A AfD cai nas pesquisas devido a posições conflituosas sobre a pandemia e divide-se internamente por causa da expulsão
de membro de ala radical. Apesar de abalada, a AfD deve seguir atraente como
voz de protesto no leste do país.
Ben Knight (md)*
O partido populista de direita
mais bem-sucedido da Alemanha no pós-guerra está abalado – dividido na
estratégia para a pandemia do novo coronavírus e numa guerra interna –
mas isso não significa que esteja morto.
A liderança da Alternativa para a
Alemanha (AfD) lançou na semana passada uma granada de mão metafórica no
partido ao expulsar Andreas Kalbitz, chefe do partido no estado oriental de
Brandemburgo e membro proeminente da Der Flügel (a ala), facção extremista da
agremiação, que representa entre 20% e 40% dos membros. Enquanto isso, o
partido em Brandemburgo permaneceu leal a Kalbitz, votando na segunda-feira
para mantê-lo na bancada da AfD na assembleia local.
A reunião em que a expulsão foi
decidida, na semana passada, teria sido tensa, com uma votação apertada. Até as
figuras de maior peso do partido ficaram divididas: os líderes parlamentares da
AfD no Bundestag (Parlamento alemão), Alice Weidel e Alexander Gauland, votaram
por manter Kalbitz, enquanto Jörg Meuthen, um dos presidentes do partido,
apenas conseguiu aprovar sua moção com margem estreita.
Protestos de anti-isolamento
Esse rancor interno não chega em
boa hora para a AfD, que se tem digladiado para estabelecer uma posição a
respeito da pandemia de coronavírus. Nas últimas semanas, o partido caiu em
algumas pesquisas nacionais para menos de 10% da preferência do
eleitorado.
No início de março, a AfD exigiu
que o governo fechasse as fronteiras nacionais da Alemanha, com alguns
políticos tentando ocasionalmente culpar migrantes pelo surto do vírus. Agora,
o partido vai na boleia dos protestos anti-isolamento social. Os apoiantes da
AfD têm sido uma presença notável em tais eventos, e numa postagem no Facebook
publicada no sábado, Meuthen condenou a maneira como aqueles que criticam as
medidas de distanciamento estão sendo tachados de "negacionistas do
coronavírus".
Para Florian Hartleb, cientista
político alemão e especialista em populismo de extrema direita, a AfD "não
sabia exatamente o que fazer com o coronavírus". "Eles apoiaram o
rumo de Angela Merkel no Parlamento, agora estão basicamente começando a
resistir", diz.
Mas Ronald Gläser, porta-voz da
AfD em Berlim, insiste que o partido tem sido "algo como uma
vanguarda" para a Alemanha. "No final de fevereiro, início de março,
pedimos o fecho de fronteiras e dissemos que as máscaras precisavam de ser
fornecidas, e o governo dizia: 'Oh, nós não precisamos disso, elas não ajudam
de qualquer maneira'", afirma, em entrevista à DW.
"Agora é claro que fomos
poupados do pior, e é por isso que o partido mudou para exigir medidas mais
flexíveis", disse Gläser. "Apoiamos especialmente o direito de
realizar manifestações políticas. Não convocamos as pessoas a protestar no
sentido de que estejamos 100% de acordo com todas as demandas, mas muitas das
preocupações dos manifestantes são justificadas."
Nazis ou não?
O caso Kalbitz expôs o dilema da
AfD: o partido tem sua base de poder no leste da Alemanha, onde substituiu os
antigos comunistas como voz de protesto e de desafio à política dominante. Nos
estados da Turíngia, Saxónia e Saxónia-Anhalt, a AfD obteve cerca de 25% dos
votos nas últimas eleições estaduais.
Em Brandemburgo, estado
escassamente povoado que circunda Berlim, a AfD tem grande popularidade. O
próprio Kalbitz realizou uma campanha bem-sucedida nas eleições do ano passado,
conquistando um em cada quatro eleitores locais. O partido ainda tinha 20% nas
pesquisas de popularidade há um mês, fazendo dela o segundo partido mais forte
no estado.
O dilema perene da Afd é: até que
ponto o partido deve acomodar sua base extremista –atualmente centrada no
teimoso e poderoso líder da agremiação na Turíngia, Björn Höcke, sem assustar
os eleitores conservadores mais centristas que almeja?
Hartleb diz que a influência da Der
Flügel ainda é enorme, apesar de ter sido ordenada sua dissolução oficial
depois que o Departamento Federal para a Proteção da Constituição (BfV, serviço
secreto interno alemão) colocou o grupo na lista de entidades extremistas sob
observação do órgão.
Como Hartleb aponta, uma olhada
nos comentários nos grupos da AfD no Facebook mostra que Meuthen se tornou um
inimigo para muitos apoiantes da AfD.
"Os radicais do partido têm
um ídolo: esse é Höcke. Eles têm um mártir: este é o senhor Kalbitz, e eles têm
um inimigo, o senhor Meuthen", aponta o cientista político. "Não
estamos falando apenas de oeste e leste, estamos falando de uma divisão real
dentro do partido. O conflito tem a ver com muito mais do que Kalbitz."
O cofundador da AfD Alexander
Gauland defendeu publicamente Höcke, insistindo no ano passado que o
controverso ex-professor de história do oeste da Alemanha estava "no
centro do partido". O próprio Höcke derrotou as tentativas anteriores de
expulsá-lo do partido.
"O partido está realmente ligado
aos seus extremistas. Höcke não vai desistir", aposta Hartleb. "Acho
que é mais provável que Meuthen renuncie e os radicais assumam o partido, e
haverá uma divisão."
O padrão é familiar na curta
história da AfD, com líderes relativamente moderados, como Bernd Lucke e Frauke
Petry, sendo constantemente expulsos por seus sucessores abertamente
nacionalistas. No entanto, com o histórico de escândalos do partido, Hartleb
não acha que essa crise derrubará a AfD.
"Eles são fortes demais no
leste da Alemanha, onde estão profundamente enraizados na sociedade",
explica. "Vejo um declínio no oeste, talvez, mas não acho que tenha
acabado para a AfD."
Na imagem: Andreas Kalbitz (com
Jörg Meuthen à esq.) foi expulso da AfD por ligação com grupo neonazista
*Ben Knight (md) | Deutsche Welle
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