Pedro Ivo Carvalho
| Jornal de Notícias | opinião
A estratégia da TAP para o
Aeroporto Francisco Sá Carneiro é a equivalente à de uma organização
humanitária falida que quer continuar a aparecer na capa das revistas como boa
samaritana: distribui umas migalhas aos indígenas para não ser acusada de os condenar
à fome.
Como método, é uma nódoa, como
tentativa de fuga, é embaraçoso. Sobretudo porque os indígenas habitam na
Região Norte, logo aquela que, nos últimos anos, mais tem contribuído para a
produtividade do país.
Esqueçam as capelas partidárias,
as bandeiras ideológicas e os regionalismos bacocos. Ao esvaziar o segundo
aeroporto nacional (o qual, recorde-se, serve uma área geográfica e económica
que se espraia do Alto Minho a Aveiro), a TAP assume a condição de companhia
sectária, desligada dos interesses coletivos e, ironia suprema, a milhas da
lógica de serviço público que tem sido invocada como razão cimeira para a
salvarmos da bancarrota com os nossos impostos. Se é para isto, mais vale
deixarmos o cheque de mil milhões de euros em terra. Não faltam
destinos para lhe dar.
Por isso, bem pode o
primeiro-ministro lançar avisos sonoros para nos descansar, e bem pode o
ministro dos Transportes fazer voz grossa aos acionistas privados que agora
quer disciplinar. O resultado está à vista: nem que seja por omissão, o
desprezo a que a TAP votou o Norte teve o beneplácito do Governo da República.
Eles querem mandar, mas não mandam nada. Ou então é pior: são coniventes com
este voo rasante de uma empresa que precisa de ser salva de si própria.
Rui Moreira tocou na ferida: a
condição híbrida da TAP (é privada, mas também é pública e, no final, não é
coisa nenhuma) tem propiciado um histórico desenhado à base de prejuízos e, no
caso concreto do Porto, degenerou num absurdo sob a forma de três voos
semanais. A TAP justifica a palidez expansionista com a falta de mercado no Sá
Carneiro, mas parece ignorar que esse mesmo mercado vai ser ocupado por
companhias aéreas internacionais que não têm obrigações de serviço público. Falácia, portanto. Depois, e mais grave, esta decisão não pode ser desligada do
atual contexto do país: castigar a região que mais produz e mais exporta, a
região motor da economia, era, em circunstâncias normais, incompreensível.
Fazê-lo num cenário de enorme debilidade estrutural e de retoma pós-pandemia, é
simplesmente irresponsável e vergonhoso. É para isto que queremos salvar a TAP?
*Diretor-adjunto
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