os seus aliados. Tem os seus códigos, os seus rituais, a sua iconografia e o seu discurso oficial. Que podem integrar os que não se revêm nela, mas não lhes dão dignidade simbólica. A tolerância democrática acaba onde começa a sua destruição. Não há temas e personagens tabu. Salazar deve ser estudado e revisitado. Mas um museu sobre o ditador não pode servir para celebrar, branquear e normalizar a ditadura.»
Daniel Oliveira, A democracia recorda a ditadura, não a normaliza
Miguel Vale de Almeida, O museu de Santa Comba dá?
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«É quando o discurso sobre o passado deixa de ser politicamente relevante que esse passado se pode repetir. A memória da nossa ditadura não é o único elemento que trava o crescimento da extrema-direita, mas conta. A democracia não sobrevive quando se instala a ideia que entre ela e a ditadura há apenas divergências de opinião. Não trata os seus inimigos da mesma forma que trata os seus aliados. Tem os seus códigos, os seus rituais, a sua iconografia e o seu discurso oficial. Que podem integrar os que não se revêm nela, mas não lhes dão dignidade simbólica. A tolerância democrática acaba onde começa a sua destruição. Não há temas e personagens tabu. Salazar deve ser estudado e revisitado. Mas um museu sobre o ditador não pode servir para celebrar, branquear e normalizar a ditadura.»
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Daniel Oliveira, A democracia recorda a ditadura, não a normaliza
Postado por Nuno Serra em Ladrões de Bicicletas
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