Manlio
Dinucci*
A
guerra no Afeganistão foi lançada, oficialmente, para vingar os ataques de 11
de Setembro de 2001. No entanto, já tinha sido preparada antecipadamente.
Durante duas décadas, explicamos nestas colunas que é a primeira de uma longa
série de guerras destinadas a destruir todas as estruturas estatais do Médio
Oriente alargado (estratégia Rumsfeld/Cebrowski), a fim de controlar a
exploração dos recursos naturais. A guerra, que devia durar duas semanas,
prossegue há 19 anos. Está planeada para persistir o maior tempo possível.
Hoje, as personalidades ligadas ao Pentágono estão a sabotar a retirada parcial
concluída pelo Presidente Trump.
Centenas
de milhares de vítimas civis, mais de 2.400 soldados americanos mortos (e mais
um número desconhecido de feridos), cerca de 1 trilião de dólares gastos: este
é, em síntese, o orçamento dos 19 anos da guerra USA no Afeganistão, ao qual se
acrescenta o custo para os aliados NATO (incluindo a Itália) e outros que se
juntaram aos EUA na guerra.
O
orçamento de falências para os EUA também do ponto de vista político-militar: a
maior parte do território está agora controlada pelos Taliban ou disputada entre
eles e as forças do governo apoiadas pela NATO.
Neste
contexto, após longas negociações, a Administração Trump concluiu um acordo com
os Taliban, em Fevereiro passado, que prevê em troca de garantias, a redução do
número de tropas USA no Afeganistão de 8.600 para 4.500. O mesmo não significa
o fim da intervenção militar dos EUA no Afeganistão, que continua com forças
especiais, drones e bombardeiros. No entanto, o acordo abriria o caminho para
uma diminuição do conflito armado.
No
entanto, foi revogado alguns meses após a assinatura - não pelos talibãs
afegãos, mas pelos democratas dos EUA. Aprovaram no Congresso uma emenda à Lei
de Permissão, que destina 740,5 biliões de dólares para o orçamento do
Pentágono no ano fiscal de 2021.
A emenda, aprovada em 2 de Julho pela Comissão de
Serviços Armados pela grande maioria com o voto dos Democratas, estabelece
“limitar o uso de fundos para reduzir o número de forças armadas estacionadas
no Afeganistão”.
Proíbe
o Pentágono de gastar os fundos na sua posse para qualquer actividade que
reduza o número de soldados dos EUA no Afeganistão, abaixo de 8.000: o acordo,
que envolve a redução de tropas dos EUA no Afeganistão, está efectivamente
bloqueado. É significativo que a emenda tenha sido apresentada não só pelo democrata
Jason Crow, mas também pela republicana Liz Cheney, que fornece o seu aval em
perfeito estilo bipartidário. [1]
Liz é filha de Dick Cheney, Vice Presidente dos Estados Unidos de 2001 a 2009, durante a
Administração de George W. Bush, que decidiu a favor da invasão e da ocupação
do Afeganistão (oficialmente para dar caça a Osama bin Laden [2])).
A
emenda condena explicitamente o acordo, argumentando que prejudica “os
interesses de segurança nacional dos Estados Unidos”, “não representa uma
solução diplomática realista” e “não fornece protecção às populações
vulneráveis”. Para ser autorizado a reduzir as tropas no Afeganistão, o
Pentágono deverá certificar que essa medida “não comprometerá a missão
antiterrorista dos Estados Unidos”.
Não
é por acaso que o ‘New York Times’ publicou um artigo [3],
em 26 de Junho que, de acordo com as informações fornecidas (sem apresentar
nenhuma prova) dos agentes de inteligência USA, acusa “uma unidade de
inteligência militar russa de oferecer aos militantes Taliban um engenho
militar para matar soldados da Coligação no Afeganistão, visando principalmente
os americanos”. As notícias foram divulgadas pela grande media americana, sem
que nenhum caçador de fake news questionasse a sua veracidade.
Após
uma semana, foi aprovada a emenda que impede a redução de tropas USA no
Afeganistão. O que confirma o verdadeiro objectivo da intervenção militar
USA/NATO no Afeganistão - o controlo dessa área de importância estratégica da
maior importância. O Afeganistão está na encruzilhada do Médio Oriente, do
centro, sul e leste da Ásia.
Nesta
área (no Golfo e no Cáspio) existem grandes reservas de petróleo. Existem a
Rússia e a China, cuja força está a crescer e afectar as estruturas globais.
Como o Pentágono alertou num relatório de 30 de Setembro de 2001 [4],
uma semana antes da invasão americana do Afeganistão, “existe a possibilidade
de surgir na Ásia, um rival com uma formidável base de recursos”. Possibilidade
que agora se está a materializar.
Os
“interesses da segurança nacional dos Estados Unidos” impõem que fiquemos no
Afeganistão, custe o que custar.
*Manlio
Dinucci il manifesto, 07 de Julho de 2020
[1]
[2] L’Effroyable Imposture suivie du Pentagate, Thierry Meyssan, reedição
Demi-Lune. [3] “Russia Offered Afghans Bounty To Kill U.S. Troops, Officials
Say”, Charlie Savage, Eric Schmitt and Michael Schwirtz, The New York Times,
June 27, 2020. [4] Quadrennial Defense Review Report, p.12, Department of
Defense, September 30, 2001.
Manlio Dinucci* | Voltairenet.org | Tradução Maria Luísa de Vasconcellos | Fonte Il Manifesto (Itália)
*Geógrafo
e geopolítico. Últimas publicações : Laboratorio
di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di
viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte
della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016; Guerra
nucleare. Il giorno prima. Da Hiroshima a oggi: chi e come ci porta alla
catastrofe, Zambon 2017; Diario di guerra.
Escalation verso la catastrofe (2016 - 2018), Asterios Editores 2018.
Notas:
[1]
Na realidade, é a antiga Conselheira da Segurança Nacional, Susan Rice, que
lidera o lado democrata. Como ela não é parlamentar, foi o deputado Jason Crow
quem apresentou a emenda. Ele estava implicado no processo de remoção do
Presidente Trump. A acusação de que a Rússia está a financiar o assassinato dos
GI’s não faz sentido, pois o número de mortes dos EUA no Afeganistão não cessa
de diminuir. “Trump
Puts Russia First”, by Susan Rice, New York Times (United States)
, Voltaire Network, 1 July 2020.
[2]
Portugal : 11 de Setembro, 2001.
A Terrível impostura, Thierry Meyssan, Frenesi 2002.
Brasil : 11 de setembro de 2001. Uma terrível farsa, Thierry Meyssan,
Usina do livro, 2002.
[3]
“Russia
Offered Afghans Bounty To Kill U.S. Troops, Officials Say”, Charlie Savage,
Eric Schmitt and Michael Schwirtz, The New York Times, June 27, 2020.
[4] Quadrennial Defense Review
Report, p.12, Department of Defense, September 30, 2001.
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