Dissidentes
no Reino Unido discutem resposta à imposição da nova lei de segurança nacional
na região administrativa especial chinesa. Washington e Londres movimentam-se
contra Pequim.
António Saraiva Lima | Público
Um
grupo de activistas pró-democracia de Hong Kong residentes no Reino Unido está
a discutir a possibilidade de criar um parlamento da região administrativa
especial chinesa no exílio. O plano faz parte de uma resposta à entrada em
vigor da nova lei de segurança nacional no território, imposta pela República
Popular da China, que os críticos dizem pôr em causa o estatuto de
semiautonomia e a independência judicial de Hong Kong.
Em
declarações à Reuters, o activista Simon Cheng, residente em Londres, explicou
que mesmo que se trate de uma instituição representativa “não-oficial”, um
parlamento fora de portas transmite uma mensagem firme da diáspora em defesa da
democracia e da liberdade no antigo território britânico – transferido de volta
para a China em 1997.
“Um
parlamento ‘sombra’ pode enviar um sinal muito claro para Pequim e para as
autoridades de Hong Kong, de que democracia não está à sua mercê”, defendeu
Cheng, um antigo funcionário do Governo britânico que diz ter sido espancado e
torturado pela polícia secreta chinesa e que fugiu para o Reino Unido há dois
anos.
“Queremos
instituir grupos civis não-oficiais, que reflictam verdadeiramente as opiniões
da população de Hong Kong”, acrescentou o activista.
Apesar
de a discussão sobre uma representação no exílio ainda estar numa fase muito
precoce, activistas como Cheng acreditam que o apoio à ideia pode crescer nos
próximos tempos, particularmente junto da comunidade de Hong Kong no Reino
Unido, que deverá aumentar ainda mais, na sequência da promessa do Governo de
Boris Johnson de abrir caminho à nacionalidade britânica para cerca de 3
milhões de cidadãos da região administrativa.
Para
além disso, receando serem alvo de perseguição ao abrigo da nova lei, muitos grupos
pró-democracia suspenderam as suas actividades em Hong Kong e
transferiram-nas para países como Reino Unido, Austrália e Japão, ou para
Taiwan, pelo que se espera um aumento de iniciativas de pressão mediática à
China, como a de Cheng.
“Estamos
a desenvolver formas alternativas de lutar pela democracia. Temos de ser
espertos ao lidar com a expansão do totalitarismo: eles [China] estão a ser
mais musculados na repressão, por isso nós temos de ser mais subtis e ágeis”,
disse o activista à Reuters.
Prisão
perpétua
A
polémica lei de segurança nacional foi discutida
e aprovada pelo Congresso Nacional do Povo da China e promulgada pelo
Presidente Xi Jinping, sem a participação do parlamento de Hong Kong, e entrou
no ordenamento jurídico da cidade na terça-feira à noite.
No
dia seguinte, pelo
menos dez, das cerca de 370 pessoas detidas pela polícia por
protestarem nas ruas, foram acusadas de violar a nova legislação que, entre
outras medidas, estabelece condenações que podem ir de dez anos até à prisão
perpétua para os crimes de secessão, subversão, terrorismo e conluio com forças
estrangeiras.
Apesar
de residir no Reino Unido, Simon Cheng e outros naturais de Hong Kong não estão
a salvo da lei, já que a mesma também se aplica a cidadãos no estrangeiro.
A legislação cria
ainda um gabinete de segurança nacional chinês com poderes para enviar
casos para julgamento na China continental, estabelece o princípio do primado
do direito chinês sobre as leis da região administrativa e oferece ao executivo
de Hong Kong – subordinado a Pequim – competências para nomear juízes para
avaliarem os casos de perigo para a segurança nacional.
EUA
reagem
Segundo
os analistas, as disposições da lei foram escritas de forma a dar o máximo de
amplitude interpretativa a quem decide sobre cada caso.
Os
críticos da lei incluem os Estados Unidos, a União
Europeia, o Reino Unido, o Japão ou a NATO, que acusam a China de estar a
violar o princípio “um país, dois sistemas” e a Lei Básica de Hong Kong, que
lhe atribui o estatuto de região administrativa especial.
“A
lei de segurança nacional que a China aprovou e está a impor a Hong Kong é uma
traição aos seus compromissos internacionais e é inaceitável para os amantes da
liberdade de todo o mundo”, disse esta quinta-feira o vice-presidente dos EUA,
Mike Pence, numa entrevista à CNBC.
As
declarações de Pence surgem um dia depois de o Congresso dos Estados Unidos ter
aprovado um pacote de sanções que penaliza os bancos envolvidos em negócios com
oficiais chineses – que acresce à promessa do Presidente Trump de acabar
com o estatuto especial comercial de Hong Kong.
Pequim
deverá responder a Washington, tal como ameaçou contestar os planos de Londres,
sobre a aquisição de cidadania britânica pelos cidadãos de Hong Kong, com
“medidas correspondentes”.
“Se
os britânicos fizerem mudanças unilaterais às práticas em causa, estarão a
violar a sua própria posição e as suas reivindicações, para além do direito
internacional e das regras básicas”, lembrou a embaixada da China no Reino
Unido, num comunicado citado pela BBC.
Imagem:
Miguel Candela / EPA
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